Rio 40 graus

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26 de dezembro, 2:50 a.m

 Eu não consegui simplesmente fechar os olhos como se nada fosse acontecer em poucas horas. Eu estava indo embora, minha vida estava ficando. Era a última vez no ano que eu veria meu quarto, a neve. É, nunca dei devida importância a ela, mas sentiria falta da neve. Meu quarto parecia vazio, minha cama estava devidamente arrumada e deixei algumas roupas no armário, sem necessidade de levá-las. Peguei meu caderno e comecei a folhear para ler alguns trechos sobre Framlingham. Eu ria e ficava com o coração apertado. A cada página, a minha ida ficava mais difícil. O Market Hill. O castelo. Ethan. Teddy. Lori. Achei que pessoas não poderiam me surpreender tanto, até conhecer eles. As horas corriam e eu nada poderia fazer, partiríamos as 3:40 a faltavam quarenta minutos para isso.

“Yolanda?” –Mary perguntou antes de abrir a porta.

“Pode entrar.” –Eu disse.

Mary abriu a porta devagar e carregava uma pequena mala.

“Vamos?” –Ela perguntou.

“Já?” –Perguntei fechando meu caderno.

“Para ir com calma. Já está tudo arrumado?” –Perguntou Mary.

“Sim, está...” –Eu disse.

“Ethan vai no aeroporto?” –Ela perguntou.

Neguei com a cabeça. Já havíamos nos despedido no natal e acho que meu coração nunca doeu tanto quanto doeu ao ver Ethan chorar. Ele realmente se importava com a minha ida, eu simplesmente queria levá-lo comigo. Coloquei meu casaco azul e pendurei minha mochila nas costas. Peguei minhas duas malas e as levei para a porta da frente. Voltei para o quarto para trancar a porta. Assim que tirei a chave da fechadura, a coloquei como pingente do meu cordão e fui de encontro a Mary, que me esperava na porta da frente.

“Pronta?” –Ela pergunta.

Respirei fundo e dei uma olhada geral na casa. Não, eu não estava pronta. Um táxi já nos esperava lá fora e o motorista ajudou Mary a guardar as malas.

“Tranque a porta, querida.” –Ela disse.

Coloquei a chave na fechadura e observei o interior da casa ir sumindo com o diminuir da fresta e enfim, a porta se fechou. Rodei a chave quatro vezes e a tirei. Passei a mão esquerda na porta, como forma de despedida, e caminhei em direção ao taxi, onde entreguei a chave a Mary.

“Você está bem?” –Ela perguntou.

A ignorei enquanto entrava no carro. Mary e o motorista entraram minutos depois e o táxi começou a andar. Me virei para trás e eu realmente estava indo embora.

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40° graus. É, cheguei no Rio de Janeiro. O aeroporto estava bastante cheio e de repente, o casaco que eu estava usando, não fazia mais sentido algum. Nos sentamos para nos organizarmos e eu só pensava em tirar aquele casaco.

“Bem que você havia me dito que aqui era bastante quente.” –Disse Mary, guardando o casaco.

“É, mas parece que aumentou desde a última vez.” –Eu disse, passando a mão na testa.

Fomos para a porta do aeroporto do Galeão e taxistas começaram a lutar por nossa atenção. Fomos até ao primeiro da fila e o motorista, que tava com um uniforme azul, nos ajudou a guardar as malas enquanto prendia seu cigarro na boca.

“Queremos ir para a Urca.”-Eu disse, entrando no táxi. –“Não adianta inventar um caminho mais longo. Eu sei onde fica a Urca.” –Completei.

Eu já estava pegando o sotaque inglês, fazendo meu português parecer falso. Como o Rio era diferente do que eu imaginava e as lembranças das paisagens já estavam se apagando da minha mente. Demoramos cerca de uma hora e quarenta minutos para chegarmos até a Urca, ou até mais, graças ao enorme trânsito na Avenida Brasil.

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