Sem ar.

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19 de Janeiro de 2016.

Meus pés não tocam mais o chão

Meus olhos não veem a minha direção

Da minha boca saem coisas sem sentido

Você era o meu farol e hoje estou perdido...

Com os olhos inchados de um choro frequente, Jasmine estava sentada encarando o papel levemente molhado e uma caneta que ela pegava volta e meia, logo depois soltava com medo das suas próprias palavras.

" Eu preciso começar de alguma forma, mas eu tenho medo... Só que não quero deixar você sem respostas, mesmo que você não tenha como ler o que escrevo.

Hoje faz um mês que perdi você, um mês que nós a enterramos, um mês que eu desmaiei pela primeira vez porque a dor aqui dentro não cabia em mim... Você acredita que desmaiei pela primeira vez? Foi estranho.

Mas mais estranho que isso foi chegar em seu velório, ver você sem vida e pálida, com seus olhinhos fechados parecendo que estava em um sono profundo e sereno, estranho foi beijar seus lábios gélidos pela última vez, foi tocar seus dedos e seu rosto, estranho e muito doloroso foi me despedir.

Me perdoe a indelicadeza, sim, eu estou roubando essa sua frase...

Mas meus mais sinceros e eternos "vai se foder!" pra essa doença.

Eu não costumo nutrir ódio por nada, mas nunca senti tanto ódio de uma doença, assim eu xingo ela de todos os nomes possíveis e de todas as formas possíveis a ponto de me fazer chegar no inferno por causa dessas palavras... Mesmo sabendo que isso não te trará de volta.

Eu te perdoo por tudo Melinda, eu não perdoo essa maldita doença que te levou de mim, mas te perdoo por não ter me contado a verdade, não havia nada que eu pudesse fazer e você já estava conformada, eu quem não estava para te perder.

A verdade é que nós nunca estamos preparados para perder alguém que amamos muito.

Somos ensinados desde criança o ciclo da vida e nele todos nós iremos parar debaixo da terra algum dia, todos nós sabemos disso, mas não deixa de doer, nunca deixa.

Porque é um sumiço tão repentino, em uma hora você tem a mulher dos seus sonhos, o amor da sua vida, aquela que você acorda todos os dias ao lado, a dona do seu primeiro beijo e sorriso do dia, aquela com quem você fez planos de ver o pôr do sol numa cadeira de balanço com pijaminhas iguais, em outra hora... Em outra hora só resta a dor de um coração dilacerado, um silêncio agonizante no apartamento, a saudade que sufoca.

Às vezes a dor é tão forte que ela confunde tudo, eu começo a me culpar por coisas que nem são culpa minha, mas a questão é que eu quis ajudar sempre, porque não me conformo com um "não podemos fazer mais nada", como assim não podem?

E ai então transfiro toda a culpa pra eu mesma, "E se eu pudesse fazer alguma coisa?", então eu me iludo e acredito nas coisas mais bobas possíveis do tipo, "Se a gente não tivesse tomado banho de chuva, talvez Melinda não iria", mas você iria, a gente fazendo diferente ou não, você iria embora de qualquer jeito, porque era a sua hora.

Eu não podia fazer mais nada, assim como os médicos, assim como você."

O sofrimento vem à noite sem pudor

Somente o sono ameniza a minha dor

Mas e depois? E quando o dia clarear?

Um Livro para Melinda - Lésbico. (CONCLUÍDO)Onde histórias criam vida. Descubra agora