Qual a resposta?

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"É estranha a sensação de ter que brigar com o próprio corpo. Como se eu não tivesse controle sobre parte dele. Falam tanto em "ninguém manda no coração", quando o problema está na cabeça. Meu grande problema, era criar um conceito para "felicidade". Descobri, que ela não tem conceito. Essa mania de ter que rotular as coisas, quando elas simplesmente, são. Julgar felicidade como aquele momento que você não sente dor, angústia, medo, agonia, é muito amplo, quando você se sente dessas maneiras o tempo todo. Aquela questão de "qual foi a última vez que fui feliz" e não se lembrar, é um erro. Deveríamos nos sentir feliz só por ter a chance de viver, mas isso não acontece. Claro que não acontece. Basta eu olhar para meu lado e ver Ed, para me lembrar que não fui feliz, estou feliz. Mas a dor, sei que ainda está comigo. Sou um poço de emoções conflitantes, instáveis e perigosas para ninguém além de mim. Aquele minuto de silêncio, que você se sente sozinha no mundo. Eu tenho muitos minutos de silêncio, por mais que eu esteja rodeada por pessoas. Que, aliás, elas somam os minutos de silêncio delas, com os meus. Sempre me pego imaginando a dor que a outra pessoa carrega, e cometo o erro de competir com a minha. "Duvido que sofra mais que eu". É assim que você se sente melhor? Ou isso faz sua dor afundar mais? Não sei o motivo de estar falando sobre dores, se estou muito bem comigo mesma, agora. Parece que meu corpo sente a falta da dor, sabe? Como se eu só me sentisse viva tendo que lutar para sair daquela situação. Mas eu estou viva. Muito viva. Seja pelo calafrio que o sorriso dele me faz sentir, seja pelo frio em meu rosto, pela respiração ofegante, pelo calor das mãos dele. Eu me sinto viva. Decidi não lutar por mais nada. Sou feliz, sou triste, essa sou eu. Onde há luta, há dor. E me deixe fora disso. Mas lembre-se: Você está viva.

E se não existir mais um amanhã? Vi gastar o seu hoje pensando em dores? Lembro de quando vivia com meus pais e, eu era muito infeliz. Sim, eu era. Mas lembro que não era assim o tempo todo. As vezes uma música, um sorriso que eu ganhava na rua. Não devemos resumir nosso dia em triste, em vazios. Sei que é difícil, e caramba, como foi difícil. É fácil falar quando tenho o amor da minha vida ao meu lado. Mas eu sou feliz, daqui a pouco, serei triste. Mas lembre-se: Você está viva. Esteja viva ouvindo música, esteja viva com medo do futuro, esteja viva chorando, esteja viva sorrindo. Mas por que eu estou viva? Quando já quis por um fim em tudo? Percebi que, na verdade, eu sou uma pessoa cansada. Em várias questões, principalmente cansada de sentir dores. Mas lembre-se: Você está viva;"

"Ahn..." –Eu parei de escrever, me sentido um pouco perdida. – "Quer escrever um pouco?" –Perguntei à Ed.

"Mas é claro!"

Imediatamente, Ed largou seus talheres e se levantou.

"Onde vai?" –Perguntei, ainda sentada.

"Vamos para o silêncio." –Ele disse.

Olhei para Imogen, que afirmou com a cabeça, dando um leve sorriso.

Segui Ed até seu quarto e não reparei muito como estava, mas dava para ver as paredes pichadas, cheia de assinatura de amigos, textos, desenhos.

"Bom, você não pode ver." –Ele disse, se sentando no chão e escorando na cama.

"Certo." –Eu disse, me sentando na frente dele.

Ed ficou encarando, em silêncio, uma página em branco do meu caderno.

"Mas..." –Ele parecia não saber como perguntar – "O que quer que eu escreva."

"Ué? O rei das composições não sabe o que escrever?" –Perguntei.

"Olha!" –Ele apontou a caneta para mim. –"Saiba que eu sei sim, ok? Só estou me mostrando aberto para aceitar opiniões."

"É só escrever, garoto." –Eu disse, rindo. –"Seja você."

E foi então, que ele não disse mais nada, e seu sorriso foi sumindo aos poucos do rosto, enquanto ele escrevia. E escrevia mais. Mais. Parecia reler o que já havia escrito, e logo voltava a mexer sua mão direita sobre a folha.

"Pronto!" –Ele disse, alguns rápidos minutos depois.

Ele me entregou o caderno fechado e se levantou.

"Vou ter que procurar, jura?" –Perguntei, exibindo o caderno fechado.

"Muito mais poético, não acha?"

"Acho mais trabalhoso!" –Eu disse, folheando o caderno.

Com o canto do olho, notei que Ed andava próximo a uma parede, talvez lendo mensagens antigas, esperando eu ler a mensagem que ele havia me escrito.

"Achei!" –Pensei quase alto, mas ele não escutou.

Uma letra nada caprichada, com uma espécie de desenhos nas partes brancas, onde não havia texto, e uns riscos por cima, como se tivesse se arrependido do texto.

""Das músicas que criei alimentando a minha saudade de você, de nenhuma lembro muito bem, porque todas foram esquecidas quando a encontrei novamente. Esse sentimento me faz ser poético e acreditar que qualquer um é capaz de amar alguém. Sei quantas dores carrega consigo e quantas finalmente está deixando pelo caminho. Farei de tudo para "consertá-la". Quantos sonhos deixou de seguir porque bloquearam seu caminho? Quantas vezes se viu perdida no meio de um vazio e não sabia para onde ir? As vezes, a porta a qual julga certa era a mais incorreta. Já sonhou que, havia se levantado da cama, foi ao banheiro, mas quando percebeu, ainda estava deitada? Eu sei que é confuso, mas é assim que eu me sentia, como se já tivesse superado a sua ausência, estava vivendo a minha vida e quando abri os olhos de verdade, ainda estava lá, parado, esperando você.

Não sou bom com textos, a menos que os mesmos tenham uma melodia. Sei que mudei e com o passar dos dias, vou mudar sempre, as vezes, isso é até bom. Guardo alguns dos meus momentos em músicas, você em seu caderno. Me sinto mais eternizado em seu caderno, do que em seu coração. Porque é como se, você não acreditasse em corações, e quisesse guardar tudo em seu caderno, com medo de perdê-las. Seja momentos ruins, bons, aquelas que você não sabe ao certo o que sentiu. Você é o meu caderno, Yolanda. Espero que, na próxima página, escreva algo feliz, assim como em todas as outras páginas restantes de sua vida."

Após terminar, fingi ainda estar lendo, por não saber o que dizer. Fiquei encarando aquela letra sem harmonia alguma, mas de uma beleza que nenhuma mais parecia ter. Respirei fundo, e esse foi o sinal para que Ed se virasse para mim.

"Leu?" –Ele perguntou, sorrindo.

Eu não consigo disfarçar minhas expressões e, com isso, o sorriso dele logo sumiu. Como se eu estivesse sendo refletida nele.

"Ahn..." –Pigarreei. –"Sim, eu li."

Ed voltou a se sentar na minha frente, sem escorar na cama, parecendo ansioso.

"E?"

"Achei..." –Parecia que eu havia esquecido todos os adjetivos do mundo. –"Muito profundo, sincero..."

"Sim." –Ele disse, sorrindo. –"E qual sua resposta?"

"Resposta?" –Me senti confusa.

"Do texto!" –Ele disse.

Abri o caderno novamente, encontrando a página muito mais rápido do que a primeira vez. Passei o olho no texto e não vi uma pergunta.

"Eu não..."

Ed me interrompeu, sem dizer nada, apenas virando a página. Havia mais coisa, e sim, uma pergunta. Apesar o texto ter rendido meia página, o que não me fazia imaginar uma possível continuação no verso. Havia a pergunta, no meio da página. Escrita como se fosse uma rápida anotação e com a letra diferente do restante.

"Se casaria comigo? Não que isso seja um pedido... mas se casaria?"


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