Capítulo XXVI

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 — Posso saber que tumulto é esse na minha fazenda?

— Seu feitor está ameaçando açoitar a minha escrava!

— Não estou ameaçando, eu vou açoitá-la. - franzi o cenho e encarei William com ódio.

— O que você disse?

— Calma, senhores. - Sr.Jones me parou quando dei um passo em direção ao feitor - O que houve William?

— Essas duas estão descumprindo regras, senhor. Peguei a garota roubando ovos do galinheiro para alimentar o escravo que está sendo castigado na senzala.

— E o que a Ayla tem a ver com isso? - perguntei.

— Meu trabalho é educar esses pretos e ela tentou me impedir.

— Se encostar um dedo nela, eu juro que...

— Tarde demais, John. - Sr.Jones disse agachado ao analisar o corpo de Ayla.

 Ao ouvir suas palavras me aproximei do tronco com pressa e, assim que me abaixei, já pude ver o rosto dela ensanguentado. Seu olhar coberto de lágrimas, e até mesmo o suor acumulado na testa devido ao medo, fez o ódio me invadir de um jeito tão intenso que me deixou completamente cego.

 Ninguém conseguiu impedir quando soquei a cara de William, muito menos quando continuei a sequência de golpes mesmo depois dele ter caído no chão.

— JOHN, PARE! - ouvi Violet gritar e já senti dois escravos me tirando de cima de William.

— Desgraçado, eu vou matar você. - falei me debatendo.

— Pra quê toda essa raiva? Ela é só uma escrava! - William perguntou.

— E isso dá o direito de qualquer um colocar as mãos nela? - me direcionei para o Sr.Jones - Desamarre-a. Agora!

— Ela está em minhas terras e descumpriu minhas ordens, John.

— Quando cheguei, eu disse que qualquer atentado contra ela seria visto como um atentado contra mim, e você concordou. Cumpra com sua palavra!

 A essa altura os escravos já haviam me soltado, William já havia se levantado e todos em volta me olhavam com dúvida.

— Você está certo.

— O que? - a moça perguntou indignada - Mas, papai...

— Ainda não terminei, Violet. - Sr.Jones disse indo em direção à William - Não é certo que outra pessoa corrija um escravo.

— Muito obrigada. - agradeci quando todos olharam para o fazendeiro perplexos por sua atitude.

 Achei que a discussão tivesse se encerrado, mas o Sr.Jones se aproximou de mim novamente. Sua mão se estendeu em minha direção e, ao olhar para baixo, vi-o me entregando o chicote.

— Os escravos têm dono por um motivo. - olhou em meu olhos - Você é quem deve fazer, John!

— O que? - perguntei.

— Ela é sua escrava, não é?! - engoli seco - Então não vejo problemas, já que as leis permitem. - vi outro feitor rasgar a camisa de Ayla, deixando suas costas totalmente à mostra - Acredito que dez chibatas estejam de bom tamanho.

 Ayla virou o rosto para me encarar por cima do ombro e senti meu coração quase parar em tristeza por vê-la daquela forma.

— Faça, John. - Violet impulsionou - Acabe logo com isso.

 Ainda distante, analisei os cortes nas costas de Ayla, os mesmos que eu havia ajudado a curar. O peso daquele chicote em minhas mãos era quase surreal, só de me imaginar punindo-a daquela forma, meu coração caía por terra.

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