029.

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CORINGA

Depois de deixar Mirela no trabalho fui direto pra boca resolver uma parada que tava pendente desde de ontem. Papo reto mesmo, não queria que ela trabalhasse no estado que tá mas a mina é dura na queda e nunca me escuta.

Estacionei minha moto em frente a boca principal e cumprimentei os cara que já tava ali na ativa, tirei a chave e entrei na minha sala logo em seguida. Antes de fazer a contabilidade das drogas acendi meu beck de lei na manhã e sentei na minha cadeira.

Tinha uma pá de papel na minha mesa pra ser revisado, não era muito fã de números mas no caso da contabilidade da favela eu gostava de tá na frente, ou então colocava Ruivinho que manjava dessas paradas e tinha minha confiança.

Quando fui terminar as contas e ver que tava tudo batendo certo já era por volta de uma da tarde, tava na mó larica mas tinha que resolver mais um B.O, minha vida se resumia a isso.

Passei um radinho para o mano Cacau pedindo que ele vinhesse até mim, e por sorte não precisei esperar por muito tempo, o cara deu as caras minutos depois.

― Pode sentar ai ― mandei soltando a fumaça do meu beck, já era o segundo do dia.

― Então, oque que tu manda? ― ele sentou na cadeira todo largado.

― Me explica essa fofoca que tá rolando aí na favela, parece que o Digão abusou da própria filha, procede? ― cruzei os braços e encarei ele serinho.

Esse boato tá correndo solto desde de ontem só vejo gente comentando e fofocando, e no meu celular não para de chegar mensagem pedindo um posicionamento quanto a isso.

O problema é que eu não faço a mínima ideia do que tá acontecendo, ultimamente tô bastante desligados dos B.O do crime.

― É o seguinte, a muié do Digão veio atrás de nós pra relatar que o marido dela tava abusando da garota ― Cacau me explicou a idéia.

― O Digão? ― indaguei.

Não era colocando minha mão no fogo não mas eu conhecia o Digão, o cara é um homem honesto que trabalha duro para sustentar a família, não é envolvido no crime mas tem nosso respeito justamente por ser direito e sempre tá nos ajudando como pode.

Mas claro que não tô querendo dizer nada, a gente não pode confiar em ninguém nesse mundão.

― Tô com um pé atrás nessa história, tem uma pá de morador incoformado com a acusão ― Cacau me olhou desconfiado.

― Quero saber os dois lados da história, faz o seguinte leva o Digão pro desembolso e trás a mulher pra bater um lerô comigo ― mandei.

Não tinha outra forma de resolver aquele problema se não ouvindo os dois lados da moeda, depois de escutar eu tomaria minha decisão, não era novidade que a punição pra cuzão que estrupava no morro seria pena de morte, ainda mais a própria filha. Isso nós não perdoava.

― Vou convocar os manos pro tribunal, belê? ― Cacau tomou a iniciativa.

― Faz isso mermo ― concordei, assistindo o mano sair.

A intenção era curtir a brisa do meu beck por mais um tempo antes de sair pra resolver essa fita, mas quem disse que eu tenho paz?

Entre becos e vielas Onde histórias criam vida. Descubra agora