nem tudo são flores

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(capitão nascimento)
Maria me faz perder a cabeça. Só de pensar nessa pirralha (e esse era o grande problema, porque ela era inocente) na mira daquela gente, fico louco. Perder essa filha da puta seria como perder tudo.
Era por volta das 14h quando recebemos a porra da intimação no batalhão. Cada palavra que eu lia daquele papel me fazia fechar a mão mais forte, fazendo minhas unhas machucarem a palma dela. Inferno! Meu sangue ferveu na mesma hora. Era uma mistura de estresse, nervoso, medo. Larguei o plantão e fiquei horas na porta do fórum até a Senhora Promotora de Justiça sair da audiência.
    Ao mesmo tempo que ela conseguia ser um diabo de mulher, às vezes também agia como uma garota. E aquilo me deixava louco. Ser inocente demais no mundo da justiça e da política não é nada bom.
     Acabei descontando meu ódio na hora de conversar. Percebi que Maria ficou sem argumentos.

-Vocês já receberam a intimação?

-Já. Hoje! Caralho, você vai me deixar maluco!

-Por que, capitão?

   Odeio esse tipo de pergunta. Respirei fundo antes de responder.

-Porque eu fico louco só de imaginar você na mira dessa gente. Perco a cabeça, doutora.

-Já disse que eu sei me cuidar sozinha.

   Pra minha surpresa, a pirralha tirou uma pistola da cintura. Não sabia que ela sabia atirar, muito menos que ela andava armada.

-Quer dizer que a pirralha promotora anda armada? Dessa eu não sabia. Você sabe usar isso, criança?

-É óbvio. Fica tranquilo, capitão. Não vai acontecer nada com a sua criança.

   Gostava do jeito dela de não ter medo de nada: destemida, inteligente... me deixava bobo. Tinha a sensação que eu tinha mais medo que acontecesse algo do que ela mesma tinha. E também sentia que nós nos conhecíamos há anos. Desde sempre.

   Fomos pra sua casa, e pela primeira vez, agimos como dois adultos normais. Fazendo perguntas e nos conhecendo como pessoas normais. Nós já havíamos transado, brigado, nos odiado... mas nunca parado pra nos conhecermos. Eu não sabia quem ela era: não sabia sua idade, sua história, seus sonhos. Nem ela sabia quem eu era sem farda. Não sabia quem era Roberto Nascimento.

   Foi uma conversa muito gostosa de se ter. Falamos dos nossos pais, dos nossos sonhos, da nossa vida. Ali, sentado no sofá da promotora , percebi que eu estava apaixonado por ela. Que mulher! Linda, inteligente, destemida. E ainda é uma gostosa do caralho. Uma pena que a conversa tenha sido interrompida pelo arrombado do Coronel. Operação de última hora.
Prometi a Maria que ia voltar.

   Subi o morro com a cabeça explodindo, porque sabia de um fato: eu estava apaixonado, e não poderia viver as coisas do jeito certo com a doutora. Eu sou alvo de muito traficante filha da puta por aí, e, se ela deixasse de ser um segredo, com toda certeza se tornaria alvo também. Essa é a parte ruim de matar vagabundo. Maria não merecia ser segredo.

   Não conseguia me concentrar no trabalho de jeito nenhum. Tiro comendo e a minha cabeça estava em outro lugar. Minhas mãos suavam frio, e eu estava mais nervoso que o normal. Desejava cada vez mais a hora de encontrar meu sucessor e acabar com isso.

-Está tudo bem, capitão? — Um dos policiais perguntou, enquanto trocávamos uma porrada de tiros numa viela.

   Só assenti com a cabeça.

    Eu sabia que não podia alimentar algo que não ia dar em nada, mas era impossível ficar longe daquela criança

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    Eu sabia que não podia alimentar algo que não ia dar em nada, mas era impossível ficar longe daquela criança. Ela foi o meu maior acerto ao longo desses anos: deixá-la ir seria um desperdício.

     A operação me deixou um poço de estresse. Eliminamos alguns, mas ainda faltavam muitos: e isso significa que vamos precisar voltar. Descemos, deixei a viatura no batalhão, peguei meu carro e voltei pra casa da doutora. A porta estava sem passar a chave.

-Fiquei preocupada com você. — Ela disse, sentada na mesa, resolvendo alguns processos.

-Por quê? Tem medo de eu morrer e ficar sem mim?

-Babaca. — Ela respondeu, enquanto digitava alguma coisa no computador.

-Já jantou? Vou pedir japonês.

-Ainda não. Não consegui sair do computador ainda. Muito trabalho.

-Vai sair agora, então. — Disse, fechando a tela do computador. Dei um selinho em sua boca.

-Se não for pedir muito, doutora, será que eu posso tomar um banho?

-A casa é sua, capitão. Tem toalha embaixo da pia.

   Sentir a água quente caindo no meu corpo era quase tudo que eu precisava depois da operação: pra ficar perfeito, faltava Maria nos meus braços: tudo que eu pedi aos céus. Saí do banheiro com a toalha na cintura, fui até a sala pegar minha mochila. Os olhos de Maria arregalaram ao me ver daquele jeito.

-O que foi, doutora? Perdeu alguma coisa?

-Quer mesmo que eu fale? — Ela disse, sorrindo de forma maliciosa.

-Com certeza. — Falei, me aproximando do sofá, onde ela estava sentada, levando meu rosto pra perto do seu. —Fala pra mim, o que você quer? Hm?

-Você. Eu quero você.

Justiça e Amor  | Capitão Nascimento Onde histórias criam vida. Descubra agora