Um dos maiores desafios de quem se dispõe a ensinar física é tornar simples uma ideia muito complexa, que às vezes nem mesmo a pessoa que segura o giz entende por completo. Mas esse é o dever; não saber tudo, o que seria impossível, mas dar o melhor para, pelo menos, gerar nos ouvintes a curiosidade capaz de levar a modificações incríveis em verdades que preexistem só porque... sim.
Olha a teoria da relatividade. Einstein tirou da cartola uma série de suposições sobre tempo, energia, matéria e espaço que se provaram úteis para nos apontar caminhos e gerar reflexões profundas sobre o que realmente somos no universo. Ele poderia fundar uma seita, criar uma nova religião, mas preferiu nos deixar com uma equação – e é com ela que salvamos as almas que não sabem de onde saíram ou para onde vão.
Efeito fotoelétrico, buraco negro, ondas gravitacionais, bomba atômica – as letras e números que o alemão juntou em uma só linha nos ajudam a conversar sobre criação (do universo, da vida, dos telefones celulares) ou transformação (do universo, da vida, dos telefones celulares) na mesma medida. Mas, como nem todo mundo se interessa em fazer as perguntas, e apenas quer as respostas prontas e mastigadas em cima de sua mesa imaginária até às cinco da tarde, professores de física nem sempre vão gastar energia – tempo, massa ou velocidade – para demonstrar a explicação que mora em cada coisa viva ou inanimada, incluindo a razão ou o acaso de sua existência.
Um dos macetes deixados por Einstein para tornar a possível a tarefa de explicar algo complexo de forma simples é o paradoxo dos gêmeos, que versa sobre a dilatação do tempo em condições especiais. Basicamente, se você separa dois bebês gêmeos, coloca um em uma nave espacial e o deixa viajar para uma estrela além do nosso sistema solar, em altíssima velocidade, e voltar, para ele a experiência pode ter durado apenas alguns minutos ou dias, enquanto que, para seu irmão, isso resultou em anos.
Teríamos, então, um gêmeo muito mais velho que o outro – algo que, no conforto do lar terrestre, soa irreal – e até meio ridículo. Mas é justamente com esse exemplo que professores de física costumam aconchegar na mente dos alunos que "o tempo é relativo", colocando em uma frase curta uma série de deltas, letras e números que podem – e, geralmente, vão – parecer indecifráveis.
Eu sei que esse papo de aula está meio esquisito, mas não posso contar o que acaba de me acontecer sem tocar nesse assunto.
Antes, porém, devo dizer só mais uma coisa: em sala de aula, trato a dilatação do tempo a partir de outro ponto de vista. Pergunto às crianças sobre o melhor momento de suas vidas, aquele no qual gostariam de morar, mas que pareceu passar mais rápido que deveria. Depois, peço que relembrem uma coisa chata, como uma dor de dente que ficava cada vez mais forte. Quanto mais rápido os pais dirigiam rumo ao dentista, mais parecia que a solução do problema estava longe, pois cada segundo era medido em dor.
A analogia serve para explicar que objetos que se deslocam em alta velocidade, próxima à velocidade da luz, percebem o tempo passando mais devagar. Mas, como a velocidade da luz são outros quinhentos, eu jogo com a dor, que é mais palpável, mais real. Concreta. Quem já sentiu dor sabe que ela alarga nossa percepção do passar do tempo como nenhuma outra coisa no mundo.
Essa é minha licença poética: não precisamos do alemão para o pensamento doméstico do tempo; meu camarada Newton dá conta desse recado. Mas, se quisermos ir além da superfície, pensar no que tem lá fora, entender o que acontece aqui dentro e pesar cada acontecimento de acordo com a energia que precisamos investir nele para que seja considerado uma experiência de vida, precisamos do intervalo entre o antes e o depois.
Precisamos do exato segundo em que tudo muda.
O segundo que parece durar anos, o segundo em que as pessoas com experiência de quase-morte alegam ver a vida toda passar diante de seus olhos. Esse segundo é facilmente sentido, dificilmente rastreado – e, se piscarmos, o perdemos.
É como olhar para um relógio de ponteiros e achar que, pelo mínimo tempo em que foi encarado, o ponteiro de segundos parou. Não parou. Se você perguntar para a pessoa ao lado, que já estava observando o relógio antes de você, nada de esquisito ocorreu e, quando o ponteiro dos segundos chegou no 12, um ponteiro diferente se moveu entre traços em algum lugar desse círculo.
Mas para você é diferente: o relógio está parado, suas reflexões estão acontecendo com rapidez, os pensamentos vão se empilhando e, de repente, eureca! Observadores observarão que isso levou um tempo considerável para ocorrer, mas você é capaz de testemunhar sob juramento que o estalo ocorreu em um segundo.
Apenas um segundo.
Talvez você possa usar essa parte da minha história para fechar a prova de física ou acertar uma questão sobre dilatação do tempo no ENEM, quem sabe até considerar essa teoria na próxima vez em que sentir que a vida te prendeu a uma situação desconfortável e eterna. Talvez a menor lembrança de que os minutos estão passando normalmente na gravidade terrestre acalente seu coraçãozinho em sofrimento, já que tudo se transforma, eventualmente, a matéria diz ao espaço como se curvar, enquanto o espaço conta para a matéria como ela deve se mover, coisa e tal, porque tudo isso faz sentido e você vai enxergá-lo se souber prestar atenção.
Onde essa doida está querendo chegar?, você me pergunta, e eu te digo: no agora.
Porque agora, imersa em uma banheira francesa, vendo Erica sair do banheiro enquanto murmura "sempre foi você, sua idiota", parafraseando meu Chris Martin imaginário, uma infinidade de acontecimentos me ocorre, simultaneamente, além de todos esses que acabo de explanar. Meu momento eureca está bem parecido com uma experiência de quase-morte, apesar de eu estar bem viva. Talvez nunca tenha me sentido tão viva quanto agora.
Faz sentido.
Faz total sentido.
Como não cheguei a essa conclusão antes?
Para te contar o que é que acabo de me dar conta eu preciso voltar algumas horinhas atrás. Metaforicamente, é claro. A memória é a melhor máquina de viagem no tempo que existe, desde que saibamos voltar ao presente sem nos culpar ou nos iludir pela sucessão de eventos que nos trouxe até esse dilatado e real agora.
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Teoria do Amor
RomansaLembra das aulas de física que te faziam pensar a razão pela qual era preciso saber o que aconteceria a um bloco de três quilos se você o empurrasse de uma altura de quinze metros a uma velocidade de seis quilômetros por hora - bem como a aplicação...