Não sei o que me deixa mais chocada, o facto de ele querer ir até lá ou o facto de ele me estar a propor voltar lá. Ambas as coisas são tão estupida e sem sentido que me riu, não com uma má intensão é só chocante a uma ponto hilariante.
-Bom ainda bem que é engraçado.- A seriedade escondida pela fachada calma faz-me parar e pisco para ele, sem saber o que dizer.
-Pensava que estavas a brincar.- Encolho os ombros.
-Não me estou a rir.- Ele passa por mim e entra na casa de banho, levanto-me e ando atrás dele.
-Bom devias, essa é a proposta mais imbecil que já ouvi.- Passo a mão pelo cabelo, o meu reflexo está no espelho e consigo ver que algo está errado com ele, apenas não sei o quê, ele não parece zangado a ponto de gritar, ou ir embora espairecer, ou de amuar...no entanto ele está definitivamente chateado.- Eu não vou voltar aquele sitio Harry não depois daquela noite, e é apenas estupido que queiras que eu volte lá...
-Aquilo é de onde eu vim.- Ele vira-se para mim.- E não importa quão longe queres estar de lá se o teus consciente volta para te assombrar. A tua vida comigo começou lá, não importa quão mal queiras esconder o que eramos, vai estar sempre lá.
Arregalo os olhos á medida que compreensão passa por mim. É isso que tenho andado a fazer? A tentar esconder as coisas para não ter que lidar com elas? Para não trazer á vida demónios que deviam estar a arder nas profundezas da minha vida?
-Não é fácil.- Murmuro e mexo-me no meu lugar desconfortável com o olhar dele sobre mim.
-E para mim é? Pensar que talvez eu pudesse ter evitado todo aquele sofrimento se tivesse estado lá? Pensar que eu podia ter-me metido á tua frente quando ele te tocou? Achas que não é difícil? Eu baixei a guarda e no momento a seguir estava inconsciente numa cama, e não havia nada que eu pudesse fazer para correr atrás de ti.
O meu coração corria disparado com as palavras dele, a minha mente voava de volta para todos aqueles acontecimentos e aquilo que eu mais queria era puder parar a culpa dele, mas era impossível porque parecia que eu era incapaz de me desculpar a mim mesma. Eu assisti enquanto ele se despiu e entrou no chuveiro a água fria a pingar perto dos meus pés, o corpo nu tenso, as gotas de água a contornar as costas do homem atormentado á minha frente. Quão atormentado estava ele? Quão atormentada estava eu? Seria mesmo preciso voltar para onde tínhamos vindo para matar os demónios? Será que eu queria mata-los?
Sentei-me em cima do balcão da casa de banho e vi enquanto ele mexia no seu cabelo, os meus olhos viajaram pelo corpo molhado até que ele se virou para mim, de olhos fechados enquanto a água levava a espuma para baixo, os músculos dos braços tensos fazendo as tatuagens ganharem um perspetiva interessante. Eu acabei por sorrir ao constatar quão sexy ele era, mesmo quando estávamos a discutir algo terrível. Os meus olhos voltaram para a sua cara e ele estava sério a olhar para mim, o vidro a começar a embaciar, o verde dos seus olhos a perder-se no fumo.
Ele enrolou uma toalha na cintura e saiu do duche, um rasto de água atrás dele, as gotas de água a escorrer do corpo salpicado de preto. Suspirei enquanto esperava por ele, e não apenas no sentido literal da palavra.
Quando descemos no elevador o silêncio era estranho entre nós, as nossas mãos estavam nos nossos bolsos, e ele evitava olhar para mim no espelho, não tinha a certeza de quão importante para ele seria eu ir, mas eu sabia que não ia.
Passamos pelo átrio e continuamos assim, as suas mãos enterradas nos bolsos do casaco de camurça e eu meio perdida sem saber o que fazer comigo mesma, a sentir-me a mais perto de uma pessoa que há duas horas atrás tinha dito que me amava. Não tinha a certeza para onde estávamos a virar e encontrava-me estranha em segui-lo e mudar de direção de repente. Ele mal olhava para trás, na esperança de que eu ainda estivesse atrás dele, o meu passo tornou-se acelerado para poder acompanha-lo, até que tropecei para frente numa pedra de calçada e ele continuou a andar, eu sabia que ele não me tinha visto, mas aquilo tinha sido o suficiente para mim.
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Vision 3 - The Sentence
Hayran KurguSentado, numa cama de hospital, sozinho, ele lembra-se da ultima vez que se sentiu assim, abandonado. Fecha os olhos e lembra-se da mãe, depois reage como sempre reagiu. Com raiva. Porque se ela se tinha ido embora, ele tinha ficado, e se ela achava...