Capítulo 24: Acampamento.

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Quando ele disse que nos levariam até lá, eu realmente não estava esperando ser com as mãos amarradas nas costas e com um saco na minha cabeça, me impedindo de ver qualquer parte do caminho. E havíamos caminhado horas com eles, depois de percorrer um caminho de carroça, até algum ponto da floresta. Então eles nos guiaram pelo caminho, impedindo que víssemos e ignorando nossas perguntas.

Eu já estava ficando exausta e com frio quando finalmente comecei a ouvir o som de mais vozes, enquanto as sombras das árvores sumiam e davam lugar a noite. Eu e Diana fomos levadas até um tipo de barraca, ainda com o rosto tampado, e então amarradas juntas no chão, uma de costas para a outra.

—Estou começando a achar que isso não foi uma boa ideia. —Murmurei, soltando um suspiro lento e pesado. Estava com frio, apesar do calor das chamas de alguma fogueira que havia ali, e estava com fome, depois de tanto tempo de caminhada.

—Se for mesmo o Ronny, logo vamos estar longe dessas cordas. —Diana rebateu, se remexendo atrás de mim. —Não deveríamos ficar surpresas com isso. Não confiamos em qualquer um também.

—Como acha que Cedric e Trevis estão, com Kenji lá? —Indaguei, tentando pensar que não deveria ficar preocupada com eles. Os dois estavam em segurança na caverna. Eu e Diana aqui, no meio de um acampamento que nem tínhamos certeza se era mesmo de Ronny ou não.

—Eles sabem se cuidar. —Diana falou, como se fosse resposta o suficiente pra não nos preocuparmos. Mas eu estava, assim como sabia que ela também. Kayla poderia aparecer lá, mesmo com Kenji afirmando que não. —Kenji também é só um príncipe, sem poderes.

—Não acho que isso soe muito bem. Não o conhecemos direito. —Tentei olhar por cima do ombro, mesmo com o pano sobre minha cabeça. —Você era só uma princesa sem poderes quando pulou naquele barco, depois de roubar uma safira.

—Verdade. —Ela riu, deixando o ar mais leve ao nosso redor, diminuindo a tensão. —Ainda não temos poderes. Quer dizer, sim, mas...

—Só se chegarmos perto das safiras ou estivermos com elas. —Completei, soltando um suspiro de frustração.

Minha atenção foi para um barulho de passos pesados na grama, antes de sentir a presença dentro da barraca onde estávamos. Me remexi, sentindo minha garganta ficar seca pelo nervosismo. Não queria ter chegado até ali por nada.

—Ronny? —Diana indagou, e eu fiz uma careta quando o pano foi puxado da minha cabeça, com a claridade da fogueira me cegando por alguns instantes.

Abri os olhos a tempo de ver o homem de pele negra, que parecia não ter mais de 40 anos, com ombros largos e uma expressão séria dar a volta e então parar ao lado de Diana, puxando o pano que estava no rosto dela também.

—Ah, meu Deus! —Ele pareceu confuso, ao mesmo tempo que surpreso e chocado. —Princesa?

—Ainda bem! —Diana soltou o ar com força, parecendo ficar aliviada por vê-lo. —Eu estava procurando por você.

—Eu achei que estivesse morta. —Olhei pra trás, vendo ele se abaixar na frente dela, checando se ela estava mesmo ali, ou se não era um fantasma, já que ele ainda parecia chocado. —Meu Deus, você está realmente viva, alteza!

—Sim... —Diana se remexeu, soltando uma risada nervosa. —Ronny, pode nos soltar agora?

O homem pareceu perceber que estava ocupado demais observando ela, já que arregalou os olhos e veio para o nosso meio, soltando as cordas que nos prendiam.

—Como... como você sobreviveu? —Indagou, ajudando Diana a se levantar, quando ficamos livres das cordas. Passei as mãos nos meus pulsos, sentindo a pele um pouco dolorida. —Por onde você andou, alteza? Seu pai...

—Ah... —Ela abriu um sorriso amargo e encolheu os ombros. —Eu sei, ele se foi. —Diana olhou pra mim de relance. —Sinto muito por ter fugido. Não podia me casar com aquele príncipe solar.

—E onde você esteve? —Questionou de novo, se virando para me olhar por alguns segundos, antes de se voltar pra ela.

—É uma longa história. —Diana afirmou.

[...]

Segurei a tijela de sopa, me sentindo bem só de sentir o cheiro gostoso da comida. Estávamos sentados ao redor de uma fogueira, o acampamento todo ao nosso redor, com barracas e cabanas por todo lado. Em todas as cidades e os reinos, aquele acampamento parecia mais vivo que qualquer uma delas.

Me remexi no banquinho, vendo Diana provando a própria sopa, antes de voltar a encarar Ronny, que tinha os olhos nela, ainda parecendo chocado ao vê-la ali, viva. Mas isso era bom. A princesa estar "morta" significa a segurança de Diana. Então é melhor que continuem achando que ela está morta.

—Estou muito feliz por vê-la viva, vossa alteza. —Ronny afirmou, abrindo um sorriso. —Isso vai nos dar um motivo a mais para lutar. Estávamos sempre nos perguntando o que aconteceria se conseguíssemos derrota-la. Mas com você aqui, fica muito claro.

Diana abriu um sorriso fraco, desviando os olhos para a fogueira a nossa frente.

—Vamos ajudar no que pudermos, Ronny. Precisamos nos juntar com Cedric e Trevis e contar isso a eles. Tenho certeza que nos ajudando, vamos ter uma chance maior contra a rainha. —Diana olhou pra mim, parecendo, depois de muito tempo, feliz por ter alguma luz a se agarrar.

—Eu concordo. Ainda mais com essa informação de que vocês podem controlar o poder das safiras. —O homem murmurou, passando as mãos nos cabelos escuros e curtos. —Onde seus amigos estão agora?

—Em uma caverna perto da Cidade das Estrelas. —Falei, vendo os olhos do homem se voltarem pra mim. —Estamos com o príncipe, filho da rainha. É nosso prisioneiro. Estamos tentando recuperar as safiras. Ele é amigo da Kayla.

O corpo de Diana pareceu ficar tenso ao meu lado, quando Ronny pressionou os lábios em resignação ao ouvir o nome dela, com seu rosto se curvando em uma careta.

—A garota é poderosa. —Afirmou, engolindo em seco. —Eu a vi usando as safiras. Ela é...

—Perigosa. —Diana declarou, soltando um suspiro pesado, antes de erguer os olhos até ele. —Como foi? Como ela matou meu pai? —Questionou, com os lábios um pouco trêmulos. —Ela... ela hesitou ou apenas o matou, sem pensar duas vezes?

—Diana... —Toquei a mão dela, sentindo os dedos trêmulos e a respiração dela pesada.

—Eu só quero saber porque ela fez isso! —Ela me encarou, um pouco brava. —Por que matar todos eles? Ela já havia matado o rei solar, o príncipe... por que os outros também?

—Você sabe porque. —Ronny afirmou, trazendo a atenção de Diana e a minha pra ele de novo. —Seu pai não deu escolha pra ela, princesa. E eu tenho certeza que os outros reis também não.

—O que quer dizer? —Diana soltou minha mão, lançando um sorriso irônico pra ele. —Ela tinha as safiras. Ela não precisava se preocupar com mais nada!

—Será que não? —Ronny arqueou as sobrancelhas, curvando o rosto para próximo de Diana. —Me diga, princesa, você tem noção do que seu pai teria feito se tivesse as safiras da mão?

—Ele queria poder. Queria estar acima dos outros reinos. Mas todos eles queriam. —Diana afirmou, dando de ombros. —Mas ele ainda era meu pai. E apesar de tudo, eu o amava! Eu o queria bem!

—Eu sei disso. Eu também gostava muito do seu pai. Apesar dos pesares, ele era um bom rei para o seu povo. Mas o problema, alteza. —Ele abriu um sorriso fraco. —É que assim como todos os outros, o poder subiu a cabeça dele.

—Quer dizer que não posso odiar a Kayla por ela tê-lo matado? —Indagou, com um ar de descrença. —Matado meu próprio pai?

—Não, você tem todo o direito de odiá-la. Tem todo direito de querer justiça pela morte dele. Era seu pai, afinal. —Ele ficou de pé, desviando os olhos para o acampamento ao redor, parecendo pensativo, antes de se voltar pra nós. —Mas aquela garota não é um monstro. Assim como todos aqui, ela é uma sobrevivente.


Continua...

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