Capítulo 10

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"Ao destaparmos a verdade, ilumina-se-nos o caminho."

[José Luíz Nunes Martins]



Encontrei Alérci sentado na cadeira de sempre, olhando fixamente para a parede em sua frente, da mesma maneira do dia em que nos conhecemos. Fiquei preocupado imediatamente. Ele estava empenhado em conquistar a garota da escola dele, cujo nome descobri ser Olívia. Aliás, eu sei que até mesmo tentou se enredar pelos caminhos dos poemas, embora ainda não houvesse me mostrado resultado algum.

Decido chamar a sua atenção. Não gosto de vê-lo assim, é angustiante.

— Ei, Alérci. Como vai meu jovem escritor? — Alérci quase cai da cadeira. Assustei-o e isso foi engraçado. Porém segurei uma gargalhada o máximo que pude para que ele não ficasse emburrado.

— Oi, Fernando — respondeu, depois de se recompor do susto — Eu, er, finalizei o poema que fiz para Olívia e... queria que você desse uma olhada?

— Isso foi uma pergunta ou uma afirmação? — Sorri para Alérci.

— Uma afirmação — respondeu envergonhado. E envergonhado permaneceu antes de me entregar o caderno — Por favor, não ria. É um poema bobo.

Revirei os olhos. Um mês me mostrando as coisas que escreve e ele acha que vou debochar do poema? Tenha dó!

— Não vou rir de seu poema, Alérci, eu jamais faria isso.

Finalmente ele me entregou o caderno. Envergonhado. Desconfiado. Abaixou a cabeça e desviou os olhos para qualquer outro lugar.

Comecei a ler mentalmente.

"Dizem por aí que a loucura reside em cada um de nós.

Atiram-nos pedras, porém, por escrevermos sem pudor.

Por nos perdermos em sentimentos vívidos e intensos.

Por não sabermos viver no que nos dizem ser certo.

Dizem por aí que abusamos de nossa voz.

Que alimentamos nossa dor.

Que com nossas rimas causamos muitos incêndios.

Que fazemos da vida um inferno.

Mas digo eu aqui

Nós apenas vivemos a vida

Como uma breve despedida.

Apenas levados pelo amor

Que dizem ser algo incerto.

É certo."

Bem, eu não sabia o que dizer. Claro que não é o melhor poema que já li na minha vida, mas, levando em consideração que é a primeira experiência do garoto com poemas, até que ficou bom. Além do mais, ele abordou o tema de forma sucinta. Não é como a maioria dos poemas adolescentes, que acham que um poema sobre o amor deve ser regado de juras e sofrimentos. Como se o amor fosse apenas isso: sofrimento atrás de sofrimento.

Tudo bem, sei que não sou a melhor pessoa para dar lições de moral sobre isso, tendo em vista que a minha vida amorosa é, em sua grande parte, uma verdadeira tragédia. Mas não existe somente esse lado do amor. O amor é um sentimento que proporciona bastante felicidade quando levado da forma certa, o que não é o meu caso.

Mas os jovens tendem a escrever sobre o amor como se fosse um verdadeiro mar de sofrimento. E, sinceramente, acho que Romeu e Julieta, de Shakespeare, tem muita coisa a ver com isso.

Dê-me amorOnde histórias criam vida. Descubra agora