um susto

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(Maria Carolina's view)

   Chegou o tão esperado dia da audiência. Levanto cedo, Beto continua dormindo, e eu me sinto aliviada em saber que pelo menos ele conseguiu pegar no sono. Ele estava irritado, entediado, e descontava tudo em mim como se a culpa fosse minha. E não era. Eu já estou acostumada com essa birra de adolescente, então, não me importo muito. Tomo um banho frio pra ajudar a acordar, visto minhas roupas e lembro de deixar o strogonoff de ontem no fogão, pro meu novo filho só esquentar no microondas depois. Entro no quarto novamente pra terminar de arrumar o cabelo, e o capitão acaba acordando. Pelo menos, acordou de bom humor.

   Chego no fórum por volta das nove e meia. Entro na sala do Ministério Público, e Joana já estava me esperando. Pedro também, e estava com um olho roxo.

-Bom dia, Pedro. O que aconteceu?

-Nada demais. — Ele responde, sem responder o meu "bom dia", sem olhar pra mim, sem me dar confiança. Isso tinha dedo do capitão Nascimento.

 Isso tinha dedo do capitão Nascimento

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    Caralho.
    Tento não me estressar, porque a audiência seria longa e eu não podia errar na argumentação. Minha cabeça estava à milhão: ao mesmo tempo que estava aliviada do dia finalmente ter chegado, eu me cansava só de pensar nas próximas horas e nas próximas audiências desse caso. Inferno.

-Maria. — Joana me chama, chegando perto de mim e falando baixo.  -Ele te contou o que foi? Não quis contar nem pra mim, nem pra mamãe.

-Não contou, mas eu já descobri: Nascimento. Não briga comigo, Joana, eu não tive culpa. Eu nem sabia de nada disso. Descobri agora.

-Esse cara é maluco, Maria. Pelo amor de Deus. — Ela responde, com cara de decepção, e se afasta novamente.

    Finalmente pro tribunal. Meu coração acelerava como se fosse a minha primeira audiência; sinto um frio na barriga e meu corpo inteiro treme, como se eu ainda fosse uma advogada convencional no início da carreira.

-Bom dia a todos. Meu nome é Mariana dos Santos, serei a juíza responsável pelo caso. Gostaria de dar boas vindas, especialmente aos desembargadores e ao Ministério Público aqui presente. Doutora Maria Carolina Venturini, promotora de justiça, e Pedro Dias, defensor público. Iniciando a sessão; estamos aqui para julgar o caso de uma denúncia anônima contra o Batalhão de Operações Policiais Especiais do Rio de Janeiro, sendo esse acusado de violar os direitos humanos.

   Eu não parava de pensar. Estava preocupada com Beto sozinho em casa, com essa merda dessa audiência, com o resto das demandas do meu dia. Finalmente, chega minha hora de falar.

-Meritíssima, venho por meio daqui afirmar que é de verdadeira acusação da sociedade a violação dos direitos humanos por parte do BOPE, Batalhão de Operações Policiais Especiais, visto que os mesmos utilizam métodos de tortura e morte nas favelas do Rio de Janeiro. Como fiscal da lei, busquei as devidas testemunhas, entre elas, a senhora Maria das Dores, que teve seu filho brutalmente assassinado por um dos policiais do batalhão.

   Eu não consigo citar o nome de Beto, mesmo sabendo que foi ele quem matou o garoto. A mãe do menino entra, e dá o seu triste testemunho, enquanto eu luto pra conter a minha angústia e as minhas lágrimas, pois sabia que o coitado morreu por minha causa.

-Mataram ele, mataram o meu filho... ele não era envolvido, não fazia nada... e foi levado pelo BOPE. Eles não querem saber quem é, primeiro atiram, pra depois saber. Eu perdi meu único filho pra essa guerra, e espero que a justiça seja feita.

Após isso, a juíza faz algumas perguntas, mas eu estava desnorteada demais pra conseguir prestar atenção. Peço um copo de água ao segurança da sala ao sentir minha pressão baixar.

-Eu, como defensor público, defendendo não somente a senhora Maria das Dores, mas sim todas as vítimas do BOPE, venho por esse meio perguntar à Excelentíssima juíza, se a vossa excelência acha correto, acha de bom tom o que esse batalhão vem fazendo com a sociedade residente nas favelas do Rio de Janeiro. Pessoas de bem, trabalhadoras, pessoas que não têm nada a ver com o poder paralelo, sendo mortas e torturadas todos os dias. Na minha visão, Excelência, isso não parece combate ao crime. É combate à vida.

Por mais duas horas, entram mais testemunhas, Pedro fala mais algumas vezes, e eu também. Por fim, a juíza dá como encerrada a sessão, mas ela continua em aberto. Respiro aliviada, mas saber que teriam outras audiências como essa me deixam, ao mesmo tempo, em completo pânico.

-Como foi? — Joana pergunta, quando eu e Pedro voltamos pra sala do MP.

-Tudo bem, mas terão outras. Já era de se esperar. Tô tão cansada, não tô passando muito bem. Preciso ir pra casa...

-Quer que eu vá com você? Espera um pouco, tenta se acalmar.

-Não, não precisa. Pega água pra mim? — Peço, sentando na minha cadeira.

    Quando Joana traz a água, tomo um calmante pra tentar melhorar a situação

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Quando Joana traz a água, tomo um calmante pra tentar melhorar a situação. Conversamos um pouco e uns quinze minutos depois, ela me deixa ir pra casa. Pego o carro, ligo o rádio e coloco minha playlist pra tocar enquanto faço o caminho de volta. Pra sair do fórum, preciso entrar em algumas ruazinhas. Foi quando em, passando por alguma delas, vejo quatro caras, em duas motos vindo na direção contrária da minha: uma moto de cada lado, em velocidade alta, com duas armas apontadas pra mim. Não tive muito tempo pra pensar, a não ser tirar a minha pistola da cintura e tentar atirar: tarde demais. Eles atiram antes, e minha única reação é me abaixar no banco e gritar, evitando que as balas pegassem em mim. Puta que pariu. Achei que ali mesmo seria o meu fim. Eu não conseguia nem ter noção de quantos tiros tinham sido. Quando eles finalmente acabam e eu consigo me levantar, tremendo e chorando de nervoso, vejo os quatro mortos no chão, e Matias vindo até o carro.

-Você está bem? Alguma bala pegou em você? Levanta, vem. Tá tudo bem, Maria. Calma.

-N-não. Eu tô bem. Caralho, Matias... — Eu digo, me desabando em chorar. -Eu pensei que isso era tudo maluquice da cabeça do capitão. Puta que pariu.

-Tá tudo bem. Vem, vou te levar pra casa. Deixa que eu cuido do resto.

NOTAS
gente!! eu espero de verdade que estejam gostando da história. Queria deixar claro aqui que eu não sou advogada, não sei ao certo como funcionam as coisas mas dei o meu máximo pesquisando e estudando pra que saísse pelo menos um pouco parecido com a realidade. Caso não esteja, quero também deixar claro que isso é uma ficção. Deixem a imaginação levar vocês e se desprendam do mundo real. Obrigada ❤️

Justiça e Amor  | Capitão Nascimento Onde histórias criam vida. Descubra agora