Caleb
Acho que tudo deu certo, no final das contas.
Era finalmente terça-feira, já perto das sete da noite, e eu estava naquela reunião que tanto me causou estresse para me preparar.
O rosto até então sério da mulher a minha frente se voltou para mim, iluminado com um sorriso que suas feições pareciam não estarem acostumadas a formar. Ela fechou meu notebook e o arrastou para mim, sem mais palavras.
Meneou suas mãos no ar, como se as procurasse, para descrever seu deslumbre, mas acabou apenas deixando seus ombros dentro do blazer azul caírem, em desistência.
— Não tenho o que lhe dizer... uau! — Se virou para Andy, o rapaz de cabelos escuros sentado em uma cadeira no canto do cômodo, que nos observava com expectativa, com seu próprio notebook no colo. — Pode enviar os e-mails de consolação para os outros concorrentes, sim? O senhor Lane é realmente o nosso vencedor!
Miranda Bell, curadora da galeria de fotos e artes visuais de Nova York, ofereceu-me sua mão delicada para um surpreendente firme aperto de mão, por cima da mesa de seu escritório, selando assim o fim da odisseia que foi este concurso. A mulher era atraente de uma forma austera, como se te desafiasse a olhá-la demais, mesmo que as ondas reluzentes e curtas de seus cabelos ruivos, e o castanho intenso de seus olhos, parecessem ter sido ilustrados com magnetização natural, feitos para atrair. Estipulei que estivesse no final dos quarenta, pelas leves e charmosas linhas de expressão em alguns pontos de seu rosto fino, mas, ao mesmo tempo, ela me lembrava a versão jovem de Barbra Streisand, mais especificamente em "Funny Girl".
Tudo isto, no entanto, eram apenas suas características conversando com os meus olhos. Sua pose superior, clássica e bem formada, na verdade estava me lembrando de alguém que... eu realmente gostaria de parar de me lembrar.
E este era o problema, a mulher sequer possuía alguma semelhança explícita com este alguém.
Assim como as flores do parque por onde passei perto enquanto vinha pra cá, a essência delas me trouxe esta mesma reminiscência por motivo nenhum. Até mesmo o sol, que eu costumava adorar que me acordasse com seu calor, me fez sentir pesaroso pela temperatura de uma pele que eu nunca senti. Era completamente... sem sentido!
E agora este sorriso orgulhoso e reverente da senhora Bell, que era totalmente seu, me levaram para a noite de ontem, na casa de Alison, direto para o momento em que um pé empurrou meu joelho, com uma reprimenda brincalhona.
Eu não entendia o que estava acontecendo, mas de jeito nenhum eu chegaria perto da palavra "apaixonado". Essa cisma com Katrina, de vê-la em absolutamente tudo e todos, de tudo me remeter a sua beleza, isso era o que acontecia quando eu reprimia minha atração por alguém.
Já havia acontecido antes, muitos anos atrás, e eu havia me esquecido do pé no saco que a sensação poderia ser. Foi por isso que me tornei este profissional dos encontros casuais, seja pelo motivo que fosse, se eu negasse meus desejos, se eu não possuísse ao menos uma memória quente para guardar e reviver, minha cabeça simplesmente continuava girando em volta da pessoa feito o mais bizarro dos obcecados.
Eu não gostava de admitir, provavelmente detestaria a experiência e muito menos tenho tempo para pensar nisso, mas eu preciso de terapia!
— Não posso te agradecer o suficiente pela oportunidade! — exclamei, forçando-me a ficar animado com o que acontecia agora. — Apenas... muito obrigado! Por me dar uma chance, dentre todos os outros concorrentes que com certeza devem ser muito talentosos. Agradeço de verdade!
— O mérito é todo seu! — Abanou, como se deixasse de lado. — Sabe, senhor Lane, minha equipe decidiu propor este concurso à base de descrições, porque acreditamos que, por mais que nem sempre um significado profundo seja necessário na arte, a expressão de seu criador é fundamental. E a sua nos intrigou, verdadeiramente! Junto com a minha assistência criativa, ficamos todos curiosos pela forma que escolheu se expressar, digo... ninguém conseguia imaginar exatamente como bolos e ferragens mecânicas poderiam funcionar bem, apesar de atenderem a uma das propostas. Mas a parte onde explica como utilizou da técnica a favor de sua intenção pessoal fez toda a diferença. Poucos ousam desta maneira e o resultado não poderia ter sido mais satisfatório. Estamos felizes em trabalhar na sua exposição, parabéns mais uma vez, senhor Lane!
Inspirei fundo, um tanto comovido por suas palavras.
Era isso que estava acontecendo na minha vida agora. Era esse prestígio que havia conquistado.
Este tinha de ser o meu foco.
— Apenas te agradeço e a todos de sua equipe... mais uma vez. — Apertei a mão da mulher novamente e somente me concentrei quando começou a detalhar como funcionaria a exposição neste próximo fim de semana, quais grandes nomes já haviam confirmado presença como potenciais financiadores para o meu trabalho e, claro, quais seriam as oportunidades trilhadas a partir daí, para a minha carreira.
O entusiasmo com o futuro enfim sucedeu em livrar minha mente de quaisquer perturbações pessoais e, antes de deixar o escritório neutro da senhora Bell, com mais agradecimentos e parabenizações entre as despedidas, a última pergunta que fiz foi sobre quando seria viável voltar a utilizar apenas o "Lowell" como meu sobrenome, por conta do estrelato do meu irmão.
— Bem, depois desta exposição, não lhe faltarão representantes preparados para te auxiliarem na conquista de sua própria influência, então será uma mudança que poderá fazer tão logo quanto decidir entre eles, senhor Lane... Lowell Lane, por hora — ela corrigiu, com uma expressão amistosa, e, sinceramente, era tudo o que eu queria ouvir.
Blake já havia obtido seu sucesso com "Lowell" e eu precisei utilizar o "Lane" até alcançar o meu, sem sua interferência involuntária. Era um alívio que tivéssemos seguido por áreas diferentes e que a senhora Bell pudesse ter me dado esta resposta exatamente por isso.
Porque, assim que conseguisse meu representante, eu deixaria o "Lane" no esquecimento, exatamente como ele nos deixou.
No bolso da minha calça, senti meu celular vibrar pelo o que deveria ser a décima vez na última meia hora. Só o desbloqueei para verificar quando já estava dentro do meu carro.
Inúmeras mensagens a muito não respondidas apareceram em minha tela, e assim continuariam. Oito delas eram da minha mãe e do Blake, me questionando com suas ansiedades sobre a reunião. Duas eram de Alison, sobre o mesmo assunto e... a última era de Katrina.
Suspirei, me irritando comigo mesmo.
Digitei respostas rápidas para a minha família, mas minha repentina determinação em fingir que esta sensação sufocante não existia me fez ignorar as mensagens das garotas, por mais que não fossem de má fé. Muito pelo contrário, parte de mim estava sentindo falta da animação contagiante de Alison neste momento, que agiria tão feliz como se esta fosse uma conquista sua.
No entanto, Katrina poderia estar com ela neste momento e, mesmo que ela não tivesse culpa ou noção alguma de nada, eu apenas não queria me prender mais ainda em sensações adversas.
Sim, eu tinha me divertido ontem à noite com as duas, da forma mais inocente possível, e este assunto deixou de me perturbar até o momento em que acordei, mas eu era fodido demais da cabeça para conseguir perdurar nesta tranquilidade.
Infelizmente era como era e por isso precisaria agora... passar a evitar.
E a oportunidade de fazer isso pulou em uma notificação na tela do meu celular quando estava prestes a guardá-lo de volta.
Era uma modelo árabe, a do "poder circunspecto", que fotografei a algumas semanas atrás para o meu portfólio — seu contato estava salvo mais ou menos com estas palavras — e ela havia me enviado nada mais do que uma foto dela mesma de corpo inteiro na frente de um espelho, fazendo uma pose sensual dentro de um vestido curto e decotado demais e com uma taça, do que parecia ser champanhe, cheia de menos. "Téeedio... vem aqui me animar" dizia a legenda, acompanhada de um emoji com expressão sugestiva. Em seguida a localização de um clube apareceu e, aparentemente, não era longe de onde eu estava agora.
"Chego aí em cinco minutos" — respondi, apenas, já bloqueando meu celular e dando partida no carro, antes que começasse a pensar demais.
Caleb Lowell não se importava com o fato de não saber seu nome. Ou com a realidade de que estava indo para um lugar estranho, encontrar com uma estranha que, até se sentir animada o suficiente, nunca havia lhe dirigido a palavra depois de um mínimo flerte banal a semanas.
E, com certeza, também não se importava com o porquê estava fazendo tudo isso mesmo a contragosto. Este era o modo "Caleb Lowell de ser", era assim que ele comemorava suas vitórias:
Indiferente, até que as coisas ficassem físicas. Não havia o que reclamar.
Eu vivia da melhor maneira, a descomplicada. Já tinha de lidar com preocupações como as recentes em relação ao meu irmão praticamente desistindo de viver e também com as memórias deprimentes que meu trabalho havia desenterrado. Deixar de me envolver com uma mulher atraente não era a porra do fim do mundo, pelo amor de Deus!
Então, sim, eu evitaria isso tudo. Passaria a noite no meio das pernas de outra mulher atraente sem pensar em nada além do prazer carnal, a próxima com quem estivesse disposto, e assim seguiria com a minha vida. Poderia não ser o ideal, mas era o meu jeito de crescer e priorizar o que importava, simples como tinha de ser.
Porque, como a senhora Bell mesmo acabou de me dizer, nem sempre um significado profundo é necessário.
E era sob esta perspectiva leve que eu queria viver.
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Tudo o que Sonhei
Roman d'amourO melhor amigo, o crush ou o ídolo? Para a romântica e desajeitada Alison, todos estes clichês se tornam realidade num curto período de tempo e, quem olhasse de fora, diria que isto tinha de ser o destino agindo a favor de uma pobre alma... certo...