Parte 2

160 32 93
                                    

Nem bem ele estacionou o carro, Marie saltou do veículo e correu até a bilheteria. O Palhaço estava lá e fez uma grande reverência para ela, que dava pulinhos no mesmo lugar e ria, cobrindo a boca.

Ohm notou que a calça de Nanon havia sido remendada na parte de trás, mas o tecido já esgarçava ao lado e, provavelmente, rasgaria antes da próxima apresentação.

O público era um pouco maior do que na noite anterior, mas o lugar parecia ainda pior. O vento forte da madrugada tinha rasgado ainda mais a lona que cobria o picadeiro e novamente ele se via rezando para que não chovesse. O Mágico parecia ainda mais bêbado, como se tivesse passado o dia fazendo garrafa atrás de garrafa desaparecer. Não existiria mágica no mundo que o fizesse sobreviver até o final do ano, caso continuasse bebendo desta forma.

O novo vizinho de Ohm se aproximou e o cumprimentou. Ele tinha comprado as terras do senhor P’Tha, que tinha ido à falência durante a guerra. Ohm sabia que o antigo vizinho não conseguiria manter seus investimentos por muito tempo porque P’Tha tomava uma série de decisões administrativas ruins.

Khun Saint parecia mais atento aos novos ares e Ohm via nele uma possibilidade de parceria. O vizinho estava acompanhado da esposa e do filho, que tinha a mesma idade de Marie. As crianças começaram a conversar e Ohm sentiu de novo aquela pontada no peito e saudade da esposa.

Marie ria, mexia no cabelo e parecia ainda mais meiga do que normalmente era ao conversar com o filho do vizinho. Se fosse para ela ter uma paixão infantil, Ohm pensou, era melhor ser por alguém da idade dela e não por um adulto como aquele palhaço, por mais charmoso que ele fosse.

Ohm procurou por Nanon, mas não o encontrou do lado de fora. Ohm chamou Marie para entrarem, pois ele já deveria estar se preparando para a apresentação.

O casal vizinho sentou ao seu lado e mostravam as mesmas apreensões que Ohm teve no primeiro dia. O que os acalmava era o fato das crianças estarem se divertindo.

Na volta para casa, Marie falava animada sobre a apresentação e  contava sobre o que o novo amigo tinha gostado. Os dois concordavam que Birabongse era o melhor artista e o mais simpático. Ohm sorria e acenava com a cabeça para a filha.

No domingo de manhã, Ohm fez sua corrida habitual, seguida de um banho e uma refeição rápida sem a presença de Marie, que tinha preferido ficar dormindo.

Ele resolveu alguns problemas e fez algumas ligações e pediu para preparem o carro novamente. A última apresentação do circo aconteceria ao meio-dia e Ohm dirigiu até lá sozinho.

Ele não sabia o porquê da sua vontade de ver o mesmo espetáculo pela terceira vez, já que a cada exibição, eles pareciam mais cansados e arruinados.

“E aí, Chefe! O senhor veio de novo!” O Mágico, completamente embriagado, apontou e sorriu para Ohm, que o cumprimentou sério “Tudo… aqui…. tuuudo…. está à venda” ele dizia com uma voz mole e cambaleou ao andar até Ohm “Eu também, se pagar um preço bom.” Ele piscou, riu, virou para o lado e vomitou, sendo amparado por um dos ajudantes de palco.

“Me desculpe, senhor!” Uma das Malabaristas disse “Ele não sabe o que vai fazer da vida agora e está um pouco perdido e confuso.” Ela tocou o braço de Ohm “No entanto, ele não está totalmente errado sobre nosso preço…” Ela piscou também e Ohm se afastou.

Ohm franziu o nariz porque ela não cheirava melhor do que o Mágico e talvez também tivesse bebido. Aquele era um grande show de horrores e ele tentava entender o que o tinha trazido até ali.

Não havia mais do que dez espectadores e boa parte deles foi embora assim que o Mágico, que se arrastava pelo picadeiro, tirou uma garrafa de licor de dentro das calças e a bebeu praticamente toda de uma vez, dando um sonoro arroto ao final, antes de cair de costas e desmaiar.

TempoOnde histórias criam vida. Descubra agora