Capítulo 26

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- Você parece feliz. - Disse Ran, mal contendo o sorriso ao olhar para Sanzu.


O Haruchiyo parecia tímido, as pernas inquietas sob a mesa do bar e os lábios presos entre os dentes. Ele realmente estava feliz, mas também se sentia perdido. Mikey o queria, o que era ótimo, mas não era o suficiente. Sanzu desejava que o Sano o amasse. Que entregasse sua alma a ele também, e não apenas o corpo. Sanzu pertencia a Mikey por inteiro, ele queria ter esse poder na vida do outro também. 

Estava se tornando muito ganancioso.

- Ran - ele chamou, baixinho. - Acha que o Mikey…?


- O que? - O Haitani ergueu uma das sobrancelhas em curiosidade.


- Acha que o Mikey pode… - Sanzu engoliu em seco. - Acha que ele pode me amar?

Ran o encarou seriamente e recostou-se no estofado da cadeira, cruzando as pernas. O cassino estava praticamente deserto, afinal já passava das quatro horas da manhã e, além deles, não havia ninguém ali. O lugar estava quase na penumbra e a única coisa que os separava era uma mesa com uma garrafa de whisky em cima. Garrafa essa que Sanzu sequer encostou, o que provou ao Haitani que seu vice-presidente realmente estava sendo perturbado por pensamentos intrusivos.

Fazia algumas horas que Ran havia retornado de sua reunião com a Rokuhara Tandai e desde então trancou-se no cassino para beber, odiando-se por ainda se importar com os idiotas que estava traindo. Principalmente o idiota a sua frente, que o olhava como uma criança em busca de orientação. O Haitani não fazia ideia de como Sanzu o encontrou ali de madrugada, mas como ele parecia muito desnorteado após finalmente transar no pelo com Manjiro Sano, Ran cedeu um lugar à mesa para ele.

Ao que tudo indica eles estão em um impasse. Uma hora trepam como animais, em outra estão a um passo de se matarem. Ran pressentiu que teria muita dor de cabeça.

- Não sei se você reparou, Sanzu - começou Ran, bancando o conselheiro amoroso. - Mas nosso chefe tem tendências bastante específicas.


- Como assim?


- Lembra quando ele arrancou o olho daquele cara com um alicate? - Se referiu a um antigo traidor da Bonten. - Ou quando ele jogou aquela mulher da ponte por ter desviado a carga de drogas em Kyoto? - Sanzu assentiu. - E quando ele cortou os antigos sequestradores do Koko em pedacinhos minúsculos? 


- Sim, eu lembro de tudo isso.


- O que isso revela sobre o Mikey para você?


- Que ele é muito eficiente.

Ran revirou os olhos.

- Mikey é um psicopata narcisista, Sanzu. - O Haitani afirmou e revirou os olhos novamente quando o Haruchiyo abriu a boca estupefato com sua constatação. - Não sei como ele era antes de nos conhecermos, mas desde que estamos todos juntos nunca o vi agir de um modo diferente.


- Você não conhece ele há tanto tempo quanto eu - Sanzu o defendeu. - Mikey sempre se importou com as pessoas que o cercavam, não acho que ele seja um psicopata.


- Pode ser, mas você não é nossa melhor fonte de informação.


- Por quê?


- Eu realmente preciso elaborar? - Riu. - Além de estar apaixonado por ele, você não é a pessoa mais sã que conheço.


- Blasfêmia.


- Você prendeu um cara vivo dentro da carcaça de um porco e o deixou lá para morrer. E parecia muito alegre fazendo isso. No mínimo você tem algum problema.

Sanzu apoiou os cotovelos na mesa e segurou o queixo nas mãos, fazendo bico. Ran soltou um risinho, aquela criatura era inacreditável. O Haruchiyo ficou alguns segundos em silêncio, observando Ran beber um longo gole de seu copo cheio de whisky.

- Não estou apaixonado por ele - disse, despertando a atenção do Haitani. - Eu o amo.


- Tá mais para obsessão.


- É diferente, você não entenderia. - Seu olhar escureceu. - Quero que ele me ame, Ran. Como faço isso?

O Haitani suspirou, massageando as têmporas. 

- Do que o Mikey gosta? - Perguntou.


- Me humilhar.

Sanzu falou tão sinceramente que Ran quase caiu da cadeira de tanto rir. Aqueles dois, pelo amor de deus. 

- Bom, - ele conteve o riso quando percebeu que o Haruchiyo o encarava puto da vida - eu ia sugerir que você fizesse algo que ele aprecia, se Mikey gosta de te humilhar deixe que ele faça isso então.


- Ele já faz, mas não adianta de nada.


- Então pense em outra coisa - levou o copo à boca mais uma vez. 


- Estou pedindo sua ajuda porque não sei o que fazer.


- Flores?


- Se eu aparecer com flores Mikey vai me fazer engolir elas.


- Chocolates?

A expressão de Sanzu deixava claro que Manjiro provavelmente esmagaria os bombons entre os dedos com uma maldade indescritível.

- Ele gostou do Parque de Diversões, não? - Ran tentou animá-lo. - Você vai pensar em alguma coisa.


- Preciso conquistá-lo. 

Ran respirou fundo e apoiou o copo de volta na mesa, sentia-se ansioso. Ele estava de frente a uma oportunidade inédita de manipular Sanzu e não podia perdê-la, embora estivesse inseguro de como o abordar. Sanzu estava brincando com a garrafa sob a mesa, olhando para ela como se contivesse os segredos do universo mas não a fórmula de conquistar Manjiro Sano, ele parecia bem decepcionado. Se o Haruchiyo percebesse a armação o mataria com aquela mesma garrafa.

- Talvez…- Começou Ran, atraindo o olhar esperançoso de Sanzu. - Talvez eu possa te mostrar um lugar interessante para você impressionar o presidente.


- É mesmo? Qual?


- Venha me encontrar ao pôr do sol, o levarei lá.

Sanzu ponderou,  e o Haitani sentiu o suor frio descer por sua coluna até ele responder:

- Tudo bem.

Para a completa surpresa de Ran, o Haruchiyo sequer desconfiou. Olhando para o sorriso besta de Sanzu, ele quase se sentiu horrível por trair sua confiança. Seu vice-presidente nem imaginava que seria conduzido à própria morte.

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