Bendito sois vois entre as mulheres

627 57 58
                                    




— Hermes, porque que essa casa tá com esse preço? — desconfiado, questionei o amigo corretor que conheci em uma época de cachaça na vida.


— Nó, todo baiano é assim? Se for, o negócio tá ruim hein? — o engravatado bateu nas minhas costas, me entregando a chave do portão de pedra e ferro, bem tradicional. — É porque o interesse de todo mundo agora é casa de condomínio fechado, construção moderna. Era uma casa de uma família grande, que acabou se mudando pra uma fazenda em Ouro Preto. Pelo estado da casa, a reforma vai ser pouca, pouquinha. Eu daria um gás na elétrica, hidráulica tá novinha em folha... vai dar bom. Sua mulher já sabe?


— Não, quero trazer ela hoje. Se ela gostar, eu pego. Bora, me mostra a casa, nego. — falei, ansioso.


Ele me fez abrir o portão e a primeira coisa que eu notei na casa era o espaço enorme que tinha na frente, pronto pra uma casa lotada. Se a meta era essa, uma família grande... essa casa tinha caído como uma luva nas nossas mãos. Era uma casa de dois andares, um andar só com o quarto do casal e uma varanda de fora a fora, 3 quartos que seriam pro meu pivete, ou pra minha princesa... um quarto pra dona Lílian, e outro pra Alícia, que já estava certa de vir fazer faculdade aqui em Minas, sob meus olhos e responsabilidades.


Só depois que eu fiz essa conta, parei pra pensar que eu vou dividir casa com mais 4 mulheres, todas com suas manias, seus jeitos, seus gestos... as que já vinham comigo, como Alícia, as que geram, criam e cuidam como dona Lílian, e a que me escolhe pra ser dela: Giovanna. E claro, meu palpite que a minha doninha será menina não mente: é o tempo que responde o que o destino tem como certo. E há quem diga que não é o que se é certo.


A casa tinha cara de casa, já estava quase vazia, ressalvado por alguns móveis de madeira planejados, aquela madeira da boa, sem ser aquele MDF seboso que estraga com dois dias; cores claras por todo imóvel, sala ampla, cozinha acoplada, essas coisas todas dignas de uma família grande.


O grande estalo da vida veio junto com a notícia, e painho me deu a maior força que um pai pode dar a um filho que tá começando a vida e tá começando a ser alguém: o incentivo de querer fazer as coisas acontecerem como o fluxo manda. Então quando eu disse que queria criar um lar com Giovanna pra ele, a primeira notícia que ele me disse era que eu não me preocupasse com a entrada, que seria um presente de casamento. Desde aquela notícia que pô, me deixou tonto e doido da cabeça visto que painho nunca tinha me dado nada além do estudo, eu corri feito doido atrás de uma casa que coubesse nossa família inteira: o pacote inteiro, é isso mesmo.


Seria sem lógica a gente largar dona Lílian no marasmo depois de tanto tempo de convivência, afinal de contas — e Giovanna jamais iria me propor isso. Sem contar que a minha cruz mirim vem pra essa casa lá pra janeiro de toda forma, então... que tenhamos uma casa grande o suficiente pra nos proporcionar o conforto que merecemos.


O luxo daquele lugar era o espaço, e considerando que vivemos numa capital, é um baita de um luxo viver numa casa daquela, com direito a quintal e tudo mais. A imobiliária era baiana, de uns conhecidos de papai, então a negociação foi ligeira, ligeira. Meu plano pra hoje era esse: ir cedo até a casa conferir se tá tudo bem mesmo, pegar Giovanna no colégio pra irmos na ultrassom, e da ultrassom... trazia ela pra esse lugar que ia se tornando nosso na minha cabeça.


Saí dali que nem bala me pegava: Corri pro Galileu, atormentado naquela terça-feira, parecia uma coisa. Estacionei o carro no mesmo lugar de sempre, o canto lateral do estacionamento, onde a sombra das árvores era mais generosa. Mesmo sem estar trabalhando hoje, o colégio parecia me chamar como um imã. Dois meses desde aquele pedido de namoro que ficou famoso entre os alunos e professores. Eu e Giovanna, juntos na frente da turma, aquele "aceito" que ecoou como um gol em final de jogo do Bahia. Era inevitável não lembrar disso toda vez que eu passava pelos portões.


ImponderávelOnde histórias criam vida. Descubra agora