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– Interessante – ela fala lentamente. – Você já pensou melhor nisso?

Dou de ombros. Só obsessivamente, a ponto de me fazer perder o sono.

– Estou brava comigo mesma por tê-lo deixado me irritar. Você não tem ideia de como é difícil passar o dia sentada de frente para ele, tentando resistir a seus ataques constantes.

– Eu tenho uma ideia. Chamo isso de “diplomacia arriscada”.

Helene aponta o polegar na direção da parede.
Ela é a pessoa perfeita em quem confiar. O senhor Bexley está do outro lado da parede agora, tramando maneiras diversas de assassiná-la. Ela acompanha meu olhar. Ouvimos um espirro que mais parece uma buzina, o barulho de alguém soltando gases e alguns resmungos.

– Por que ele imaginou que você estivesse mentindo? E por que isso a deixou tãoirritada assim? – indaga Helene, desenhando espirais em seu bloco de notas.

Sinto-me um pouco hipnotizada. Ela se transformou em minha terapeuta.

– Louis me acha uma piada. Ri o tempo todo do que os meus pais fazem.
Tenho certeza de que ri da escola onde estudei, das minhas roupas, da minha altura, do meu rosto.

Ela assente pacientemente, esperando que eu desenvolva esse emaranhado de pensamentos.

– E me incomoda saber que ele pensa isso de mim. É o que me irrita. Só quero que ele me respeite.

– Você valoriza sua reputação de ser gentil e acessível – ela complementa.
– Todo mundo gosta de você. Ele é o único que resiste.

– Ele vive para me destruir.

Talvez eu esteja adotando um tom excessivamente dramático.

– E você, para destruí-lo – ela aponta.

– Sim. E eu não quero ser esse tipo de pessoa.

– Não interaja com ele hoje. Você pode ficar no escritório desocupado do terceiro andar. Podemos transferir seus telefonemas para lá.

Nego com a cabeça.

– É tentador, mas não. Eu dou conta de enfrentá-lo. Vou esboçar o relatório trimestral e ficar quieta. Vou esquecer que ele existe.

Ainda lembro do sabor de sua boca. Inspirei suas expirações quentes até meus pulmões se verem cheios dele. Seu ar estava dentro do meu corpo. Em dois minutos, ele me ensinou coisas que toda a minha vida não tinha me ensinado.
Esquecer sua existência vai ser um desafio, mas a nova vaga não é nada além de desafios.

Fecho delicadamente a porta do escritório de Helene e me recomponho.
Viro-me e ali está ele, tranquilo em sua cadeira.

– Oi.

Sou recebida com uma versão diferente de “Como Você Está?”.

– Olá – respondo duramente antes de andar até minha mesa.

O que ele diz em seguida me deixa abalada: – Eu sinto muito. Muito, muito mesmo, Sn.

Acredito nele. A memória do seu semblante dolorido enquanto se afastava de mim no bar praticamente me impossibilitou de dormir por duas noites seguidas.

Agora é a hora. Eu poderia levar-nos de volta ao status quo.
Poderia esbravejar com ele e ele esbravejaria em resposta. Mas esse não é o tipo de pessoa que eu quero ser.

– Sei que sente.

Nós dois sorrimos e olhamos um para a boca do outro, o fantasma do beijo ainda pairando entre nós.

O jogo do amor "Ódio"!   Louis Partridge Onde histórias criam vida. Descubra agora