Trinta e sete

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Era isso.

O carma tinha vindo cobrar seu preço e deixara um coração de presente para Alfonso. Um coração tão mole e irritante que ele estava a ponto de enlouquecer.

Ela sorriu.

Ele ficou todo bobo, bobo de verdade, e seu coração pulou no peito. Quando Anahí se ofereceu para ir com ele à cidade, Alfonso ficou animado. Sim. Animado por passar a tarde com ela no cartório. Mas o que estava acontecendo?

Dois meses antes, ele teria ficado com vontade de morrer.

Mas, no momento, estava ansioso por ficar perto de Anahí, uma garota — ou melhor, uma mulher. Seu encontro mais longo em anos seria no cartório. Tinha de ser um mau sinal.

Vovó se esquecera de pegar a certidão de habilitação para o casamento depois que Maite e Andres haviam passado no cartório para provar que eram mesmo quem diziam ser. De qualquer forma, tudo o que ele precisava fazer, como padrinho, era pegar a habilitação e depois levar Anahí para almoçar. Não parecia difícil. Tudo bem, era ridículo que ele, entre todos os outros, tivesse de fazer isso, mas vovó tinha dado um chilique tão grande no café da manhã que ele teria aceitado fazer qualquer coisa, até ir para a África lutar pelos direitos dos leões, só para que ela parasse de falar. 

Andres e Maite estavam ocupados resolvendo problemas de última hora com a banda e todos os outros estavam ajudando a arrumar o local, então só sobraram Anahí e ele. Ela estava louca para sair da casa, pois vovó a seguia por todos os cantos, dando ordens. Jamie pedira para ir com eles.

A resposta de Alfonso? Sem chance. 

E vovó, bendita fosse, alegou que precisava dele bem na hora, o que com certeza era uma desculpa. Não que ele ligasse. A situação funcionara a seu favor. O cartório não era muito longe da casa. Tinha acabado de abrir quando

Alfonso e Anahí chegaram e foram até o balcão.

— Posso ajudar? — perguntou a atendente, uma velha senhora. Os óculos quadrados estavam apoiados na ponta do nariz, e ela usava batom vermelho forte e uma blusa azul-royal. Parecia um clone de vovó.

— Sim — respondeu Alfonso, tranquilo. — Precisamos pegar a habilitação para o casamento dos Herrera.

— Ah. — A senhora pareceu desapontada. — Um momento. Só preciso... — Tremendo, ela murmurou alguma coisa enquanto procurava em uma pasta na mesa.

Anahí mordiscou o lábio inferior, batucando no balcão com as unhas enquanto a mulher procurava. Alfonso, agindo como o lunático em que se transformara, ficou só observando ela. O cabelo estava preso em um rabo de cavalo alto, dando uma visão perfeita das maçãs do rosto salientes e do pescoço delicado. Ele queria esticar a mão e tocá-la, sentir a pele suave sob os dedos.

— Então, tem um problema — começou a senhora, e pigarreou. — Não estou com ela.

— Como? — Alfonso desviou a atenção de Anahí e olhou para a mulher. — Não está com a licença? Mas eles vão se casar no fim de semana!

— Certo... — A mulher sorriu, nervosa. Os dois dentes da frente estavam manchados de batom. — Tenho uma ideia, mas eu poderia ser demitida...

— Sou todo ouvidos. — Alfonso tentou se manter calmo — Porque eles precisam desse papel domingo à noite.

— Podemos acelerar o processo. Posso forjar a data, mas terei de deixar os nomes em branco no documento.

— Por quê? — perguntou Anahí. — Não pode simplesmente digitar os nomes também, e forjar tudo?

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