IMPUROS-Radinho

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Beatriz.

Depois que Radinho se afastou, Beatriz ficou sentada na pracinha por mais alguns minutos, o vento suave batendo em seu rosto enquanto ela tentava organizar os pensamentos. O morro parecia ser uma entidade viva ao seu redor, com seus sons, suas pessoas e suas regras próprias. O nome de Wilbeth ecoava em sua mente, carregado de um peso que ela ainda não compreendia completamente.

Ela se levantou, respirando fundo. O caminho para a casa de Wilbeth era íngreme. Conforme seus pés pisavam firme nas pedras e na terra batida, o pensamento sobre "aquilo" que Radinho mencionara começava a se instalar com mais firmeza. Aceitar a situação com Wilbeth não seria fácil. Não era só a intensidade com que ele a tratava, era o que vinha junto.

Enquanto caminhava, ela se perguntava se estava pronta para tudo isso. A vida no morro parecia funcionar em uma frequência diferente, e estar ao lado de Wilbeth colocava um alvo invisível em suas costas.

Ao chegar em frente à casa de Wilbeth, Beatriz notou que a porta estava trancada. Ela parou por um instante, observando o lugar com um olhar confuso. A chave estava com ele, o que significava que ele não estava por ali. Tentando não se frustrar, ela virou nos calcanhares e começou a descer o morro de volta, dessa vez com a intenção de encontrá-lo.

Enquanto descia, a tensão em seu peito aumentava. O morro, de alguma forma, parecia observá-la. Cada pessoa que passava por ela lançava olhares rápidos, alguns curiosos, outros indiferentes. Radinho havia falado de Evandro, e agora isso também pesava em sua mente. Quem mais, além de Wilbeth, representaria perigo?

A cada passo que dava, sentia a distância entre ela e sua antiga vida crescer. O morro era cheio de nuances, e ela estava apenas começando a entendê-las. Ao chegar na base, onde a pracinha estava novamente em sua linha de visão, ela procurou por Wilbeth com os olhos.

A provocação de Gilmar estava no ar, mas a praça parecia funcionar em uma frequência própria. Eu não podia deixar aquilo me afetar. Cada passo até Wilbeth tinha que ser calculado, e eu sabia disso. Mesmo com todos os olhares, eu precisava manter o foco. O vento da noite passava pelos meus cabelos, e o barulho da conversa entre os caras me cercava, mas eu só conseguia pensar em pegar a chave e sair dali.

A energia na praça mudou assim que eu me aproximei de Wilbeth. Era sempre assim quando eu chegava — o burburinho diminuía, e eu sentia os olhares se voltarem pra mim. Talvez fosse o jeito que eu andava, ou talvez fosse apenas porque eu estava associada a Wilbeth. Havia uma pressão que eu mal começava a entender.

Eu vi Radinho ali, meio que à margem, com os outros caras, e percebi seu olhar, mesmo que ele tentasse disfarçar. Não era a primeira vez que eu notava isso, mas hoje parecia mais intenso, mais... presente. Ainda assim, eu mantive minha postura. Não podia me deixar levar pelo que estava acontecendo ao redor.

— Wilbeth, eu preciso pegar as chaves com você — disse, olhando diretamente pra ele, ignorando a tensão no ar. Minha voz saiu calma, mas eu sabia que todos estavam escutando.

Wilbeth me olhou de volta com aquele meio sorriso que ele sempre fazia quando sabia que estava no controle da situação. Ele não precisava falar muito. Apenas pegou o molho de chaves e me entregou.

— Aqui, Beatriz. Vai direto pra casa, hein? — disse ele, num tom protetor, mas com uma firmeza que me fez entender que aquilo não era um pedido. Era uma ordem.

Eu sabia que ele estava cuidando de mim à sua maneira, mas ao mesmo tempo, havia algo sufocante naquela proteção. Não era liberdade, era responsabilidade, e eu sentia o peso disso cada vez mais.

Antes que eu pudesse sair, ouvi Gilmar e os outros começarem a zoar Radinho. Aquilo me fez olhar de canto para ele. Ele estava tentando disfarçar, mas eu conseguia ver a tensão em seu rosto. Fiquei observando, meio curiosa para saber até onde aquilo iria, mas sem me envolver. Wilbeth também percebeu e cortou o clima com uma única frase, colocando um fim na provocação de Gilmar.