Naquela noite, Clara não dormiu. Duvidou que conseguisse descansar a mente do dia atribulado. Pensou e pensou no que tinha presenciado. Muitas dúvidas rondavam sua mente inquieta.
O poder que havia em Rico era sem igual. Um ser como ele poderia ter destruído metade de Manaus brincando. A pergunta que não queria calar era: Por que então ele não o fazia.Não que a menina quisesse que ele fizesse, mas seria natural um ser da natureza dele aproveitar-se de tamanha grandiosidade para impor sua presença maléfica entre os demais povos.
Ele tinha vinte e um anos e até então ninguém tinha sequer ouvido falar dele. Haram, até aquele momento tinha sido o ser mais temível das matas, e pra falar a verdade, não chegava nem perto do que era Rico.
Essa era outra questão que afetava Clara. Ela tinha sido a responsável pela retirada da ônix do pai de Rico. A pedra era a fonte de energia que o mantinha vivo e a ausência dela fizera com que ele se desmaterializasse definitivamente. Toda sua prole tinha se acabado diante disso.
O feito a tinha dado notoriedade internacional em ambos os mundos e no entanto, por algumas vezes a garota e o rapaz tinham se falado, conversado e rido sobre coisas diferentes, e nunca ele tinha abordado o assunto com ela.
É claro que era do conhecimento dele tal realização. Mas parecia que não havia importância.
Em sua casa, Rico estava furioso com o ocorrido na festa do boi bumbá. Não era para Clara ter presenciado aquela discórdia entre ele e os outros mitos.
Idiotas, imbecis e burros. O Curupira xingava em alto e bom tom para seus próprios ouvidos. Todos os malditos animistas sabiam agora que havia um conflito entre ele e os seus e isso não era um ponto favorável.
Ele tinha pedido aos mitos que se abstivessem do evento esse ano. Todos sabiam que Rico liderava um motim contra o Vale e que seu plano para matar a animista por excelência já estava em andamento.
Ao invés de unirem suas forças, fizeram o contrário, desafiaram-no, incluindo sua irmã. Mas eles sabiam que estavam em maus lençóis com ele, em especial a curupira, a quem nesse momento devia estar se contorcendo no ápice da dor, exposta ao público para que toda sua prole soubesse o que era afrontar seu líder.
Rico e Clara encontraram-se, depois de muitos dias sem se verem, próximo às dependências da república.
Ele parecia saber que ela estava ali e sua postura era de quem esperava com paciência. O rapaz gozava de excelente humor.
-Você está trabalhando demais menina.
Ele realmente tinha a voz quente e acolhedora, ou talvez fosse o tom baixo e ponderado que sempre usava que desse essa sensação à menina. Ela voltou à conversa e deu de ombros.
-Eu não tenho nada mais pra fazer, então fico feliz em ocupar meu tempo ajudando como posso.
-Você nunca sai para se divertir?
-Me divirto com o pessoal no Vale.
-E o que tem pra se fazer lá?
-Basicamente as mesmas coisas que os cem por cento humanos fazem. Festas, encontros, luaus, essas coisas.
-Sei. É tudo a mesma coisa afinal de contas, não é? Bebedeiras e zoações, não importa quem somos ou de onde viemos.
-Bebedeiras? Não. – Ela balançou a cabeça em negativa. - Nunca ingerimos bebidas alcóolicas, nosso organismo não permite.
Rico ficou em alerta. Gostou do curso que a conversa estava tomando e investiu nessa área.
-Nunca? São bichinhos bem comportados então.
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O CURUPIRA
Teen FictionRico olhou fixamente para sua maior inimiga no mundo, Clara Jordani, e intimamente ficou muito surpreso. Tinha ouvido falar o quão poderosa ela podia ser, mas não esperava que fosse tão jovem e estupidamente bonita como de fato era. Ele percorreu o...