Parte 5

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Quase todas as manhãs, Ohm corria pela fazenda e sua dedicação às atividades físicas cansava Nanon, que apagou seu cigarro e esperou  na janela pelo seu espetáculo diário e particular.

Mesmo depois de algumas semanas, ele não tinha conseguido regular o sono para a nova rotina de trabalho. Ele cochilava assim que entrava na casa após seu expediente, muitas vezes era acordado por Victoria Paulette, que inspecionava seu território recém invadido e depois saía sem nem se despedir. Seu sono a noite era sempre entrecortado, por isso só restava a ele esperar por Ohm e sua corrida matutina.

Durante esse tempo, a única coisa que havia mudado era a diminuição dos cigarros. Ele só fumava ao levantar e não havia se dado conta de como isto começou: talvez fosse por causa do ar da manhã, talvez fosse a desculpa para ficar na janela, talvez fosse a vontade de deixar a vista um pouco nublada, como se isso o escondesse dos olhares de Ohm, que nunca o cumprimentava nas primeiras voltas, embora Nanon notasse que ele o via.

Ele não sabia o porquê de se sentir bem assim, com essa rotina que eles haviam criado e não falavam a respeito.

Na verdade, eles não falavam a respeito de muitas coisas e Nanon vivia inquieto por causa disso. Ele não sabia sobre o que queria falar exatamente, mas certamente gostaria de conhecer ainda mais sobre Ohm, sobre sua vida e seus gostos.

Exceto na primeira manhã, em que tinham tomado café juntos, Nanon tinha preferido manter um certo afastamento, porque era muito fácil para ele ter atitudes e comentários que cruzavam a barreira entre o pessoal e o profissional com Ohm, principalmente porque isso o divertia. No começo, ele tinha chamado o chefe de ‘você’ mais vezes do que sua noção dizia ser prudente para se manter no emprego.

Ohm dizia que gostava de conversar sobre a agenda do dia de trabalho já no café da manhã, porém Nanon insistia para que ele fizesse sua refeição em paz e ia para a cozinha conversar com Godji e depois seguia para o escritório. Lá dentro, ele se esforçava para se manter focado nos comprovantes de pagamento, nos relatórios e nas contas que fazia.

Em geral, Nanon lidava bem com essa rotina, no entanto, em alguns momentos, ele se dispersava e se perdia admirando Ohm; seu perfil contra a luz da janela evidenciava seu maxilar marcado e seu nariz perfeito, além disso, vez ou outra, uma mecha de cabelo caía sobre sua testa e Nanon se imaginava ajeitando o cabelo dele.

Para ele, o pior era quando Ohm dobrava a manga da camisa para cima, até próximo do cotovelo, e seus braços fortes, com a musculatura bem delineada, prendiam completamente sua atenção, mais do que era aceitável para o ambiente de trabalho.

Várias vezes Nanon precisou se conter e para isso costumava recitar o nome de Bangkok com seus 169 caracteres ou repassava todas as províncias onde o circo tinha se apresentado. Ele sorriu ao pensar ainda não tinha se acostumado com a mudança do nome do seu próprio país, pois agora ele morava na Tailândia e não em Sião.

O seu grande problema era que Ohm exalava uma virilidade instigante e provocativa e Nanon se via obrigado a lembrar a todo momento que seu chefe não era esse tipo de homem, afinal ele tinha sido casado e tinha uma filha.

Nanon sabia que isso não era um impedimento para algumas ações que a sociedade condenava. Ele mesmo já tinha conhecido senhores respeitáveis que se entregavam aos desejos em becos e nas ruas escuras da capital; inclusive já havia flertado com alguns deles. No entanto, Ohm parecia diferente. O jeito como ele corou e o seu espanto quando Nanon sugeriu que ele queria seu corpo como forma de pagamento, mostravam que Ohm nunca havia recebido esse tipo de proposta e com certeza nunca tinha oferecido isso a ninguém. Não havia aquela fagulha no olhar de quem já tinha experimentado esse tipo de vida.

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