11. Conversa no jardim

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No dia seguinte, acordo cedo para comparecer ao enterro, mesmo ainda desestabilizada pelo acontecido da noite anterior. A cerimônia é realizada em poucas horas, que são infelizmente suficientes para me deixar ainda mais deprimida.

Durante o enterro, observo Cameron involuntariamente. Estou tão machucada pelas coisas que ouvi, que os olhares que lanço em sua direção são mortais. Ele, no entanto, permanece firme como uma rocha e finge que nem existo.

Em dado momento, Cameron resolve recitar um poema, ao lado dos dois irmãos e da mãe. As palavras, perfeitamente declamadas por ele, comovem a multidão que participa do enterro e logo um pranto coletivo toma conta da cripta. Eu também sinto meus olhos marejarem, mas decido ir embora e voltar para o palácio.

Ao chegar, me encaminho para o quarto, deito na cama e choro. Me sinto tão oca. As últimas 48 horas conseguiram arrancar de mim a pouca alegria que habitava meu corpo e agora estou vazia. Não tenho mais forças para continuar. Quero sumir. Ir para um lugar bem longe de tudo isso, onde eu possa ser eu mesma, sem as máscaras e os protocolos.

Eu quero meu pai de volta.

Meu mundo sem ele é preto e branco, em desfoque. E eu detesto tudo isso. Detesto a ideia de nunca mais poder vê-lo ou ouvir seus sábios conselhos. Detesto o fato de que nunca mais rirei de suas piadas sem sentido, passearei pelos jardins de Riverwinter ao lado dele ou receberei os elogios engraçados. Detesto saber que ninguém me entenderá como ele entendia. Detesto lembrar que o perdi para sempre.

Essa ebulição de sentimentos fica acontecendo dentro de mim por alguns minutos, até que alguém bate à porta do quarto. Enxugo as lágrimas em desespero, controlo minha respiração e vou atender. Ao abrir a porta, me deparo com a rainha Laurie. Ela está inteiramente vestida de preto e tenta disfarçar os olhos inchados com seu típico sorriso simpático.

— Bom dia, princesa. — ela diz, sem deixar o sorriso vacilar. — Ou devo dizer boa-tarde, a julgar pelo horário? — Solta uma risadinha. — Bem, só vim até aqui perguntar como a senhorita está e exigir que passe este dia conosco. O Dallas Hotel continua cheio de repórteres, sabe? Exposição em um momento como o que estamos vivendo não é nada bom. A imprensa quer só um deslize.

— Tudo bem. — digo, apavorada demais para negar o pedido da rainha. — Passarei o dia aqui no palácio.

— Ótimo! — Ela bate palmas, ainda esboçando o sorriso simpático. — Daqui a alguns minutos mandarei uma criada vir chamá-la para o almoço, que será peru ao molho de cranberry. O prato favorito do Charlie.

Como em automático, a tristeza transparece nitidamente no olhar da rainha, mas ela disfarça, pedindo licença e saindo. Observo-a desaparecer pelo corredor e depois fecho a porta do quarto. De imediato, caminho até o telefone dos aposentos e ligo para a minha mãe. Ela atende depois de dois toques e a melancolia em sua voz é visível. Tento manter uma conversa que não envolva a morte do meu pai, mas depois de dois minutos estamos as duas chorando, sem dizer nada.

A choradeira perdura até o momento em que a criada bate à porta. Me despeço de minha mãe com a voz embargada, enxugo o rosto e saio do quarto. A mulher me acompanha até o salão de refeições e, quando o porteiro abre as portas para mim, torço para que eu não esteja com a cara inchada. Cameron, Cristal e Leonard estão sentados à gigantesca mesa do cômodo, conversando animadamente. Seus olhos avermelhados e inchados estão visíveis, obviamente, mas os três parecem querer esquecer um pouco o luto.

Tento me aproximar silenciosamente, mas os irmãos logo percebem minha presença e param de conversar. Sob três pares de olhos, puxo uma cadeira e sento. O silêncio toma conta do ambiente. De cabeça baixa, fico encarando minhas mãos, já que além de não ter intimidade suficiente para começar uma conversa com Cristal e Leonard, olhar para Cameron está fora de cogitação.

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