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AMÉLIA MILLER

O crepúsculo já caiu por toda a cidade, quando eu paro minha moto no estacionamento do Hospital Público de Bridgton. Eu desço do carro e pulo para o piso de concreto rachado, sentindo o ventinho gelado ricochetear meu rabo de cavalo de um lado para o outro. Olho para o céu brevemente; vem chuva por aí. Abaixo as mangas da minha blusa cinza, abraçando meu corpo enquanto corro para dentro do hospital, que também está frio por causa do ar-condicionado.

Antes de checar meu nome na recepção, mando uma mensagem para Noah. Foi loucura chamá-lo para vir a uma consulta minha, mas acho que preciso da companhia de um amigo pra me distrair, mesmo em um hospital.

N: Eu já cheguei.
N: Tô aqui em cima com a sua mãe.

  Sorrio e guardo o celular de volta na mochila. Depois de confirmar que eu sou eu com a recepcionista, eu pego o elevador até o andar de cardiologia. Como dito, Alec está na sala de espera conversando com minha mãe e eu dou de cara com ele assim que o elevador se abre.
  — É incrível, ele consegue ser mais pontual do que a paciente. — Diz minha mãe assim que me vê. Eu reviro os olhos. — Não revire os olhos pra mim, mocinha.
  — Desculpa se eu não quero ouvir um estranho perguntar se eu "já senti dor no peito durante minhas relações sexuais".

  O último médico em que eu fui me perguntou isso, e eu senti vontade de enforcar ele com o estetoscópio. Era invasão de privacidade, além disso, me deixou com o rosto todo vermelho de vergonha; minha mãe estava sentada bem do meu lado.
  — Ele só estava fazendo o trabalho dele, querida. — Suavemente, minha mãe passa a mão no meu rosto e no meu cabelo. — Você sabe que transar pode acelerar…
  — Aaaah, eu não sei de nada. — Digo, um pouquinho alto demais, e tampo os ouvidos com as mãos. Minha mãe sorri e revira os olhos, apoiando a mão esquerda no quadril. — Não revire os olhos pra mim, mocinha.
  — Diz isso de novo e você fica um mês de castigo. Espera aqui, que vou avisar ao doutor Castella que você chegou.
  Ela deixa um beijo na minha testa e depois sai andando, me deixando sozinha com o Noah. Me sento ao lado dele no sofá branco do hospital.
  — E ai, se divertindo com o hospital cheirando a antibiótico? — Lhe dou um empurrãozinho com o ombro e solto uma risada.
  — Claro…já vi um cara chegando com um ataque cardíaco; me senti em um episódio de Grey's Anatomy.

  Dou risada outra vez e Noah sorri, satisfeito por me ouvir soltar esse som com tanta frequência.
  — Desculpa... não é uma saída entre amigos ideais, só queria alguém pra me distrair um pouco. — Admito, mas isso não parece o abalar.
  — Tá tranquilo. Na verdade, é bom sair com você de novo. Já faz tanto tempo, né?
  — É, faz. Daqui a gente pode ir no The Jhon's Roller, o que acha?
— Eu topo.
  Ele levanta o punho e eu levanto o meu, encostando os dois em um cumprimento amigável.
  — Lia, vem. — Minha mãe volta para a sala de espera, me chamando com um aceno da mão. — Ele vai te atender agora.
  — Deseje-me sorte.
  Sorrio para Noah e depois me levanto, seguindo minha mãe pelo corredor.
  — Amélia Miller, quanto tempo. — O doutor Castella sorri de forma amigável para mim e aperta minha mão, quando me sento de frente para a mesa dele. — Sua mãe me avisou dos imprevistos que a impediram de vir nas outras consultas.

Olho para a minha mãe, que está bem ao meu lado sorrindo de forma cínica. Sorrio de volta, e olho para o Castella.
  — Sim, eu tô muito apertada com a escola. — Minto
  — Então que bom que veio hoje. Muito bem, vamos ver…
  Ele abre minha ficha na tela do computador e abaixa os óculos até a ponta do nariz, elevando um pouco o queixo para cima, para conseguir ler. Eu fico apreensiva onde estou sentada, revirando a todo momento minhas mãos em cima do colo, enquanto tento enxergar qualquer tipo de emoção nos olhos do médico. Mas ele nunca demonstra nada; está sempre muito sereno.
  — Humm…a última vez que você fez um exame, uma de suas artérias parecia estar dando um trabalhinho extra. — Ele diz, a voz grave e sonolenta invadindo meus ouvidos. — Você tem sentido dores, Amélia?
  — Hã…não. — Apenas palpitações cardíacas exageradas quando vejo o Charlie. — Eu tô bem.
  — E dificuldade para respirar? Alguma?
  — Nada…
  — Tem feito os exercícios aeróbicos?
  Abro a boca para falar, mas minha mãe me interrompe.
  — Essa daqui? Exercícios? — Ela ri e eu já sinto o rubor subir por minhas bochechas. — Doutor, ela não levanta o rabo do sofá nem pra lavar uma louça.
  — Mãe! — Resmungo entredentes, enquanto escorrego pela cadeira macia.
  — E a alimentação? Tem se alimentado direito?

ALL FOR US - Charlie BushnellOnde histórias criam vida. Descubra agora