11 - Boliche

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Cemitério de São Francisco Xavier,

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Cemitério de São Francisco Xavier,

Já passando das quatro da tarde quando atravessei os ocultos do cemitério, deixando firme os dois buquês de rosas brancas. O aroma intenso das flores se misturava ao cheiro do mato fresco, enquanto uma leve brisa cortava o ar morno, trazendo a promessa de chuva.

Caminhei pelos trilhos tortuosos, entre lápides cobertas de musgo e flores murchas. Os passos foram movidos sozinhos, como se o tempo de luto permanecesse um caminho automático na minha mente.

Eram dezesseis anos fazendo o mesmo trajeto.

Meu coração acelerou ao olhar a figura à frente do túmulo. Caio, com os óculos de sol escuros, olhou para mim. Vestia um terno cinza impecável, e o crachá da defensoria pública suspensa no bolso do paletó deixava claro que o trabalho nunca se afastava dele.

— Você trouxe? — Caio comentou, olhando para os buquês.

— Falei que daria para ele — respondi, agachando-me lentamente.

Coloquei as rosas sobre a lápide, retirando as flores murchas, com os dedos que tremiam levemente. Troquei a água e acomodei os novos buquês, enquanto meus dedos deslizavam pelo carrinho azul que guardava como memórias de um menino que nunca pôde brincar.

— Nunca trouxe brinquedos para ele — comentei, olhando para Caio, que negou com a cabeça.

— Quando cheguei, já estava. Não foi você? — ele franziu o cenho, buscando em meu olhar uma resposta que não estava lá.

— Deve ter sido Susana — murmurei, distraída, enquanto retirava as folhas secas que se acumulavam sobre a lápide.

O nome do nosso menino estava cravado no mármore branco, uma marca eterna que nenhuma foto poderia capturar.

Tirei o rosário da bolsa, enrolando-o entre os dedos. Nunca fui muito religiosa; Susana me arrasta para a igreja um domingo de mês, e cada confissão era uma oportunidade para aliviar a alma, mas minha fé sempre foi escassa.

— Fui à sua casa hoje mais cedo — disse Caio, rompendo o silêncio. — O que houve com a sua porta?

Olhei para ele de soslaio.

— A maçaneta caiu — menti, segurando um sorriso que quase escapou.

Ficamos em silêncio, ambos imersos em pensamentos, olhando para a lápide. A ausência era palpável, uma dor que se instalava no peito como uma pedra.

— Tenho uma audiência em meia hora — disse ele, quebrando o silêncio novamente. — A gente precisa conversar, Helena.

— Quer conversar? — pedi, e ele assentiu. — Vai conversar com a Flávia, aposto que ela tem muito a te dizer.

— Sabe, você poderia ao menos conversar comigo... — sua voz era uma mistura de frustração e tristeza.

— Eu não tenho nada a dizer, Caio. Você trepou com a Flávia, eu descobri dois anos depois. Tá tudo bem... já superei — respondi, apertando as bolinhas do terço, buscando conforto na brincadeira dos gestos.

Destinos Cruzados | Capitão NascimentoOnde histórias criam vida. Descubra agora