"O que acontece às 3 da manhã"

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"Como filha? Porque é que vais voltar?" Perguntou admirada.

"Não estou a conseguir adaptar-me tão bem como esperava, e as aulas todas em inglês não estão a ajudar e... é tudo demais. Acho que no início fiquei deslumbrada e quis mesmo tentar ficar aqui, mas agora, já passou o deslumbramento e tenho saudades de casa! Não quero mais ficar aqui... por favor mãe... deixa-me voltar."

"É claro que deixo filha. Mas pensa bem... podes estar apenas um pouco assustada, numa fase mais complicada... não quero que tomes a decisão errada. Mas eu nunca te iria impedir de voltar."

"Desculpas-me se eu ficar um ano atrasada nos estudos? Não sei se ainda vou a tempo de entrar para alguma universidade aí... mas duvido muito..."

"Claro filha... eu já sabia que corria o risco de isto acontecer quando tu foste. Mas tens mesmo a certeza que não é só uma fase?"

"Tenho mãe... eu quero voltar para aí o mais rápido possível. Vou anular a matrícula amanhã, e ainda hoje vou comprar os bilhetes para o próximo voo para Lisboa."

"Não... não anules a matrícula... deixa estar."

"O quê? Porquê?"

"Porque sim... deixa estar pelo menos este mês. E não faças a desistência da bolsa... quem sabe tu não mudas de ideias e se fazes as desistências, já não podes voltar mesmo que queiras."

"Eu não vou querer voltar, mas ok. Eu não desisto ainda."

"Filhota... pensa bem."

"Já pensei mãe. Eu vou mesmo voltar."

"Eu confio nas tuas decisões. Faz o que entenderes."

"Obrigada mãe... beijinhos."

"Beijinhos filha." Desliguei.

Sim, eu tenho a perfeita noção que menti descaradamente à minha mãe. Tenho a perfeita noção de que não o deveria ter feito. Mas porra... o que é que eu podia dizer-lhe? Que quero voltar porque a ex-namorada do meu namorado está à espera de um filho dele? E que o meu ex-namorado, que não chegou a ser namorado, teve um acidente, ficou em coma e agora está com amnésia e não se lembra da forma rude e estúpida como o tratei e que isso me faz sentir muito, mas muito mal. 

Digo-lhe que me sinto perdida, porque perdi o meu pilar? Perdi o que mais me segurava aqui, e o que me mantinha em pé. Perdi o que me fazia acordar todos os dias com um sorriso na cara. Perdi tudo o que tinha aqui. Simplesmente perdi.

E eu sei que já tinha pensado mais vezes que o tinha perdido, mas no fundo, sempre houve aquela chama de esperança acesa, porque no fundo sempre soube que havia qualquer coisa nele que me dizia que acontecesse o que acontecesse íamos ficar juntos. Mas a vida trocou-me as voltas... e de que maneira. 

Bem... agora falta dizer à Kylie. Liguei-lhe. 

"Kylie? Podes ir-me levar de novo ao hospital? Desculpa tanto incomodo."

"Não há problema Jo... eu faria o mesmo no teu lugar. Mas fazemos assim, eu dou-te a chave do carro e tu vais e vens quando quiseres. Porque eu sei que o carro te vai fazer mais falta que a mim."

"Não podes mesmo ir comigo? Só mais esta vez... eu queria falar contigo. É muito importante."

"Passa-se alguma coisa? O Tyler piorou?"

"Não...eu só preciso mesmo de falar contigo..."

"Ok... apanho-te em 15 minutos. Ok?"

"Está bem." Desligou.

Liguei o computador, entrei no site de viagens, e comprei um voo para amanhã. A minha aventura americana acaba exatamente daqui a 26 horas. O tempo que falta para o voo.

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