Vinte e Nove - Tudo Pode Acontecer

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Lauren

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A correria em nossa casa era gritante de forma quase literal. Era só mudar o nome dos meninos para Correria que a literalidade se tornaria concreta.

- Vamos, garotos! - chamei pela milésima vez - já trocaram de sapato três vezes!

Daniel apareceu chorando e esticando os braços para mim, que o peguei no colo.

- O que houve? - perguntei a ele, que escondeu o rosto em meu pescoço.

- Eu quero ir igual a mamãe! - ele choramingou.

- Mas você está igual a mamãe - contestei, porque eles estavam usando uma versão masculina do vestido de Camila, que era azul escuro com uma gola branca.

Os meninos estavam vestido todos iguais por escolha deles. Normalmente não era assim. Não fazíamos o tipo de mães de gêmeos que vestem eles com roupas iguais, até porque eles tinham o próprio estilo que nos ajudava a saber quem era quem. As roupas que usavam hoje era como marinheirinhos, porque combinava com a escolha de Camila.

- Eu quero igual! - Daniel insistiu.

- Igual como?

- Igual - foi o que ele respondeu como se fizesse todo o sentido para mim assim como para ele.

- Olha, não podemos mudar isso nesse momento porque temos que sair agora - tentei explicar, mas ele chorou - porque não fazemos assim: a mamãe vai de saltinho, você pode usar aquela sandália que implorou para a gente comprar. Vai ficar igual a ela. Pode ser?

Ele fungou dramaticamente.

- Pode - concordou e fui com ele ao quarto onde Camila mudava o sapato dos outros dois mais uma vez.

- Essa é a última vez, entenderam? - ela foi autoritária.

- Sim, mamãe - os meninos responderam.

- Ah, aí está você - Camila sorriu - eu sabia que estava faltando alguém, é claro.

Girei os olhos. Ela era tão boba que não contive um sorriso. Coloquei Daniel no chão.

- Vá, pegue seu sapato favorito.

Ele correu e quando voltou tinha nos pés um tamanquinho infantil branco com estrelinhas. Eu sei, muitos diriam que era sapato de menina, mas Daniel gostava desse tipo de coisa e não ia ser nós, com toda nossa convivência diversa, que iríamos podar seus gostos.

Daniel deu um sorriso enorme e afastou do rosto os cabelos um pouco maiores que os dos irmãos.

- Podemos ir? - perguntei.

- Sim! - os quatro gritaram.

- Deem as mãos. Não quero ninguém correndo nas escadas porque hoje não podemos correr o risco de alguém quebrar o crânio - disse a eles, que tão acostumados com nosso jeito de mães simplesmente fizeram o que mandei.

Andamos com cuidado até o carro, verifiquei antes de fechar as portas se Tempero e Bichana Julieta tinham comida, então saímos.

Deixe eu explicar. Era dia de autógrafos do mais novo lançamento de Camila: Tudo Pode Acontecer. Era uma história brilhante, comovente e engraçada de três garotinhos que tinham poderes para fazerem e serem quaisquer coisas, então eles se aventuravam pelo mundo.

É claro que era impossível imaginar qual tinha sido a inspiração de Camila para a história, então por isso vou dar a colher de chá e contar que eram os nossos meninos.

Eles haviam mudado nossas vidas de uma forma radical e bonita e Camila tinha eternizado como eram incríveis em páginas que milhares de pessoas liam ao redor do mundo.

Os meninos conversavam aleatoriamente até chegar a livraria, mas se encolheram um pouquinho quando viram todas aquelas pessoas. A última vez que viram tanta gente eles eram muito novos para lembrar. Foi no anúncio da adaptação do livro Luzes, que Camila escreveu para mim. Era meu filme favorito, embora a atriz nem de longe fosse tão bonita quanto eu.

Não levamos eles para a noite de autógrafo dois anos antes no lançamento de Singular, um livro que era sobre ela mesma. Camila tinha autoestima o bastante para se descrever como uma personagem toda poderosa. Na ocasião os meninos tiveram febre e fiquei com Dinah cuidando dos três porque ela não poderia desmarcar assim do nada o evento.

E ali... Bom, Daniel ficou tímido e agarrou minha mão. Oliver não gostou de tanta gente ali olhando para ele, o que não era novidade porque ele tinha que escolher algo para odiar. Thomas ficou completamente a vontade e segurou a mão de Camila, sorrindo e dando tchauzinho para as pessoas.

Camila foi para seu lugar de autógrafos e levei os meninos para ver os outros livros. Eles gostavam disso, estavam aprendendo a ler. Oliver era muito bom nisso, mas odiava. Daniel tropeçava nas palavras, mas até que se saía bem. Thomas era quem não estava conseguindo aprender.

Ele nem perdeu tempo com a gente e foi ficar com a mamãe que tinha todas as atenções. Ficou sentado em seu colo rindo e falando com todo mundo. Nem de longe parecia o bebê invisível.

- Olha, mamãe! Aquele menino usa sapato de menina! - ouvi uma garotinha exclamar e quando olhei ela estava apontando para meu filho.

Que audácia!

Olhei para Daniel e ele tinha uma carinha confusa, então puxei ele para meus braços e mostrei a língua para a garota chata. Meu filho me copiou, mas ele era uma criança, e podia fazer essas coisas.

- Pelo... pelo menos o sapato de Dan é mais bonito que o seu - foi a resposta de Oliver, que me fez rir e beijar seu rostinho.

A mãe da menina levou ela para longe e voltamos a atenção para os livros.

- Mamãe, eu não sou uma menina? - Daniel perguntou do absoluto nada, me fazendo olhar para ele.

Fui pega quase que de surpresa.

- Você é uma menina? - perguntei de volta.

Daniel fez um biquinho, mas não respondeu.

- Meninas são chatas, Dan! - Oliver se intrometeu na dúvida do irmão - melhor ser menino como Thom e eu!

- Eu sou Dan! - foi o que Daniel exclamou.

- Então você é Dan - falei para ele - e Dan gosta de saltinhos, está tudo bem.

Daniel sorriu para mim. Ele era o mais doce. Eu não iria colocar palavras em sua boquinha. Isso era algo que Camila e eu tínhamos concordado. Não éramos cegas, mas não era algo que devíamos nos intrometer e depois não saber se estávamos influenciando ou não. Dan era Dan. Se foi o que disse, então era assim.

Voltamos a ler os livros até o momento em que eles se cansaram. Thomas dormia no colo de Camila, que agia tão naturalmente quanto era possível com um menino adormecido nos braços. Fiquei pensando em como ela tinha razão sobre nossos três maluquinhos. Quando se trata deles, tudo pode acontecer.

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Camila a maior escritora de todos os tempos.

Eu amo uma família.

Um, Dois, Três!Onde histórias criam vida. Descubra agora