Capítulo 5: Portador dos Raios.

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Cedric

Observei as crianças que brincavam de guerra de bolas de neve, enquanto os guardas caminhavam pelas ruas, procurando por qualquer coisa errada. Ajeitei a touca da jaqueta, tentando esconder o máximo possível do meu rosto.

Caminhei pela rua, sentindo minhas botas afundarem na neve fofa, enquanto eu passava pelo meio das pessoas. Ao fundo, pude ouvir os gritos de alguns guardas, provavelmente prendendo algum trabalhador inocente. Era sempre assim. As pessoas saiam pra trabalhar e algum guarda ficava desconfiado e resolvia prede-los. Nunca com uma acusação concreta. Apenas usando seus poderes para agredir e culpar os súditos da rainha.

Ignorei a onda de fúria que fez todo meu sangue esquentar e me dirigi até o porto da Cidade das Estrelas, sentindo a neve começar a cair do céu nublado. Meus passos ficaram mais rápidos a medida que eu virava a rua e seguia pela praça cheia de barracas e lojas.

—Ei, você aí! —Continuei andando, sentindo a lâmina da faca deslizar pela manga da minha jaqueta, até tocar a palma da minha mão. —Pare aí agora mesmo!

Virei em outra rua, mais estreita e vazia, vendo a neve que caia do céu, aumentar. Flocos grudaram nos meus cilícios, enquanto meus passos se aceleravam, a medida que o guarda me seguia rapidamente.

—Eu mandei parar! —Ele me puxou pelo ombro. A faca deslizou até meus dedos se fecharem no cabo. Me virei de forma brusca, deixando meu corpo ir contra o dele e enfiei a faca no seu pescoço, sentindo o sangue ensopar minhas mãos segundos depois.

Puxei a faca de volta e empurrei seu corpo, vendo o guarda levar as mãos ao ferimento do pescoço, enquanto caia sobre a neve e a manchava de vermelho. Ele se engasgou com o próprio sangue e então ficou imóvel no chão.

Encarei a lâmina que pingava sangue, soltando um suspiro pesado e enfiando-a no bolso. Não gostava de matar. Mas isso se tornou natural a medida que o poder da Rainha das Rainhas crescia no continente. Agora não tenho outra alternativa a não ser fazer isso.

Me abaixei ao lado do guarda e puxei a manga da jaqueta, vendo a marca de correntes ali, assim como nos outros guardas. A rainha estava brincando com eles. Estava transformando-os em meros peões no seu jogo de poder. Tínhamos que parar com isso. Logo.

[...]

Subi no navio, passando pelos marujos e indo na direção do homem de pele morena e tranças no cabelo, com um chapéu sobre a cabeça.

—Capitão Henry. —Ele se virou, revirando os olhos e abrindo um sorriso.

—Cedric, meu rapaz. —Apertei a mão estendida dele, abrindo um sorriso. —Espero que não tenham me chamado pra procurar Kayla no meio de toda essa água. Já fizemos uma tentativa.

—Ah, não é isso. —Neguei, acenando para Baron, que estava do outro lado do navio, ajudando a carregar caixas. —Mas o que vamos fazer também não é nada fácil.

—Vocês e essa vontade imensa de se tornarem heróis. —Olhei para trás, arqueando as sobrancelhas ao ver Vlad caminhado na nossa direção com uma garrafa de rum pela metade nas mãos. —Um dia ainda vão encontrar a própria morte no caminho.

—A própria morte, é? —Murmurei, vendo ele rir.

—Não dúvida não, hein? Ela existe. A famosa Senhora dos Corvos. Dizem que é tão impetuosa quanto a própria morte. —Afirmou, parando na minha frente e arqueando as sobrancelhas várias vezes seguidas, enquanto dava um longo gole na bebida.

—Hm, sei. Vamos torcer pra não encontramos com ela no caminho então. —Me virei para Henry. —Por que você ficou com ele mesmo?

—Ah, ele pode ser útil um dia. —Henry deu de ombros. —Apesar de viver bêbado, é um velho inteligente.

—Velho não! —Vlad resmungou, enquanto eu soltava uma risada e seguia Henry até a cabine dele. —Eu estou muito conservado, isso sim.

Ele seguiu nós dois, fechando a porta atrás de si, enquanto Henry ia para a cadeira atrás de sua mesa e eu parava na frente dela. Tínhamos uma ideia muito ruim que poderia dar certo. Ou um de não morreria sendo atingido por um raio.

—Então, Cedric, a que devo a honra? —Henry indagou, cruzando os pés em cima da mesa e lançando um olhar a minha mão. —Você está sangrando.

—O sangue não é meu. —Afirmei, vendo ele arquear as sobrancelhas e então soltar uma risadinha. —O príncipe das terras esquecidas está fazendo uma visita a rainha.

—O Kenji? —Ele pareceu subitamente interessado.

—Se esse for o nome dele, então sim. O Portador dos Raios. —Afirmei, escorando minhas mãos na mesa. —Sabemos que ele é super amigo da Kayla. Você mesmo viu ele com ela, enquanto estavam sobre seu navio. Bem, como eu disse, ele está indo visitar a rainha. Sabemos que ele pegou um navio, junto com Devlon, o chefe da guarda da rainha, e está indo pra lá agora mesmo. A intenção dele é fazer apenas uma visita a mãe e então voltar para o navio que Kayla está comandando.

—Certo. —Henry murmurou, me encarando a medida que tentava entender aonde eu queria chegar com toda aquelas informações. —E o que isso tem a ver comigo, exatamente?

—Queremos pegar o príncipe antes que ele chegue em terra e volte para alto mar com a Kayla. —Revelei, vendo as sobrancelhas de Henry se unirem, enquanto Vlad soltava uma gargalhada atrás de mim. —Ele é amigo da Kayla, então ela provavelmente vira atrás dele quando souber que o pegamos. O Lusion disse que, provavelmente, ele pegará o navio com Devlon até a Cidade do Sol de novo, e então vai esperar o navio de Kayla lá. Podemos tentar pega-lo nesse percurso das terras esquecidas até a Cidade do Sol.

Henry ficou em silêncio, me encarando com uma expressão indecifrável. Cerrei os punhos, ficando um pouco nervoso pela demora dele.

—Não vai dizer nada? —Indaguei.

—Vocês ficaram loucos de vez? —Henry exclamou, parecendo chocado. —Querem mesmo tentar prender um Portador dos Raios? Ou só estão tentando se matar?

—Acho que a segunda opção. —Vlad murmurou atrás de mim e eu me virei pra ele, fazendo cara feia, o que resultou em outra gargalhada dele.

—Você está bêbado, nem deveria estar aqui! —Afirmei.

—Eu sou um guardião.

—Ex guardião! —Rebati, vendo ele revirar os olhos e virar a garrafa de rum na boca. Fechei os olhos com força e me virei para Henry, em meio a um suspiro frustrado. —Eu sei que isso é quase complicado. Mas você já esteve com o Portador das Sombras em suas mãos. Então não é impossível.

—Eu o peguei já com os poderes contidos. —Henry rebateu. —É diferente. Vocês tem alguma coisa para conter o poder dele?

—Alex está cuidando disso, tá legal? —Afirmei, ouvindo Vlad resmungar algo sobre Alex ser um babaca metido. —Você não precisa se meter diretamente com o príncipe, okay? Eu mesmo vou cuidar disso. Você só precisa nos levar as águas próximas às terras esquecidas, pra interceptamos o navio que ele vai estar.

Henry soltou um suspiro, parecendo pensativo.

—Tudo bem. Mas é uma péssima ideia. —Resmungou, me fazendo abrir um sorriso. —Ele vai matar você.

—Se eu tiver sorte, não. —Afirmei, confiante.



Continua...

Um Mundo de Sombras / Vol. 2Onde histórias criam vida. Descubra agora