"O passado não reconhece o seu lugar: está sempre presente."
[Mário Quintana.]
E ela se foi. E eu fiquei sem entender os seus motivos, se é que havia algum. Ou talvez havia, eu não sei. A única coisa que sei é que ela deixou meu coração sangrando por conta da sua partida e...
— Droga, não está dando certo. - murmurei, um pouco frustrado.
Respirei fundo. Eu não poderia me desesperar. Era apenas a minha segunda tentativa de escrever. Eu conseguiria. Eu conseguiria.
Eu estava acomodado em uma cadeira, debruçado sobre a minha escrivaninha, totalmente concentrado em encontrar a melhor forma de escrever o enredo da história que se passava em minha cabeça. Não estava sendo fácil, obviamente, mas eu não estava com a menor disposição de desistir.
Eu posso, eu quero, eu consigo.
Esse é, com certeza, o clichê mais incentivador que poderia existir.
Olhei para o lado de fora, pela janela em minha frente. Estava chovendo e as gotas da chuva percorriam o seu caminho preguiçosamente pelo vidro. Tomei um gole do meu café, que já começava a esfriar, e olhei para os papéis sobre a minha escrivaninha. Eu nunca fui de escrever pelo computador. Os meus olhos doem e começam a lacrimejar, o que não é algo que eu aprecio. Sempre preferi a simplicidade da caneta sobre o papel, ou até mesmo a antiquada máquina de escrever, na hora de passar para o papel as minhas ideias mirabolantes.
Voltei os meus olhos para o relógio. Já passava das três da manhã e eu nem havia percebido.
Sorri. Há tempos eu não escrevia sem sentir fadiga e não percebia os meus olhos cansarem. Isso quer dizer que eu estou, aos poucos, conseguindo escrever novamente com a mesma alegria e força de vontade de antes.
Guardei os meus manuscritos e fui para a cama. Desliguei as luzes e respirei fundo antes de mergulhar no sono profundo.
~¤~¤~
Acordei assustado. Há muito tempo eu não tinha um pesadelo como aquele. Na verdade, desde que comecei a me entender com Elisa que eu não tinha pesadelo algum. Isso era, com certeza, um mau presságio.
Esperei o meu coração voltar a bater em uma frequência normal. Respirei fundo ao constatar que isso havia acontecido e olhei para o relógio. Eram seis da manhã. Já estava mesmo na hora de acordar.
Levantei-me e fui tomar banho. O meu corpo estava coberto de suor devido ao pesadelo que eu havia tido, mas nada tão grave que não fosse resolvido com uma ducha. Vesti alguma coisa confortável e fui fazer o meu café da manhã. Depois eu fui para a Editora, para mais um dia de labuta.
~¤~¤~
- Você está estranho. - Elisa disse. Suas sobrancelhas estavam franzidas e seus olhos me fitavam com desconfiança. - O que houve?
Eu não queria contar para Elisa a respeito do pesadelo que tive. Não queria lhe trazer mais preocupação além das que ela já tinha. Não seria justo.
- Não foi nada. - respondi, desviando o meu olhar de quem escondia algo do olhar dela de quem não acreditava nem um pouco na minha desculpa esfarrapada.
- Fernando, não tenta me enganar apenas para me poupar. - ela respirou fundo e fez com que eu olhasse para ela novamente. - Nós prometemos que o nosso relacionamento seria baseado na verdade, lembra? Sem segredos.
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Dê-me amor
RomansaFernando Garcia é um escritor que já fora famoso, mas agora, devido à toda a sua crise de bloqueio criativo, que já dura nada mais que cinco anos, se vê falido, afundado em dívidas e no álcool, seu atual companheiro a quem confia suas mágoas e princ...