Eram apenas conhecidos-desconhecidos, porém se esbarravam pelas trilhas da fazenda-fazenda quase que diariamente, e então – por obra do cotidiano – começaram a cumprimentar um ao outro, sempre que se esbarravam:
– Quêm – Disse o pato-pato.
– Au! – Disse o cão-cachorro.
No dia seguinte:
– Quêm?
– Au! Au!
Depois:
– Quêm!
– Au!
E assim viviam, o pato-pato sempre que saía do serviço no lago das cascavéis, esbarrava com o cão-cachorro – que ia, por sua vez, trabalhar no rebanho – e o cumprimentava. Era sempre apenas o básico – um "Quêm" ali, um "Au!" acolá, outro "Quêm" ali... Assunto não haveria de faltar, haveria de faltar tempo, com certeza. Ao cão-cachorro, restava seguir rumo ao rebanho para não chegar atrasado no serviço – era pai de duas cadelas lindas, e tinha de dar às duas, o que só um pai com emprego poderia dar. Ao pato, restava seguir seu caminho e ir à padaria dos tamanduás comprar massa de pão para a pata-pata fazer mais tarde (se demorasse, daria de perder tempo e chegar já quando os tamanduás estivessem dormindo) – o pato-pato, diferente do cão-cachorro, não tinha filhas ainda, e então reservava todo o tempo que lhe sobrava à sua esposa: pata-pata.
No dia do aniversário de 5 anos de pato-pato, quando pato-pato foi trabalhar, observou de canto que uma nova família estava se mudando para a casa vizinha à casa dele, e então pediu à pata-pata que fizesse uma torta de boas vindas para entregar aos vizinhos quando chegasse do lago – ela, por sua vez, pediu-lhe que trouxesse ovos e leite para fazer a torta, já que havia acabado os que estavam na dispensa da cozinha.
E então pato-pato foi ao trabalho. Limpou todo o lago das cascavéis, capinou toda a beira do lago e ainda recolheu lenha seca da floresta dos macacos-prego e levou à família cascavel. Agora sim, poderia voltar para casa – seguiu então a sua trilha.
Neste dia, diferentemente dos demais, não encontrou com cão-cachorro ao voltar para casa – estranhou. Passou pela padaria da família tamanduá – como sempre passa – e encontrou-a fechada, ainda que estivesse no horário de estar aberta – estranhou. Passou melo mercadinho de bairro da família ganso-ganso para comprar ovos e leite para a torta de boas vindas dos vizinhos e encontrou-o com uma placa na porta, que dizia: estamos fechados – estranhou.
Seguiu rumo à casa, dentre outras coisas, pensava que a família-família (os donos da fazenda-fazenda) havia se mudado do lugar; que levaram os bichos junto; que bem que macaca-macaca havia dito que estavam pensando em se mudar; que não sabe o que será dele e de pata-pata sem os bichos da fazenda-fazenda; que não tem onde cair morto se não tiver a fazenda-fazenda; que pata-pata vai reclamar de não ter trago ovos, leite e a massa de pão; que sente saudades da família dos patos; que deveria voltar para visitá-los.
Depois: que a família-família não faria isto com eles; que devem ter viajado e levado alguns dos bichos; que não pode ser possível que tenham esquecido deles e ido embora; que eles não ficariam
sem os ovos de pato e as tortas da pata-pata; que ele limpa lagos como ninguém, e que ninguém na fazenda-fazenda limpa lagos como ele; que também por isso, a família-família não o deixaria para trás; que se foi deixado para trás, ainda poderia voltar à casa da família dos patos. Chegou à sua casa.
Ao chegar em casa, tomou – de súbito – uma grande surpresa: pata-pata havia feito uma festa-surpresa para comemorar o aniversário de pato-pato. O pato-pato ficou aliviado, extasiado e surpreso, afinal de contas, estava tudo fechado por conta de todos terem ido à sua festa de aniversário. De tão espantado e confuso, trocou até mesmo as palavras, e disse:
– Au!
O cão-cachorro, sem entender, disse:
– Quêm! Quêm!
O tamanduá – contido, sem dizer nada – bateu com as patas ao peito, como fazem os macacos-prego.
Os macacos-prego, sem entenderem nada, começaram a catar formigas.
As formigas, mesmo sem terem a quem recorrer, gritaram:
– Socorro! Socorro!
A família-família, espantada e em choque com o caos, começou a catar folhas, e então as formigas que estavam catando as folhas gritaram:
– Au! Au!
O cão-cachorro, ainda mais confuso, começou a catar folhas, e então a família-família, que estava catando as folhas, começou:
– QUÊM! QUÊM!
Depois a caçula:
– Quêin! Quêin!
Depois o mais velho, com a voz grossa que herdou do pai:
– QUÊM! QUÊM!
Depois o recém-nascido, que completava quatro semanas na data, pôs-se a chorar:
– QuêêÊeem! QuêêÊeem!
E desde então, a vida é assim na fazenda-fazenda: a família pato-pato late e espanta o rebanho; os tamanduás se metem nos galhos, comem bananas e batem nos peitos; os macacos-prego catam formigas e fazem pães; a família cão-cachorro faz as tortas e limpa o lago; as formigas fazem compras na cidade e controlam a fazenda-fazenda e a família-família bota ovos e limpa o lago junto da família cão-cachorro.