Capítulo 30

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- Eles encontraram o carro que Sanzu e Ran usaram - disse Koko, engolindo em seco. - Estava abandonado. E havia rastros de outros veículos, eles foram emboscados.

- Acha que eles foram sequestrados? - Mikey murmurou, o olhar incandescente e os músculos do rosto tensos.


- Bom… - ele se agitou sob as próprias pernas. - Havia uma grande quantidade de sangue no local, então com certeza houve luta. Mas não encontraram nenhum corpo.

Kokonui e Manjiro haviam retornado ao escritório da gangue quando ficou claro, pelo serviço de inteligência da Bonten, que nenhum deles pôde ser encontrado. Em uma jogada só, South havia distanciado quatro dos membros mais importantes da organização e agora mantinha os demais no escuro.

Todavia, a situação era ainda pior do que já aparentava. 

Mikey jogou os celulares de Ran e Sanzu sob a mesa de mogno com um estalo, sobressaltando Koko, que arregalou os olhos e perguntou:

- O que é isso?


- Foram encontrados no apartamento de Ran, escondidos. Não foi um descuido proposital - juntou as sobrancelhas e apoiou os cotovelos na mesa, - ele fez isso na pressa.


- Quem?


- Ran - praticamente rosnou. - Ele não teve tempo de destruir os aparelhos, por isso apenas os enfiou no primeiro lugar que encontrou. Esse foi o primeiro erro. O segundo foi acreditar que apenas abandonar o carro seria o suficiente para me enganar.


- O que está querendo dizer, Mikey? - Koko riu, nervoso.


- Nós fomos traídos, Koko. - Olhou para seu subalterno com convicção, deparando-se com sua expressão perplexa. - E eles levaram Sanzu.


- Não - riu, ainda desacreditado. - Eu estava com Rindou ainda hoje, ele…


- Eu estava com Mochizuki também, havia o despachado para cumprir um trabalho, e sabe o que descobri cinco minutos antes de você entrar nessa sala? - Seu lábio superior se ergueu em desprezo. - Que ele sequer fez o que eu mandei. E, assim como os Haitani e Sanzu, ele desapareceu.


- O que te faz pensar que Sanzu também não o traiu? 

Um arrepio sinistro subiu pela espinha do Sano, mas ele dispensou a sensação com um suave balançar de cabeça.

- Sanzu nunca me trairia.

Embora já tenha se sentido tentado a matá-lo na noite anterior.

- Não sei não, Mikey…


- Você apenas não quer acreditar. Eles nos traíram, Koko.


- Mas eles são nossos amigos, não são? - Sua voz falhou.

Eles eram todos amigos, não? Passaram anos juntos, construindo a Bonten e defendendo uns aos outros. Até mesmo Sanzu, o mais infame deles, os tratava como seus iguais embora fosse ele o vice-presidente. E de todas as vezes em que Kokonui foi sequestrado por grupos rivais nunca lhe passou pela cabeça que pudesse ser abandonado por eles, pois além de ser importante  para o grupo ele sabia que também era querido por todos.

Manjiro lhe lançou um olhar tão triste que Koko sentiu seu coração parar de bater por um momento. Ele realmente não queria acreditar.

Lógico que todos ali não eram flores imaculadas, provavelmente eram um jardim de hera venenosa, mas traição? Parecia baixo demais, principalmente depois de tudo pelo o que passaram.

- Koko - chamou Mikey - pare de tremer.


- Não consigo - resmungou quase rosnando. Seu sangue fervia em fogo baixo ao tentar assimilar tudo aquilo.  - Por que eles fariam isso?

Os ombros de Mikey caíram e ele disse: 

- Acho que a culpa é minha.


- Como assim?


- Eu surtei, passei meses trancado no quarto e mal lembrava meu próprio nome. Não sou tolo, sei que minha ausência afetou a gangue mais do que transparece, - suspirou - Ran deve ter tentado segurar as pontas o máximo que pôde, esperando por mim. Mas eu demorei demais.


- Isso não é desculpa, não justifica o que está acontecendo!


- Não é ilógico pensar que seria melhor se eu saísse de cena.


- Você fundou essa gangue, seguimos você porque acreditamos - Koko estava tremendo ainda mais. - Você nunca foi perfeito, mas jamais teria nos traído ou abandonado. 


- Koko…


- Sabe por quê eu escolhi seguir você? - Foi para o outro lado da mesa, ficando cara a cara com o Sano. - Porque eu vi como você liderava seus companheiros, daí pensei “nossa, esse cara vai voar alto, vou faturar muito dinheiro com ele”.

Mikey sorriu, Kokonui nunca escondeu seu apreço pelas notas de cem. 

- Mas aí eu fui sequestrado pela primeira vez e eles me torturaram - ele apertou os punhos. - E no meio daquilo tudo eu me perguntava “por que diabos não digo o que eles querem saber? Seria tão fácil”. Fiquei muito assustado quando me dei conta de que não disse nada porque se eu o traísse você ficaria triste, Mikey.

O Sano arregalou tanto os olhos que sua visão ficou turva. 

- E fiquei mais assustado ainda quando entendi que se fosse você  no meu lugar preferiria ser torturado e morto a trair algum de nós. - Koko sorriu. - Você não é uma pessoa boa Mikey, mas até você tem qualidades. Talvez seja por isso que Sanzu é tão obcecado por você.

Mikey escondeu o rosto nas mãos para que Koko não visse seu sorriso e murmurou: 

- Não esperava receber uma declaração de amor.


- Não vá se achar demais.

Aquilo aliviou um pouco do peso que Manjiro estava sentindo, embora a incerteza sobre o destino de Sanzu o deixasse à beira de um ataque de nervos

Todavia, foi quando um subordinado entrou em sua sala carregando uma caixa cheia de fotos de um Sanzu apagado e  acorrentado que Mikey explodiu. Ele chutou a mesa até o outro lado do escritório, gritou obscenidades e jogou um conjunto de cadeiras pela janela. Manjiro teria matado algumas pessoas também, mas Koko o impediu de sair para executar tal idiotice sobre subordinados inocentes. South fez aquilo para o provocar, bem como Sanzu havia feito com ele no incidente do porco. Ran, Rindou e Mochizuki estavam no meio disso, o que deixou Mikey ainda mais transtornado.

Kokonui olhou para seu chefe - que mais parecia uma bomba atômica em supressão - e endureceu seu coração. Independente do que acontecesse dali em diante Koko não teria pena.

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