Capítulo 17

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Entrei pela porta dos fundos torcendo para que não houvesse ninguém em casa. A menina ainda tremia muito. Fiz sinal para que ela ficasse em silêncio assim que entramos e subi correndo as escadas até o andar de cima. Tentei pensar no que fazer a seguir, mas o pânico não permitia que eu agisse racionalmente. Meu pai iria me matar. Disso eu tinha plena certeza. Mas não podia ter deixado aquela menininha sozinha na chuva. É claro que eu nunca havia feito uma coisa como aquela antes e sim, é óbvio que já tinha visto mendigos dormindo pela estrada. Ainda não consigo explicar minha atitude. Era algo nos olhos da garotinha, talvez o medo. Eu só queria que ela estivesse em segurança como meu pai queria que eu e Laura estivéssemos.

- Oi. – gritei. – Alguém em casa?

Ouvi apenas o silêncio.

- Tudo bem. Acho que estamos sozinhos. – disse lançando à ela um sorriso forçado. – Ainda tá com fome?

Ela balançou a cabeça positivamente e mais animada.

- Ótimo. – respondi satisfeito. – Eu também.

Corri pela cozinha em busca de algo que pudéssemos comer. Optei pelo sanduíche que parecia ser o lanche mais rápido e o que eu estava mais capacitado a fazer. Servi um copo de suco e coloquei na frente dela. Comemos em silêncio.

- Karen vai me matar. Sujamos a cozinha dela. – eu expliquei. – Karen é minha madrasta. É como uma mãe. Não é nada como nos livros, sabe? Ela é uma pessoa legal.

Conversar sozinho não estava sendo exatamente desconfortável, mas eu me sentia um pouco doido nessa situação. Estava morrendo de frio e precisava me trocar, mas estava sem muita ideia do que fazer a seguir.

- Eu tenho uma irmã, sabe? Na verdade tenho duas. Sara e Laura. Laura tem sua idade, como eu disse. Acho que posso arranjar algumas roupas dela pra você. O que acha?

Ela concordou.

- Tudo bem então. Quer olhar TV enquanto arranjo alguma coisa?

A menina balançou a cabeça outra vez.

- Ok. Que tal levar o sanduíche até o sofá? Karen não gosta muito disso, mas hoje temos uma exceção. – a encarei como se esperasse algum comentário.

Liguei a TV em um canal de desenho animado e subi até o quarto de Laura. Não sabia se era seguro ou não deixá-la sozinha no andar de baixo enquanto eu tomava banho por isso preferi continuar molhado e adiar o banho quente.

Remexi nas gavetas de Laura sem saber ao certo o que podia pegar. Escolhi um moletom laranja que ela usara poucas vezes e que parecia não gostar e uma calça de abrigo da mesma cor. Ainda estava me sentindo inseguro quanto a ter que servir de babá quando ouvi um grito no andar de baixo. Corri descontroladamente escada abaixo e em um instante estava na sala. Laura estava em frente à garotinha desconhecida, ambas com o olhar assustado.

- Dill! – Laura disse. – Tem uma menina no sofá.

- Eu sei. – disse me aproximando. – Laura calma. Ela é uma amiga. – olhei para a garotinha e lhe informei que Laura era minha irmã. – O que você faz em casa? Não foi pra escola?

- A escola tá sem energia elétrica. Parece que ainda não descobriram a existência dos geradores – ela disse revirando os olhos. – Ainda bem. Ela tá molhada, Dill. Mamãe vai matar você...

- Eu sei... preciso que você guarde segredo.

- Como assim?

- Ela estava sozinha na rua e estava chovendo.

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