No sentido não Contábil (Final) - Parte 02

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Ainda por Túlio... 

De fato, uma verdade universal é: nada como um dia após o outro.

Às seis horas da manhã seguinte levanto-me para correr na praia. Repetindo isso por uma semana, permitindo que cada passo na areia descarregue minha negatividade e cada música me transporte há uma fase do meu amor por Braz. 

Suado e cansado, sento-me na areia e no fone toca um som que me traz ao presente solitário: Dust in the Wind. Não acredito que meu amor está no passado, que eu e Braz somos poeira ao vento ou que somos duas gotas de água no mar, cujas ondas lambem meus pés descalços.

Alguém arranca um fone do meu ouvido.

- Braz...?

- Cansado de correr sozinho? Está atrasado para o seu trabalho, homem. Tem seis dias que fico te olhando lá do carro.

- É... Pedi demissão há seis dias. Não dava mais.

- Ihhh, vai começar a atrasar contas... – Ele fala com ares de riso. – Você está bem e como estão as crianças?

Eu seguro o que posso sem olhar na cara dele, pois meus olhos vertem lágrimas de saudades sua.

- Estão bem?

- Chorando de arrependimento pelo Camilo?

- Por nós. – Respondo sem vergonha. Não tenho vergonha em admitir que ainda amo e queria voltar com ele. Mas ele não quer.

- Nós ainda existimos para você?

- Sim. Mas respeito sua decisão, por nós dois. Bola pra frente...

- Vem trabalhar comigo... é sério, não é apenas a questão de salário, tem a confiança minha no seu profissional... Morar junto eu não vou insistir, porque acho que ter privacidade é bom, mas pelo menos aceita minha oferta. Túlio...

Não consigo responder, já conheço o significado dessa fala suave e embargada.

- Braz... Eu aceito morar com você.

Dois barbados... um com trinta e nove e outro com trinta e seis anos, olhando para o mar e com lágrimas escorrendo pelas faces, assim nós voltamos e nem mesmo trocamos um beijo na hora ou desataríamos em choro convulsivo. Deixamos de ser a poeira no vento e voltamos a ser o casal cheio de imperfeiçoes perfeitas decididos a morar sob um mesmo teto, sabe -se lá até quando.

- Ah, Braz eu te amo tanto... Mais tarde vou te dar uma coisa. – Brinco sorrindo e chorando e tentando quebrar o gelo, pois não somos estranhos um ao outro e ainda nos desejamos.

- Já me deu... a melhor coisa que podia ganhar. – Ele não aguenta e me abraça.

Nós dois abraçados deitamos na areia, eu apoio minha cabeça em seu peito sem medo de nossa exposição ser motivo de alarido, como ele diz. Eu faço boxe e se precisar socar a cara de alguém, lavo minha alma dessa vez e Braz, com seu tamanhão e cara de macho bravo não encoraja a ninguém de meter-se a besta.

- Não vai ser um mar de rosas viver comigo, ursão. Sou chato.

- Me diz algo que não sei. Au... – Dou um beliscão na cintura dele e ajudo-o a se tocar.

- Ah, eu tenho um segredo...Te dou um soco se der risada. Quando eu era criança mandei uma carta para o Show da Xuxa. - Conto sério porque sei que ele vai rir.

Ele riu meia hora, até passou mal, recomeçando a rir cada vez que eu tentava lhe falar sério.

- Porra Túlio, não quer que eu ria, não me diz mais nada da sua infância senão dou risada mesmo. – Ele diz quando para de rir.

Ativo e Passivo - No sentido não contábil - ORIGINALOnde histórias criam vida. Descubra agora