Às sete horas e trinta minutos, por todos os dias da semana: chegava ao prédio o homem, olhava endireitado para o elevador aguardando a espera da descida ao andar térreo, e então constrangido, depois de todos os colegas juntarem-se à parte interior do elevador, sujeitava ao porteiro Jurandir seu olhar de lado, como se estivesse levemente constrangido à presença do homem simples que era, o ignorava e seguia seus colegas - era apenas mais um simples porteiro.
Vestia sempre muito dinheiro o homem, calçava sempre os sapatos mais valiosos das prateleiras da zona sul do Rio de Janeiro - caminhava devagar. Caminhava como se estivesse desfilando, reluzia seu corpo esbelto da academia que frequentara - sempre às onze horas em ponto, antes do almoço, que era para não dar refluxo e nem gerar mal estar depois.
Só após a academia almoçava, e então voltava ao prédio. Não havia colegas junto a ele pela tarde após a academia. Esbanjava sempre a sua vida, andava sempre com a sua pasta de couro preto e nobre, de dois pares de rodinhas, que o acompanhava por todo lugar, até mesmo na academia - afinal de contas, como ele iria guardar seu terno e par de sapatos de couro em uma simples mochila?
Não havia amigos à espera do elevador pela tarde, e então encontrava-se somente ele e seu Jurandir à espera do elevador. Sujeitava ainda à Jurandir seu olhar de lado, constrangido - notava a presença de Jurandir, mas ficava calado. Notava a presença de Jurandir pela tarde, não que não notasse pelas manhãs - mas como é que poderia ter sobre as suas atenções pela manhã, o sujeito que vestia apenas uma camisa social barata que com certeza havia sido feita sob encomenda pelo síndico do prédio?
Havia se sentido muito bem após a academia, naquela quinta-feira. Estava sentindo-se leve, com o ar da graça - era uma ave livre a voar ao nascer do sol, mas havia de voltar para a sua gaiola.
Pôs-se então à frente do elevador, ao lado do Jurandir, por conseguinte - portava o ar da graça, e então resolveu oferecer ao Jurandir uma cortesia. Antes de entrar no elevador, virou-se para o porteiro, sujeitou-o ao olhar de canto novamente, mas falou com o sujeito desta vez:
- Opa! - acenou com a cabeça, como alguém que oferecia privilégio e cortesia ao cumprimentar o sujeito e como alguém que se retratava a um cachorro de rua, especialmente pelo balanço deslocado da cabeça.
Jurandir pôs-se então ao elevador junto ao homem e disse:
- É mesmo uma pena que estejam vendendo esse prédio, tantos anos de história para isto!
Confuso e desleixado, respondeu o homem:
- Estão vendendo este prédio? Como pode? De onde o senhor tirou isso? Posso te certificar de que não há em todo esse Rio de Janeiro, homem capaz de tirar da mão dos Teixeira este prédio. Com certeza é mais um daqueles mil boatos que vem circulando sobre a família Teixeira! Não é possível uma coisa dessas... - Disse o homem, minimizando Jurandir, nas palavras desta vez.
- Pois parece que há sim. - Concluiu Jurandir.
- Olha, o senhor que me desculpe, mas não há mesmo! Dou-lhe meu paletó e meu par de sapatos se me arrumar o telefone do sujeito que tem condições de tirar esse prédio da mão dos Teixeira! Faça-me o favor... - Propôs o homem.
Jurandir passou seu telefone ao sujeito e saiu do elevador com seu paletó e par de sapatos novos.