Chimon olhava para o teto do estábulo e contava os buracos por onde a luz das estrelas passava. O cheiro dos animais era familiar e isso o confortava, pois era a única coisa que parecia normal na sua vida desde o velório da sua avó.
Ele não lembrava direito daquele dia, as memórias eram confusas: tinham muitas pessoas ao seu redor, muitas vozes, muitas perguntas, muitos abraços, muitas coisas acontecendo ao mesmo tempo e quando ele chegou em casa, depois de tudo isso, não havia nada. Não havia mais ninguém. Nem ele parecia estar ali.
Naquela noite, ele dormiu assim que deitou na sua cama e foi sua última boa noite de sono.
Tinha se tornado um hábito acordar de madrugada para ajudar a avó a ir ao banheiro, dar seus remédios e verificar se estava tudo bem. Agora, quando acordava, não havia nada para fazer. Além disso, o som do vento passando pelas frestas das portas só o lembrava daqueles gemidos e sussurros abafados pela terra.
Não era real, ele tinha consciência disso e tampouco existia medo, porque os espíritos nunca o importunaram como algumas pessoas vivas fizeram. Esta era somente uma sensação que o acompanhava, como se White ainda o perseguisse, sendo eternamente uma presença desagradável, tanto em vida quanto após a morte. Ele não o assustou em vida, mas o cansava mesmo estando muitos metros abaixo da terra.
A volta para casa era cada vez mais difícil e ele nem saberia dizer em que momento começou a dormir no estábulo. Um final de tarde, após seu expediente, ele resolveu ficar um pouco mais por ali; em um outro dia, ele cochilou e acordou de madrugada; depois, para passar a dormir ao lado dos animais, foi consequência.
Ele voltava para casa a cada dois ou três dias para trocar de roupa e tomar um banho corretamente, mas, honestamente, nem isso ele tinha vontade de fazer.
Tanapon tinha ficado junto dele durante todo o funeral, tinha segurado sua mão e acariciado seus dedos. Várias vezes ele se perguntou se realmente se lembrava deste fato ou se era uma fantasia criada por seus desejos, tentando tomar lugar de alguma memória.
Chimon percebia que o amigo tentava se aproximar, mas quem o repelia agora era ele. Como ele poderia se manter estável ao seu lado? Era difícil sorrir e fingir que não havia mágoa pela distância que tinha sido imposta quando sua única vontade era pedir para que ele o abraçasse e dissesse que tudo ficaria bem. Entretanto, como ele poderia pedir por isso depois do que tinha acontecido entre eles? Como ele poderia pedir por isso depois que Tanapon passou a agir como se nunca o tivesse tocado e pedido para ouvi-lo gemer?
O vento entre as frestas das paredes uivou alto e ele gostaria que fosse Tanapon novamente ali, agarrado a ele, mas no final, a única companhia que nunca o abandonava era presença de White preso abaixo dos seus pés.
Nem bem o sol surgiu no horizonte, Chimon acordou, sentindo seu corpo pesado e cansado pelo sono entrecortado.
Nong Nao bateu com o focinho no rosto dele, como se estivesse incomodado com o seu silêncio e apatia. Chimon encostou a testa em seu pescoço e o animal o empurrou um pouco tentando animá-lo. Nong Nao parecia mais apresentável e bem cuidado do que ele e somente um riso de escárnio surgiu no rosto de Chimon ao se dar conta disso. A vida era tão insignificante.
As pessoas que não o conheciam pareciam enxergá-lo como uma presa fácil, quem o conhecia parecia vê-lo como uma criança. Algum dia as pessoas o veriam como ele realmente era? Ou ele precisaria sempre se esconder?
O senhor Ohm agia em negação a respeito do que os dois tinham feito e, às vezes, o olhava com pena e compaixão, como se o fardo do segredo que compartilhavam fosse pesado demais para o empregado. Isso irritava Chimon como há muito tempo não acontecia e ele revirou os olhos ao lembrar que quem titubeou foi o chefe, não ele.

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Fiksi PenggemarOhm Pawat é um fazendeiro rico, viúvo e pai solo. Nanon Korapat é herdeiro de um circo falido. Eu tinha prometido para mim mesma que só escreveria sobre Pat e Pran, mas nesse caso, eu precisava de um pouco das personalidades de OhmNanon. E, como eu...