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Camisa branca fechada até ao último botão: check. Gravata vermelha: check. Saia de pregas vermelha e azul marinho: check. Meia 3/4 branca: check. Ténis branco: check. Casaco azul marinho: check. Cabelo loiros presos sem nenhum fora do lugar: check. O mínimo de maquiagem: check.


-Katerina.

-Já vou mãe. - Gritei de volta ou em segundos teria aquela mulher a abrir a porta e a dizer o quão enrolada sou para me arrumar. 


Mas vejamos, primeiro sou mulher, logo demoro sempre e, segundo, preciso conferir se tenho tudo na minha mochila para a pequena transformação de todas as manhãs. Ou acham mesmo que vou feito uma freira para as aulas?

Desci as escadas devagar porque se a minha mãe me visse a correr por elas abaixo dar-me-ia um sermão. Leonard e Amélie, meus irmãos, já estavam na mesa a tomar o café da manhã. Mas o lugar de papai estava vazio.


-O pai? - perguntei à minha mãe que nem se prezou a tirar os olhos daquela revista ridícula sobre cirurgias plásticas para me responder.

-Foi para a clínica, hoje chega o novo psiquiatra.


O meu pai, Andrew Ashcroft é médico geral, dono de uma das melhores clínicas privadas de Londres. Já a minha mãe é uma socialite. O que é isso? Também não sei, mas com certeza é alguém que não faz nada, vive às custas do marido e passa a vida em grupos da alta sociedade a falar dos outros. Nas horas vagas cuida dos três filhos e o seu passatempo preferido é fazer de mim a sua versão mais jovem, mas adivinhem? Eu não faço uso de nenhuma das suas regras quando estou fora de casa. É, essa é a minha mãe. Tiffany Ashcroft, ex-modelo.


-Já lhe disse para comer devagar Katerina. - repreendeu-me com um olhar deveras assustador.

-Desculpe mãe. - parei de comer a salada de fruta e foquei-me apenas em beber o café quente com aroma de canela que a Pietra fazia todas as manhãs.

-Melhor irem, o Zach está à vossa espera no carro, não vão chegar atrasados no primeiro dia de aulas. - falou autoritária como sempre. Amélie deu um sorriso cínico, ela era a cópia de mamãe e ela nem se esforçou para a tornar assim, parece que está nos genes.


Peguei na mochila e Leonard acompanhou-me. O meu irmão tem 12 anos, eu 17 e a Amélie, 18. A única universitária da família, estuda moda para alegria da mamãe. Eu estou no último ano do ensino secundário e não sei o que cursar na faculdade daqui a um ano, mas até lá tenho muito para me divertir ainda. Zach abriu a porta do carro com o seu sorriso simpático de todas as manhãs. Sei que é sincero, ele prefere perder parte da sua manhã a levar-nos ao colégio do que a levar mamãe para os seus compromissos inúteis.

Eu não odeio a minha mãe, não me interpretem mal, mas não posso dizer que é o ser que mais amo no mundo. Ela mesma fez questão que assim fosse. Em casa sou a filha queridinha que obedece e, fora dela, sou aquilo que quero ser, o oposto do que a minha mãe gostaria que eu fosse.

Deixo Leonard sair do carro e peço que Zach o leve ao portão enquanto começo a minha pequena mas marcante transformação.

Cabelos soltos, bastante rímel e lápis preto, saia um palmo acima do joelho, primeiros botões da camisa aberta, gravata frouxa e, para finalizar, o meu inseparável batom vermelho. É exagerado? Poderia ser se não se tratasse de mim, Katerina Ashcroft, mais conhecida como a garota que tem todos os rapazes aos pés, a garota que ninguém ousa ser inimiga e também conhecida pelas más línguas como a bitch. Não me importo, ao menos tiro proveito disso e de quebra, esqueço completamente dos ensinamentos da minha mãe sobre como ser uma dama da alta sociedade londrina.

Nana, who are you? || L.T. ||Onde histórias criam vida. Descubra agora