Fiquei desconfiada de Finley no primeiro momento por não saber qual era sua real intenção ao me levar para seu quarto, mas confesso que me senti bem por tê-lo por perto.
Aquele resto de noite foi tranquilo, consegui descansar bastante devido ao sono pesado.
Quando acordei, virei para o lado e notei que Finley não estava mais sentado na poltrona, passei alguns segundos deitada até me levantar para sair do cômodo, me deparando com todas as redes vazias. Pela movimentação na parte de cima do navio, os marujos já deviam estar trabalhando no convés.
Sem muita escolha, subi a pequena escada tendo que fechar os olhos por causa da grande luminosidade repentina.
Homens de diversas idades andavam de um lado para o outro, alguns esfregando o chão,outros limpando mastros e estendendo bandeiras, mas todos devidamente ocupados.
— Bom dia. - ouvi uma voz conhecida atrás de mim e me virei - Está melhor?
— Sim. - sorri levemente na esperança de parecer mais gentil.
— Falei que seu rosto iria ficar marcado e aí está. Sinto muito mais uma vez.
— Não é a primeira vez que isso acontece, e acredito que não será a última.
— Será a última enquanto eu estiver por perto!
A fala de Finley me causou surpresa, não esperava que ele se importasse tanto com a segurança de alguém que mal conhece.
— Dormiu bem? - perguntou quando percebeu minha dúvida se formar.
— Muito bem. - sorri levemente outra vez - Obrigada por me deixar dormir em sua cama. Não precisava.
— Tá tudo bem, não me incomodo de dormir naquela poltrona.
— Dormiu no quarto dele? - novamente aquela grossa causou impacto ao invadir nossa conversa.
Não me surpreendi ao olhar para meu lado direito e me deparar com a feição mal humorada de John.
— Sim, capitão. Mas, a porta permaneceu aberta durante todo o tempo!
— Não acho que precise dar explicações, Finley. - falei ainda encarando John.
— Sim, precisa. - pontuou em tom autoritário - Não sei se já está ambientada sobre como as coisas acontecem dentro deste navio, mas o homem que te levou para o quarto na noite passada trabalha para mim.
— Mas, eu não preciso lhe dar satisfações, navegante. - virei todo meu corpo em sua direção - Não trabalho pra você!
Um sorriso cínico preencheu o rosto de John depois das minhas palavras serem ditas.
— É isso que você pensa. - afirmou voltando sua atenção para o imediato - Volte ao trabalho, Finley. Até onde sei, você ainda tem coisas demais para fazer. - Cedric respirou fundo ao se retirar mas, antes de ir, esboçou um pequeno sorriso em minha direção - Quanto a você... Preciso entregar uma coisa, quando terminar te quero em meus aposentos. Acho que algumas ainda precisam ser esclarecidas entre nós.
Ele sequer me deu chance de resposta, apenas virou as costas e saiu andando me deixando sozinha mais uma vez. Eu não me sentia nenhum pouco confortável no meio daqueles homens, ainda mais depois do que aconteceu ontem, então me direcionei para a proa do navio novamente.
Me sentei no chão e comecei a me distrair por estar presa demais aos meus pensamentos.
Será que John já sabe do que houve ontem? Ou será que ele pensa que me ofereci para passar a noite no quarto de Finley?
Por que estou me preocupando com isso? Pior ainda, porque que estou pensando nele?
John não é diferente dos donos de escravos e não demorou para que isso ficasse explícito. Sua postura mudou bastante depois que embarcamos, ou talvez ele já fosse desse jeito, só estava fingindo.
Como eu já imaginava.
— Achei que tinha pedido para me esperar em meus aposentos?!
John apareceu em minha frente e precisei olhar para cima para conseguir achar seus olhos.
— Você pediu.
— E por que não o fez? - virei o rosto encarando o mar - Ayla? - não respondi - Okay, vai ter que ser do jeito mais difícil.
Quando pensei em lhe encarar de novo, senti sua mão segurar meu braço. Ele não estava aplicando muita força, mas fui puxada para ficar de pé, depois continuei sendo puxada para andar ao seu lado.
— John, me solta. - falei quando seu toque começou a me apertar, o que fez outros marujos nos olharem. - ME LARGA!
— Não faz isso. - pediu parando de andar para me encarar.
— Solta meu braço!
— Pare de tentar fazer escândalo. - falou em um tom impaciente.
— Não estou fazendo escândalo, só quero que me solte!
— John... - Finley apareceu ficando de frente para ele, quase se pondo entre nós dois - Não faça isso.
— Não estou fazendo nada, Cedric.
— Tá machucando ela, John.
— Eu jamais faria isso.
— Já está fazendo! - John olhou para baixo ao perceber o quanto estava apertando meu braço - Solte-a. Acredito que ela saiba como andar sozinha.
O capitão livrou meu braço de seu toque no mesmo instante, depois me encarou com um olhar, um tanto quanto, diferente. Com o tom de voz baixo e certo nível de insegurança, ele se dirigiu a mim outra vez.
— Por favor, Ayla. - me encarou - Já chamamos atenção demais.
Olhei para Finley outra vez antes de decidir voltar a caminhar. Em passos largos me dirigi ao quarto de John, instantes depois ele se colocou ao meu lado para destrancar a fechadura da porta.
Entrei um tempo depois dele me dar passagem.
Quando já estava dentro do cômodo, ouvi a porta sendo fechada e fiquei mais atenta.
— Por que fechou a porta? - perguntei receosa.
— Quero privacidade.
— Privacidade pra quê? - ele franziu o cenho.
— Está com medo de mim?
— Não tenho medo de ninguém.
— Achei que tivesse ganhado sua confiança, Ayla. - falou em dúvida.
— Perdeu-a assim que me deixou sozinha em meio a esse bando de homens.
— Não te deixei sozinha, você estava com Finley.
— Que também era um desconhecido até então.
— Ayla...
— Diga logo o que quer para que eu possa sair daqui.
— Não sabia que minha presença lhe incomodava tanto.
— Passou a me incomodar há poucas horas atrás.
Minha sinceridade instalou um sentimento triste na feição de John, seus olhos ainda pareciam tentar digerir minhas duras palavras.
Não tenho nada contra o navegante que cuidou de mim e prometeu me devolver a minha terra natal, mas esse homem que zelava pela minha segurança não me deixaria sozinha como o capitão desse navio fez.
Bom, eu acho que não.
*Relevem os erros, por favor.*
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ALFORRIA
Romance"Sonho com uma outra vida, onde as correntes não separem nossas almas!" Na época em que pessoas eram condenadas pela cor e outras beneficiadas pela "falta" dela, um laço forte prende dois amantes da liberdade: o amor. Seria possível dentro de um...