Me sentei em um banco afastado debaixo da árvore, ficando longe do pequeno mar de alunos que já se preparava para ir embora. Eu ainda não acreditava que tinha acabado de ter aquela conversa, muito menos que consegui ser tão calma e controlada. Marisol tem razão, sou uma pessoa estranha na maior parte do tempo, minhas ações fogem do meu controle com facilidade.
Encarei as teclas do meu celular e fiquei girando meus polegares. Geralmente quando eu estava triste ou chateada, mandava um texto desabafando com Dimitri, o que ele me respondia com outro texto me dando conselhos para logo depois me distrair, fazendo com que eu risse muito. Há dois anos atrás era sempre para Marisol, Alexandra ou até mesmo Bianca a quem eu recorria quando estava assim, mas pouco antes da minha viagem para a Itália, eu e Dimitri tínhamos nos aproximado bastante, fazendo com que ele se tornasse meu melhor amigo. Não importava se eu mandava textos enormes que eu tinha certeza que o deixavam com preguiça ou se apenas implicava com ele, acabou por se tornar a pessoa a quem eu sempre procurava.
Ele nunca insistia no assunto e nem perguntava mais do que eu queria falar, me deixava a vontade para desabafar e apenas ficava do meu lado se isso era tudo que eu precisava. Geralmente apenas uma mensagem e um pouco de conversa me deixava bem, mas hoje eu estava tão inquieta com tudo que tinha acontecido, que apenas isso não parecia suficiente. Desbloqueei o celular e disquei o número de Dimitri, chamou três vez antes que ele atendesse.
-E ai mocinha? - falou sorrindo.
-Oi Dimi. - falei colocando meu cabelo atrás da orelha. - Você ta indo embora agora?
-Porque?
Revirei os olhos, lá vem ele.
-Custa responder?
-Custa. - falou segurando o riso. - To indo pro estacionamento agora. Tenho que ir mais cedo porque Tio Rodrigo quer que eu lave o bar hoje.
-Ahn... Posso ir com você? - perguntei.
-Porque?
-Argh... Pra que tanto por que? - perguntei irritada.
-Porque quero saber, ué.
-Posso ir ou não?
-Porque você quer ir?
Respirei fundo, me controlando. Se estivéssemos juntos agora, eu o chutaria com toda a força.
-Sério Dimitri? - perguntei torcendo a alça da minha bolsa. - Você é pago pra me irritar ou faz isso por esporte?
Ele pareceu pensar.
-Seria bom receber por isso, mas faço por diversão mesmo.
Bufei, irritada.
-Relaxa.
-Odeio quando fala isso.
Ele riu.
-Me encontra lá na minha moto que vou arrumar um capacete pra você.
-Um bem resistente. - falei, não perdendo a chance de provoca-lo. - Quero viver por um bom tempo ainda.
Eu tinha certeza que ele estava fazendo sua costumeira cara de tédio.
-Imbecil. - falou sorrindo.
-Idiota. - respondi e desliguei o celular.
Me levantei e peguei minhas coisas indo para o estacionamento. Fiquei rodando de um lado para o outro por uns dez minutos e não achei nem sinal da moto de Dimitri, o que me fez pensar que ele devia tê-la deixado bem escondida ou estava curtindo com a minha cara. Me recostei em um carro, já frustrada de tanto procurar e um tanto irritada.
-Vai acabar sendo atropelada se ficar parada ai atrás do carro. - falou uma voz atrás de mim.
Dei um pulo quase esbarrando na porta aberta de outro carro enquanto Dimitri se acabava de rir. Levei uma mão ao peito enquanto respirava fundo para me acalmar, eu não sabia que tanta graça as pessoas achavam em me assustar.
-Não faz isso criatura!
-Não fiz nada. - falou erguendo as mãos com os dois capacetes. - Era você que tava vegetando ai.
Dei um tava em seu peito que acabou não tendo resultado nenhum.
-Não tava vegetando. - falei arrumando a bolsa em meu ombro. - Tava procurando você.
-Falei pra me esperar na moto.
-Se eu tivesse achado sua moto talvez eu esperasse lá.
-Ah... Verdade, esqueci de contar pra você que troquei de moto. Foi mal.
-Depois sou eu que vegeto. - resmunguei enquanto o seguia.
Dimitri usava uma jaqueta de couro preta e uma de suas camisetas favoritas, uma preta com desenhos brancos com uma frase do Pink Floyd, jeans escuros um pouco esfolados e um All Star que parecia novo. Sua variante de visual tinha mudado um pouco desde a última vez que tínhamos passado um tempo juntos. Seu cabelo estava sendo balançado de um lado para o outro por causa do vento e ele toda hora passava a mão para arrumá-lo, aquilo já era basicamente um hábito.
-Porque ta me olhando assim? - perguntou.
Pisquei, reorientando meus pensamentos e notei que ele me encarava com uma expressão intrigada.
-Ta precisando cortar esse cabelo. - falei.
Ele bufou e me jogou um capacete preto.
-Deixa meu cabelo em paz.
Ergui as mãos em rendição enquanto parávamos ao lado de uma linda moto preta, que eu tive que olhar duas vezes para ter certeza de que era a que eu estava pensando. Dimi colocou o capacete e subiu na moto, arrumou a bolsa e olhou para mim sorrindo.
-O que foi? - perguntou.
-Desde quando você tem uma Harley? -perguntei o fazendo rir.
-Desde quando eu sou fodão.
Revirei os olhos enquanto firmava meu rabo de cavalo e colocava o capacete.
-Economizei cada centavo que sobrava do meu salário desde que comecei a trabalhar, então no meu último aniversário meus pais resolveram que eu merecia uma moto nova. - falou ligando a moto, o ronco do motor reverberando pelo estacionamento. - Um amigo do meu pai estava vendendo ela e fez até um preço menor do que estava querendo. Faz uns três meses que to com ela.
-Tudo bem então.
-Então agora dá pra parar de babar na minha moto e subir logo ai? - perguntou me encarando com os olhos brilhando de diversão. - Eu lavei ela no final de semana.
-Idiota. - resmunguei e subi na garupa.
Coloquei a bolsa no meu colo e apoiei meus pés no pedal, ajustei a fivela do capacete e olhei para frente.
-Oh Senhor... - comecei brincando. - Permita que nenhum pedaço meu fique para trás e que eu ainda possa andar quando chegarmos em nosso destino.
-Mais uma gracinha dessas e você vai ter que ir correndo atrás da moto. - resmungou.
Passei os braços em sua cintura sorrindo.
-Irritei a criança.
Sem que eu me segurasse direito, Dimitri deu a partida na moto e arrancou com tudo, meu corpo foi pra trás com a força da arrancada e se não fosse por puro reflexo, eu teria voado de costas no asfalto. Apertei meus braços envolta de sua cintura e finquei minhas unhas em seu peito enquanto sentia seu corpo tremer de tanto que ria.
-Idiota! - gritei apertando mais minhas unhas.
Ele resmungou de dor, mas o sorriso não deixou sua voz.
-Quem é a criança irritada agora?
-Odeio você. - resmunguei apoiando o rosto em suas costas.
-Odeia nada. - falou saindo do estacionamento. - Sei que me ama.
-Se te faz feliz acreditar nisso...
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Meu Último Suspiro - O início - Livro 1
Ficción GeneralDepois de passar um ano na Itália esfriando a cabeça e vivendo seu sonho de viajar para o país que sempre quis conhecer, Safira Delacur sente que finalmente é hora de voltar para casa. Mesmo atormentada por sonhos estranhos e um forte pressentimento...