15.2 - Não fale sobre o problema e ele deixará de existir

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Alison

Meu primeiro pensamento ao despertar foi o de continuar dormindo.
A sensação era de que eu não havia tido quinze minutos de descanso e parecia que um trator havia passado por cima do meu corpo, mas sabia que era porque só tive forças para me jogar de qualquer jeito no sofá ontem, depois que encerrei a ligação com Blake na madrugada.
A luz solar que vinha da janela para irritar meus olhos, no entanto, deixava claro que haviam se passado bem mais do apenas minutos.
Puxei uma almofada para cobrir o rosto, mas as risadas baixas vindas de algum lugar não foram abafadas.
— Fico feliz em ouvir isso, pai. De verdade — Evan murmurou e eu levantei a almofada, torcendo meu pescoço para o encontrá-lo sentado ao balcão da cozinha, de perfil para mim. — Então, hoje mesmo não vai dar, tenho alguns serviços pendentes na oficina. Mas não estou aceitando mais nenhum cliente porque é certeza que eu vou assim que terminar tudo. No máximo, semana que vem. — Alguns segundos de silêncio enquanto ele ouvia a resposta do outro lado da linha. — Ah, eu não sei... Tenho que perguntar pra ela... — disse, hesitante. — Sim, contei e ela ficou muito triste... Eu sei, pai, mas ela se importa. O senhor preferia que ela não ficasse sabendo?... Ah, claro. Ela realmente ofereceu, mas o senhor mesmo vai ter que conversar mais tarde com ela sobre isso. Eu não vou poder convencê-la de nada... Porque eu também acho necessário, pai!... Ok, então eu não sei de nada. Como eu disse: converse com ela depois — estipulou, parecendo de saco cheio e eu ia abrir a boca para me incluir na conversa — porque eu sabia que estavam falando de mim, só não sabia sobre o que, exatamente —, mas o som de leves e suaves batidas na porta me cortaram.
— Pode deixar, eu atendo — disse, quando vi Evan fazer menção de ir até a porta. Pigarreei, me colocando sentada com certa dificuldade. Ele pareceu um pouco surpreso, provavelmente só percebendo agora que eu estava acordada.
Plantei um beijo rápido em seu rosto de bom dia e passei na cozinha para jogar uma água em minha cara de sono não demorando mais que cinco segundos, mas quando alcancei as portas de entrada para destrancá-las, Kat já estava batendo em uma delas novamente. E eu soube que era ela apenas por pressentimento.
— Bom dia, impaciência — cumprimentei minha amiga e ela torceu seu rosto bonito em uma careta de estranhamento assim que colocou os olhos em mim, destoando de todo o seu look sério por um momento.
— Boa tarde, já é meio dia... Ai, meu Deus, você está acabada!
— Eu acabei de acordar.
— Da morte?! Seu rosto está inchado, o que aconteceu com você? Parece que chorou a noite toda! — Seus olhos pularam para o espaço atrás de mim e logo sua expressão se alterou para a irritação. — Ah, já entendi.
Me virei rapidamente, vendo que Evan havia se limitado a dar as costas para nós duas, ainda no telefone.
— Não, não é ele...
— Claro que não. Nunca é — cruzou os braços, ironizando.
— Não, Kat, juro! Foi outra coisa. — Dei mais uma olhada fugaz para dentro, antes de empurrá-la um pouco para trás e nos fechar do lado de fora.
— Sério isso?! A gente tem que sair para ele ter privacidade dentro da sua casa?
Tomei uma respiração funda e já exausta, olhando nos olhos da minha melhor amiga. Era melhor só explicar tudo de uma vez...
O que acabou não demorando nem cinco minutos para ser feito. A postura de Kat mudou com facilidade de irritada e teimosa para empática e infeliz, e ela imediatamente se ofereceu para ajudar em qualquer coisa que pudesse, inclusive com dinheiro, como eu mesma havia feito ontem à tarde.
Oh — algo estalou em meu cérebro —, era sobre dinheiro que Evan e seu pai estavam conversando...
— Mas Evan está parecendo um pouco mais animado hoje — contei, lembrando de sua expressão divertida que presenciei quando acordei. — Então, não sei por quanto tempo eles estavam conversando, mas acredito que tio Gerry vai conseguir vencer de novo. Evan não estaria conseguindo fingir sorriso nenhum se tivesse recebido mais más notícias.
— Ah... que bom, então. De qualquer forma, vá me atualizando nisso, amiga. Eu sei o quanto você gosta do pai dele também. — Assenti, forçando um sorrisinho agradecido. — Bom, eu vim aqui te chamar para almoçar comigo, já que pensei que você tinha decidido não descer para loja hoje, mas... é melhor você ficar com ele, não é?
— Se não tiver problema... Depois eu compenso as horas de trabalho perdidas, tá?
Ela me olhou entediada.
— Alison, você sabe que é desnecessário.
— E você sabe que eu não penso assim.
— Não deixa de ser desnecessário. — Os olhos de Kat avaliaram a mim e as portas fechadas por um instante, antes de iniciar: — Mas, então... com tudo isso acontecendo, acho que vocês não conversaram sobre... — respirou fundo, rolando os olhos levemente — aquelas suas desculpas, não é?
— Não, não conversamos... — Esfreguei meu rosto úmido, sentindo um início de uma dor de cabeça. — Não tenho mais certeza se é relevante.
Minha amiga franziu as sobrancelhas bem feitas.
— Como assim?
Passei as duas mãos nos meus cabelos desgrenhados, puxando-os para baixo e a encarando fixamente. Como se procurasse em seu rosto confuso soluções alternativas para minhas próprias conclusões.
Para que nada tivesse que, realmente... "concluir".
Sua expressão se suavizou quando me viu suspirar.
— Quer saber? Acho que vou para aquele almoço com você. Ainda vou confirmar, mas acho que Evan vai para o trabalho depois que desligar com o pai dele, então me dê só uns dez minutinhos e daqui a pouco eu desço.
Kat assentiu, me oferecendo um pequeno e doce sorriso.
— Vou estar no meu escritório.
Trocamos versões de um "até logo" e esperei até que desaparecesse escadas abaixo no final do corredor, enquanto tentava fazer com que o sufoco interno que sentia afrouxasse um pouco.
Me distrair por um tempo com minha melhor amiga, esta era a solução.
Surtar, porque sabia que só não queria ficar muito tempo sozinha com meu namorado? Não.
Antes de poder fazer isso, eu teria que me acostumar a corrigir de volta para "melhor amigo".

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