(Continuação)

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- O autor do livro. Pensei que fosse mais esperta.

- Hei! – ela revirou os olhos, enquanto abria as janelas. Cobri meu rosto com o travesseiro  evitando aquela claridade repentina. - Vamos logo lá para fora  - acrescentou ao me encarar com aquele olhar descrente ao perceber o que eu estava vestindo. – Você não muda nunca. Meia e moletom? Acreditando ou não estamos em pleno verão na serra Brasileira, meu amigo. Não no Canadá, Pólo norte ou em meio ao inverno nova-iorquino.

- Me deixa em paz! - respondi lutando para recuperar o cobertor que ela roubara. - Sabe muito bem que sou como os ursos, eles hibernam no inverno e eu leio no verão...

- Ah, claro! Você e os ursos são primos distantes. - disse ela percebendo que eu não iria desistir da minha teoria. Jogou o cobertor no cesto de roupas sujas e sentou-se na beirada da minha cama com um olhar cansado. – E então? De onde surgiu esse interesse repentino pela literatura?

            Suspirei intrigado com aquela persistência infinita.

- O DVD estragou, não tô afim de usar a internet – assumi. -  e não tenho outra opção senão ler livros. - finalmente deixei “Caminhando na Chuva” de lado e me levantei da cama pondo meus estreitos olhos em Julia.

            Como de costume ela parecia ter vestido a primeira roupa que viu pela frente: uma camiseta verde com capuz e uma calça jeans velha que acho que ela usava desde os doze anos.

- E que tal sairmos desse quarto, tomarmos um sorve e ainda por cima poupar você de tanta cultura?

- Julia, detesto aquele astro lá em cima! - falei num teatralmente magistral tom de lamento, o que valia os meses que perdi fazendo teatro na escola.

- Acho que entre as pessoas normais ele é mais conhecido como sol e não faz mal nenhum pra você. Só deixa sua pele mais bonita. 

            Ela suspirou e me encarou por um instante estreitando brevemente seus olhos verdes sobrenaturais, como costumo chamá-los. Ou então, oblíquos e dissimulados, como diria Dom Casmurro.

- Complexo de beleza! – exclamou como se tivesse tido a conclusão mais inteligente do século, eu suspirei evitando seu olhar de repreensão que me intimidava. – Nunca vou entender. Afinal, precisa de que tipo de incentivo para sair? E o treino de futebol?

            Ela sabia todas as respostas, ou apenas imaginava saber. Eu, por outro lado, não tinha a conclusão exata para nenhuma. Esperava que a vida respondesse minha estranheza por si mesma.

- Eu só queria ficar quieto no meu quarto esperando esse verão irritante acabar.

- Mas as aulas começam na semana que vem – informou Julia como se eu não tivesse conhecimento desse fato - e mesmo que seu maior desejo seja que o inverno volte isso não vai acontecer milagrosamente em uma semana.

- As aulas só começam na próxima semana.

- Você NÃO TEM OPÇÃO.

- Por que ainda tenta? Eu NÃO VOU sair.

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