11.1 - Super melhor amiga

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Alison

Já era o meio da tarde de segunda quando alguém desferiu três calmas batidas nas portas do meu loft.
Corri para destrancá-las em um golpe de ansiedade.
...que logo foi substituído por desânimo, quando os familiares olhos verdes se arregalaram de susto a minha frente.
— Ah... oi, Kat.
Seu rosto torceu em falso insulto.
— Boa tarde para você também, amiga linda! Também estou muito feliz em ter me esforçado pra cacete, só para poder reservar o restante do dia para cuidar das suas unhas, já que ontem não tivemos tempo para isso! — Abri espaço para ela passar e, enquanto fechava a porta de volta, esfreguei minhas pálpebras cansadas com a mão livre.
— Boa tarde. Desculpa, estou feliz que realmente conseguiu adiantar tudo de manhã, eu só...
pensei que fosse o Evan agora.
— Oh... ele está vindo para cá? — questionou, já descontente.
— Não, eu... não sei — confessei, deixando meus ombros caírem. — Eu esperava que estivesse.
Mas, provavelmente, não.
Kat começou a empilhar suas conhecidas bolsinhas e necessaires de beleza na mesa de centro da sala com um olhar atento em mim. Somente voltei a me encolher onde estava no sofá, sem me preocupar em disfarçar nada. Não tinha energia para isso e não adiantaria, este meu característico eu derrotado não era novidade para Kat, ela o reconheceria de imediato.
Sim, Evan e eu discutimos...
Não, ele não estava atendendo minhas ligações ou respondendo minhas mensagens.
Sim, eu me sentia pior a cada segundo em que isso se estendia!
Provável que ela já pudesse ler estes fatos e mais alguns outros sem que eu precisasse dizer uma só palavra.
Mas, a real razão para não ter agarrado minha amiga pelos ombros para encharcá-los com minhas lágrimas assim que apareceu na minha frente? Não era nada dessa chatice toda que mais apertava meu âmago com incômodo agora. Eu estava com vergonha. E a falta de energia também estava atrapalhando a busca por um diálogo que não finalizasse com um merecido "eu te avisei" da parte dela.
Então acho que, por hora, eu não estava dizendo nada.
Kat se ajoelhou a minha frente nivelando seu rosto esbelto com o meu, que mal podia fitá-la de volta. Mas continuou a me estudar com calma e seriedade por alguns longos segundos e, por incrível que pareça, me senti agradecida por estar acabada, descabelada e de cara inchada por ter passado tanto tempo embaixo do chuveiro fingindo que a água que escorria pelas minhas bochechas eram do banho e não da angústia, porque de todas as broncas que eu poderia ter levado...
— Lembrei de trazer todas as cores hoje — foi o que ela escolheu me dizer primeiro.
Com uma troca de pequenos sorrisos — o meu triste e o dela, complacente —, gastamos os próximos dez minutos puramente concentradas em revirar sua bolsa de esmaltes e nada mais.
Dez cores vibrantes e variadas para as unhas das minhas mãos foram escolhidas, e apenas uma, em tom pastel, para as mãos e pés dela.
Sua paciência durou até o momento em que cuidava de minha sétima unha ainda desprovida de cor.
— Ok, você precisa me contar o que aconteceu — declarou de uma vez, se livrando das palavras numa expiração. — Eu tenho coisas a te contar também, mas elas dependem totalmente do que está te incomodando, então eu preciso que você fale!
Franzi a testa, sem entender.
— Como assim, "dependem"? O que aconteceu?
— Duas coisas. — Levantou dois dedos no ar, os remanescentes segurando com firmeza três frascos de esmaltes com uma só mão. — Uma é uma coisa que eu decidi e a outra é mais como uma descoberta, mas se algo nisso tudo te afetar, eu estarei deixando de lado, então, fale primeiro. Se estiver com medo da minha reação, pare! Você sabe que pode me contar tudo e, além disso — respirou fundo, se abrindo numa expressão amigável —, hoje eu estou de muito bom humor.
Suspirei, fechando os olhos por um segundo.
— Não é medo da sua reação. — Sustentei seu olhar, decidindo apenas acabar com isso. — É sobre o Noah. Aparentemente ele... conversou com o Evan.
E, fácil assim, toda aquela aura positiva se despedaçou bem diante dos meus olhos. O "eu te avisei" está vindo, tenho certeza...
— Sobre o que, exatamente, eles conversaram? — minha amiga perguntou, surpreendentemente neutra.
— Eu não sei. Eu queria perguntar pra ele. Ou pro Evan. Mas eu não tenho ideia do quanto ele sabe. Só sei que está me ignorando desde ontem de manhã e eu não posso procurá-lo pra tentar saber e resolver, porque eu... — estou com medo do amor da minha vida me chutar de vez!
Meus olhos lacrimejaram com o pensamento que, por mais que não passasse de uma mera possibilidade, havia corrido pela minha cabeça desocupada vezes demais desde ontem para que eu continuasse fingindo que não o via. Era a fadiga cuidando de piorar ainda mais as coisas.
— Ele não vai terminar com você por causa disso, Ali — determinou com tamanha convicção que eu desejei apenas poder acreditar.
— Ele literalmente disse que o problema estava em mim, Kat — retorqui em meio as poucas, porém pesadas, lágrimas que desceram. — Noah disse isso pra ele e ele disse que deveria ter escutado. E agora ele não fala mais comigo, o que isso deveria significar? Quero dizer... ele só não quer mais saber de mim e é isso! Fim! — Escondi meu rosto nos braços, apoiados nos joelhos, a vergonha me perfurando mais fundo em cada soluço que escapava.
Senti a presença de Kat quando ela deixou o bean bag em que estava sentada, para vir para o sofá, me envolvendo de lado em seus braços graciosos.
— Amiga... — começou a sussurrar, com amabilidade — vou te dizer uma coisa agora que você nunca mais ouvir de mim, então, se prepare... — avisou, suspirando. — Evan não é um completo idiota.
Levantei a cabeça subitamente para encará-la, me perguntando se minha audição estava funcionando bem. Ela apenas assentiu em confirmação.
— Eu não gosto de vocês dois juntos, você sabe bem disso, mas não é por ele ser como é e não saber como te apreciar como você merece. Você é quem tem que escolher se pode lidar com isso tudo e, quem sabe? Talvez ele possa vir a mudar conforme amadurece. — Sorriu de lado, dando de ombros como se pedisse desculpas. — O problema é que, mesmo que ele tenha seus motivos para agir da maneira que age... ele insiste que você fique ao seu lado, não te poupa de nada e por isso você passa por momentos como este. — Tocou algumas de minhas lágrimas com seu indicador fino, como se representassem o que dizia. — Ele não é estúpido, amiga. Evan sabe o quanto você é especial e que nunca vai encontrar amor mais puro neste mundo que não seja o seu e, adivinha só? O que você fez, o que quer que o babaca do Noah tenha dito pra ele... nada disso muda coisa alguma. Evan ainda será mais esperto e egoísta do que tudo isso para simplesmente te deixar livre de toda esta dramalheira.
Funguei, secando minhas lágrimas com a manga comprida da minha camisa.
— Você diz como se ele fosse o mal caráter nisso tudo... — murmurei.
— Claro que não. Mas com certeza também não é você. Mal caráter é o amigo dele que fica usando de uma decisão que foi tão dele quanto sua como uma espécie de ameaça. Algo que, novamente, eu tenho certeza que Evan entenderia se você apenas conversasse com ele sobre isso.
— E aí estava ele... sutil, mas afiado o suficiente para servir como o "eu te avisei" do dia. A olhei com os olhos em riste e ela riu um pouco, sabendo exatamente o que tinha feito. — Mas, é sério, Ali. Mesmo se Evan fosse de fato completamente incoerente, o que ele estava esperando? Você tem vida própria, uma hora as coisas têm de acontecer.
— É... verdade. — Me surpreendi com o fato de que não tinha considerado este detalhe, que deveria ser o mais importante, até agora. Eu simplesmente tinha me deixado levar pelo julgamento de Noah. — Não está certo me reprimir assim por isso... Eu vou falar com Evan — decidi, de repente não me sentindo mais abatida. Fosse o constrangimento ou a aflição, nada disso estava conseguindo mais envenenar minha mente. Foi como uma injeção de adrenalina no que parecia já estar podre.
Me virei para minha melhor amiga com esta nova atitude e eu sabia que ela já havia entendido sem que eu precisasse dizer nada, mais uma vez, pois seu lindo sorriso era enorme. Mas eu quis dizer ainda assim:
— Ai, eu te amo... — Me joguei desajeitadamente em sua direção e ela me aninhou no abraço que eu buscava com naturalidade, como se já esperasse por isso e, apesar de não gostar muito de abraços, estava muito bem em aceitar este aqui.
— Eu também te amo, minha surtadinha. Sempre aqui para você.
— Você é a melhor! — A esmaguei por um segundo para logo me afastar, antes que me xingasse. — Agora, me fala — pedi, realmente conseguindo me animar com a curiosidade agora — o que era aquele mistério todo de "tudo depende de você" de agora a pouco?
— Ah, sim! Acho que depois disso tudo é seguro seguir neste assunto. Então, vamos lá! — Puxou uma respiração profunda. — Antes de te contar, eu preciso que você não surte com o que vou dizer, porque não é nada demais e eu tenho meus motivos, que não são os seus, para estar fazendo isso — enfatizou suas palavras.
— Ok, Kat, tudo bem! Só fala logo! — apressei, ansiosa, arrancando-lhe uma risadinha.
— Ok, é sobre... Blake — meus olhos se arregalaram, mas ela levantou uma mão no ar antes que eu expressasse mais — e sobre toda aquela coisa de encontro que você queria montar, com o qual eu não concordei — se apressou em deixar claro —, mas estou considerando conhecê-lo do meu jeito por conta dos meus próprios interesses. Esta é a decisão.
— Ahm... uau! — lancei antes de mais nada, absorvendo o que havia acabado de ouvir. — Posso te perguntar o que te fez mudar de ideia?
— Eu não mudei de ideia, não vou sair com Blake. Mas... eu preciso de alguém que possa fazer minhas doações por mim. Você sabe... por conta do meu pai. Blake é rico e famoso, então é perfeito para... "lavar o meu dinheiro", na falta de um termo melhor — brincou risonha, mas eu estava intrigada.
— Oh... Oh! — exclamei, depois de refletir mais um pouco, e imediatamente desaprovar. — Kat, não! Isso é usá-lo!
— Claro que não! Não estou usando ninguém, ele saberá que é por isso que estamos saindo e duvido que vá se importar. É pela caridade! — Deu de ombros, com uma postura resoluta.
— Não, mas não foi isso que eu disse a ele que iria acontecer! Não é este o motivo de eu ter pensado em unir vocês dois para começar! Kat, ele já não está muito bem por questões pessoais, ser rebaixado a "acompanhante financeiro" vai feri-lo ainda mais. Não vou deixar você fazer isso! — pontuei com determinação. De jeito nenhum eu deixaria que a cabeça dura da minha amiga tratasse o homem mais perfeito deste mundo feito uma ferramenta para transações comerciais. Isso chegava a ser insultante!
— A decisão não é sua, é dele. E ele vai aceitar, pela caridade. E, adivinha só? Eu não preciso me preocupar com o ego masculino dele, porque não sou eu quem já está pisando nele sem misericórdia. Não tenho este domínio.
Permaneci confusa por um mero segundo, mas logo a expressão metida à esperta em seu rosto me disse tudo, me fazendo revirar os olhos.
— Eu tenho namorado e não existe a possibilidade de Blake se sentir afetado por mim de maneira alguma. Só o que eu tenho feito é tentar ajudá-lo.
— Sim, jogando-o pra cima da sua amiga logo depois dele beijar você, dele trazer presentinhos para você, dele ser todo fofo, charmoso e amável com você! — Meu queixo caiu aberto com o espanto. — Sim, amiga, você está o ajudando pra caramba, com certeza ele está muito feliz com isso tudo.
Sua ironia perdurou no ar, por longos segundos eu não soube o que dizer, porque, por mais que fosse muito desconfortável admitir, nada do que tinha dito deixava de fazer sentido. Mas não fazia! Porque era eu, Alison Cansoli, a garota que o conheceu no mesmo dia em que esteve coberta de vômito do próprio namorado, que, aliás, havia acabado de a trair! O que era a minha existência perto de alguém como Blake? Era fantasioso demais pensar diferente e, por mais maluco que isso fosse, nestes momentos eu era a única pessoa que conseguia manter os pés na realidade, então não estava indo explicar isso tudo para Kat, ela apenas se frustraria comigo mais uma vez.
Mas a questão era que... mesmo sem dar uma chance, ela estava dando uma chance. Dentro de seus termos, mas ela estaria com ele, não era? E aí eu não precisaria explicar mais nada, porque ela o conheceria, a conexão seria certa e imediata e, seria isso, o primeiro passo estará dado!
Seria mais fácil assim, mais natural e muito mais romântico! Melhor do que eu esperava. Só havia uma coisa que eu ainda precisava cuidar, antes de deixar este romance todo nas mãos do destino:
— Você tem que passar um tempo com ele de forma natural antes. Sem nenhum esquema de interesses por trás da coisa toda.
— Eu concordo com isso, mas estou curiosa sobre o que te fez chegar a esta conclusão — disse sem tirar os olhos da lixa que usava para arredondar suas unhas.
— O fato dele ser um ser humano, Kat! — deixei o óbvio em explícito. — Eu tenho certeza de que ele não se importaria realmente em te ajudar nestes eventos, mas a questão é que eu já havia o deixado com expectativas sobre uma conexão pessoal. Você não pode apenas chegar até ele no modo "termos e condições". Quer você acredite que ele se sensibilizará ou não, você precisa tratá-lo como uma pessoa primeiro. É isso, ou nada feito!
Porque, sim, por mais que "a decisão não fosse minha", como ela fez questão de esclarecer, Kat me conhecia mais do que o suficiente para entender a gravidade do que estava manipulando aqui.
Se não entendesse, não teríamos sequer chegado a este ponto. Eu teria dito "ei, tenho um amigo gato que quer sair com você" e ela diria "sim" sem pensar duas vezes, porque encontros arranjados não eram nada novo para ela, e porque, novamente, quem diabos diria "não" para Blake?
Kat disse, mas apenas porque ela entendia, a sua própria maneira, o nível de importância para mim. Então se eu mudasse de ideia e dissesse "fique longe dele"? Ela respeitaria pelo mesmo motivo.
— Bom, eu já disse que concordava. E, não se preocupe, já planejamos uma solução pra isso.
— Me ofereceu um sorriso esbelto e, antes que eu pudesse entender o que estava fazendo, deu um leve apertão na minha bochecha. — Você é fofa!
— Tudo o que eu quero ser. — Revirei os olhos, descontente. — Mas, como assim, "planejamos"? — Um choque me percorreu de repente. — Ai, meu Deus, você já falou com ele sobre isso tudo! Como o encontrou? Quando foi isso?
— Não, eu ainda não o conheci. Eu só... tentei, ontem à noite. — Me olhou com falsa hesitação.
— Você lembra da outra coisa que eu queria te contar? A que era mais como uma descoberta?
— Sim, verdade! O que era? — A curiosidade me pegou de novo.
— Então, não me julgue, mas aconteceu como um outro "esquema de interesses" e...
aparentemente, agora nós duas temos um amigo novo em comum.
Arqueei uma sobrancelha, desconfiada.
Kat somente assentiu.

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