Parte 9

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“Você precisa parar de pensar nisso!” Nanon falou sozinho e sorriu sem jeito para Ohm quando se aproximou.

Ele o cumprimentou com um leve aceno de cabeça, se virou, parecendo tão constrangido quanto Nanon, e começou a caminhar e os dois seguiram em silêncio.

Nanon não demorou muito tempo para reconhecer o caminho da cafeteria que Ohm tinha escolhido para fazer sua primeira refeição.

A memória enterrada do primeiro ano da faculdade retornou com força e ele lembrou de como havia sido doloroso voltar para seu quarto de pensão após tentar uma vaga como garçom naquele lugar.

Ele olhou suas roupas e nesta manhã estava vestido de maneira muito mais elegante do que na época, no entanto, ele ainda se sentia inadequado. De certa forma, as roupas não eram diferentes da fantasia de palhaço que ele usava, afinal estas vestes não retratavam quem ele era.

Ele olhou de soslaio para Ohm, depois baixou o rosto e colocou as mãos nos bolsos.

Ele e Ohm tinham quase a mesma altura e usavam roupas semelhantes. O terno de Ohm era antigo e um pouco desgastado, mesmo assim ele ainda possuía aquela aura de pessoa rica, uma postura altiva, uma leveza no andar e uma displicência de quem não precisa se preocupar com coisas básicas e nem mesmo se será aceito ou não.

Nanon empurrou as mãos mais fundo nos bolsos, suspirou e o chefe o encarou. Ele não conseguiu evitar o pensamento de que, se isso tivesse acontecido no dia anterior, Ohm perguntaria se estava tudo bem.

Nesta manhã, Ohm se mantinha esquivo e longe de perguntas que pudessem trazer à tona assuntos pessoais e Nanon não o julgou por agir dessa forma. Além disso, ele não queria falar sobre o que o incomodava.

Fazia muito tempo desde que tinha se candidatado à vaga e provavelmente o gerente não era o mesmo. De qualquer forma, ainda doía lembrar das palavras que foram usadas por ele.

“Você é bonito e eu conheço seu tipo.” Nanon se arrepiou com nojo ao lembrar daquele homem dizendo essas palavras enquanto tocava seu ombro; a mão dele desceu pelo seu braço e acariciou de leve sua cintura “Mas tipos iguais a você podem despertar certos interesses escusos ou passar uma imagem pouco adequada para nosso negócio e não queremos ofender nossos clientes com o tipo de gente que você é.”

Ele se arrependia de não ter quebrado a cara daquele homem asqueroso ao ouvi-lo dizer que não o contrataria, mas pagaria bem por algumas horas fora dali.

“Você não deveria negar um pouco de dinheiro extra.” Foram as últimas palavras que Nanon ouviu dele, antes de sair em disparada para a rua.

Ohm tinha visto Nanon suspirar, colocar as mãos nos bolsos e baixar os olhos.

Ele não tinha certeza de que conhecia Nanon tão bem assim (talvez tivesse conhecido mais do que gostaria na noite anterior e ele balançou a cabeça para não reviver aquelas lembranças), porém seu amigo parecia acuado, como se alguma coisa o assombrasse. Talvez ele se culpasse pela noite anterior e Ohm entendia o seu desconforto porque também era estranho para ele.

Contudo, Ohm tinha decidido que as revelações da noite passada não eram um problema. Nanon tinha garantido que não havia se envolvido com pessoas da fazenda e Ohm esperava que ele também não voltasse a ver Tay. Sendo assim, não havia motivo para que ele se sentisse desconfortável na sua presença. Eles podiam continuar sendo amigos. Nanon era seu funcionário, um ótimo funcionário e um bom amigo.

Ohm reparou que Nanon ficava mais ansioso quanto mais próximos chegavam da cafeteria. Ele tocava no relógio em seu pulso com mais frequência do que normalmente fazia e vê-lo deste jeito o agoniava.

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