É coisa de pele, lance criminoso

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Cinco da manhã de sábado, toca o primeiro alarme do telefone. Barulho de sino e barulhos de gemidos sonolentos na minha cama se faziam presentes: ela estava ali. Ela estava ali e a minha cama nunca tinha feito tanto sentido quanto antes.



Cabelos soltos jogados na minha cara, mãos no meu corpo, peles se roçando em busca de uma coisa mais quente. Aquele pé de temperatura de necrose dela encostado na minha panturrilha, e sua mão batendo no despertador, desativando-o na cama.


— Acorda, preguiçoso. Vamos, vamos. — disse Giovanna, com a boca afogada nos meus ombros, me enchendo de beijo.


— Ou, que ideia da porra meter uma aula de redação pleno sábado. — resmunguei, voltando a minha posição inicial. – Quem foi a gênia que propôs isso?


Giovanna deu uma risada daquelas secas, e passou a se ajoelhar na cama, pra entender que o dia nasceu. Passava a massagear minhas costas, calada, passando a ponta dos dedos onde ela tinha arranhado e feito marca noite passada: sorri, prensado no travesseiro.


— Sabe o que é pior disso tudo? Eu vou ter que me atrasar e levar xinga da coordenadora de graça, bem com culpa dela. — falei, com a cara afundada no travesseiro, de bruços.


— Ai, como ocê é uma persona non grata, Nero... — falou, me dominando por trás — Quem foi que pediu pra dormir junto de mim foi você, homem. Aceite as consequências.


— Pedi, é claro. Minha sogra é boa, mas não é besta, me expulsou na primeira oportunidade que achou. — disse, me referindo ao fato que Dona Lílian, a santa que pariu minha mulher, me expulsou nove da noite da quarta de cinzas, assim que voltou da missa. Será que ela achou mesmo que a gente tinha namoro santo ou coisa do tipo? — Desde quinta sem um chamego desse pela manhã, é um castigo do pior escalão, nega.


Ela volta a gargalhar, dessa vez, por cima de mim. — Qual é, homem, passou um dia longe de mim e já tá assim? Macho nenhum nunca dormiu naquela casa desde que papai faleceu, que ela não deixa. Cê não ia ser o primeiro.


— Eu ia fazer a segurança das duas, ora. — me defendi, ainda ranzinza porque eram cinco da manhã de um sábado. —Tu vai ver, vai ver que eu ainda farei pernoite por lá quando ela tiver.


— Tá, tá bom, chorão. Vou adiantar minha vida – disse, deixando um beijo na minha nuca. —  Meia horinha na minha frente. Aguenta esse tempinho longe de mim, ou vai ficar largado chorando pelos cantos? — disse Giovanna, sentando por cima da minha bunda na cama e me puxando os cabelos por trás.


— Puxe mais dois centímetros dos cabelos da minha cabeça que eu te faço atrasar 2h pra chegar naquele colégio, djaba. — sorri pro lado, vendo que ela se pendia pro lado do meu rosto na cama, acabando por se jogar toda desajeitada do meu lado, linda e despenteada. Oh mulher bonita, bonita de verdade.


Tinha a pele bonita, as olheiras bonitas, os olhos miúdos que só a manhã consegue lhe entregar. A boca fina e larga, a risada rouca, gostosa, bonita. A língua que soltava um veneno mais letal que as outras línguas, um olhar de raio laser mais poderoso que zilhões e zilhões de armas existentes no mundo.


Era toda bonita, toda boa. Era uma bomba relógio de coisas boas.


Eu descia minhas mãos no seu rosto, e acariciava sua bochecha com os dedos, guardando aquela figura na minha mente.


Ai, para de me encarar desse jeito, Zé. — disse, com a mão espalhada no meio das minhas costas.


— Se não quer ser olhada assim, então suma da minha vista. — provoquei, recebendo um empurrão da cama e a cena dela saindo pelada dos lençóis. Cena complicada, viu.


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