Um

214 25 5
                                    

Dias de hoje

— Vovó, que merda você está fazendo? — Enquanto pegava as duas malas gigantescas, a enorme bolsa Coach rosa e o que mais parecia um animal morto que por vezes andava pendurado na cabeça da avó, Alfonso praguejava mais uma vez.

— Olhe a língua, Poncho! — Vovó Nora ergueu os ombros e o empurrou, abrindo caminho até o guichê de passagens.

Ah, não. Não mesmo. Pelo amor de Deus, não! Alfonso olhou ao redor à procura de Angelique, sua última conquista amorosa, que o acompanhara na festa de noivado de seu irmão, Andres.

— Sim, preciso de uma passagem só de ida — anunciou vovó em voz alta, dirigindo-se à atendente da companhia aérea Alaska Airlines.

Alfonso assistia à cena com um misto de horror e pânico enquanto a avó comprava um assento no mesmo voo dele. Tomara que o cartão seja recusado. Tomara. Tomara.

— Aqui está — disse a atendente maligna ao entregar o cartão de embarque e sorrir. Alfonso a encarou, irritado. Depois encarou a avó.

— Não. — Ele balançou a cabeça quando vovó Nora se aproximou, risonha. — Você não vai — sustentou Alfonso. E cruzou os braços, firme.

— Vou, sim. — Vovó sacudiu o cartão de embarque bem na cara dele e sorriu. — Agora pegue as minhas malas.

— Mas...

— Ponchooo? — Angelique foi até ele, quase desfilando. Vestindo uma saia do tamanho que não deveria ser permitido em lugares públicos, especialmente em aeroportos, ela ajeitou o penteado e parou ao seu lado. O cabelo tingido de loiro se mantinha no lugar com o uso de ao menos duas latas de spray fixador e, a julgar por sua incapacidade de andar em linha reta, ela ainda trazia a embriaguez da noite anterior.

Vovó abriu um sorriso.

— Que maravilha! Parece que sua vagabunda chegou.

Alfonso grunhiu e cobriu o rosto com as mãos. Não tinha como sair dessa. Sua avó acabaria fazendo com que ele levasse um tiro.

Terra da vingança feminina, aqui vou eu.

— O que você disse? — Angelique colocou as mãos na cintura e balançou a cabeça para vovó de um jeito estranho, quase caindo dos saltos. Ah, aquilo não era bom! Não era nada bom.

Vovó deu um tapinha simpático no braço da jovem.

— Queridinha, sou eu que preciso de aparelho auditivo, não você. Acabei de chamá-la de vagabunda. Quer que eu soletre? — A velha senhora cutucou Alfonso — De onde saiu essa? Da feira de empregos para nível médio? — Então, vovó começou a soletrar a plenos pulmões: — V-A-G-A-B-U-N-D-A.

Ela estava mesmo soletrando "vagabunda" em um aeroporto internacional? E ainda por cima para a namorada dele? Ou melhor, caso? O que ela era, afinal?

Droga, ele nem sabia o sobrenome dela! O que devia ser um mau sinal.

— Pois saiba que...

— Alfonso, estou com fome. Me leve para comer. — Vovó enlaçou o braço no dele e começou a puxá-lo em direção aos seguranças com mais força do que deveria ter uma mulher de 86 anos.

— Mas e eu? — Atrás dos dois, Angelique fez beicinho. Vovó parou de andar e se virou.

— Queridinha, tenho certeza de que você é capaz de encontrar outra excelente distração até a hora do voo. Este aqui já tem dona.

A loira bufou.

— Não achei que seu gosto fosse tão duvidoso — disse para Alfonso .

Ele abriu a boca para explicar "Essa é a minha avó". Porém, antes que tivesse tempo de falar, a avó lhe deu um grande beijo na bochecha e beliscou seu traseiro.

— Ah, queridinha! Você nem imagina do que esse aqui gosta! — E deu uma piscadela.

Deus do céu! Vovó tinha acabado de piscar e sugerir que Alfonso era seu... ele nem conseguia concluir o pensamento. Horrorizado, viu os olhos de Angelique se arregalarem. Abriu a boca para responder, mas a avó lhe deu um tapa na bunda que o empurrou na direção contrária.

Seu carma estava finalmente acertando as contas. E na forma de uma mulher de 86 anos com batom nos dentes. Mas que merda!

————————

Quem aí já está morrendo de amores pela vovó? ❤️

Simple PastOnde histórias criam vida. Descubra agora