28. No Mundo da Noite

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Gritos. Sangue. Morte.

O brado de centenas de vozes rumo à vitória era extasiante, elfos machucados e com múltiplos ferimentos gritavam a plenos pulmões no ar empoeirado das Minas de Khazad-dûm​, comemorando o que, por ora, estava acabado. Os orcs estavam mortos, massacrados após o ataque dos elfos de Valfenda e Lothlórien. Mas haviam muito mais criaturas em Moria, então aquela vitória duraria pouco se eles não saíssem daquele lugar o mais rápido possível.

Alariën, no entanto, não ouvia nada. Não via nada além de sua mãe que deslizava para o chão bem à sua frente, uma adaga presa à barriga, um olhar espantado no rosto normalmente sereno. Alariën gritou, mas nem ela mesma conseguia ouvir sua voz. O desespero latejava em seus ouvidos, ocupava cada canto de sua cabeça, impossibilitando-a de prestar atenção em qualquer coisa que acontecesse ao seu redor. Tauriel quase bateu a cabeça no chão quando Alariën saiu de seu torpor e correu para segurá-la.

- Mãe! - gritou ela novamente, e de novo, e de novo. O sangue se espalhava como um mar vermelho, as mãos de Alariën logo ficaram encharcadas. Tauriel fez um mínimo sinal em direção a adaga, como se implorasse para tirá-la dali.

- P-por... - gemia ela. Alariën sentiu lágrimas quentes descerem. Estava prestes a tentar tirar a adaga quando o rei Thranduil chegou ao lado dela, seu rosto estava mais branco que um pedaço de papel. Ele logo entendeu o que Tauriel pedia e tomou o lugar de Alariën: puxou a adaga forte e rapidamente, fazendo Tauriel gritar tão alto que chamou a atenção de todos que ainda não tinham notado o que havia acontecido. O sangramento piorou, um rio de sangue jorrando pelas mãos de Thranduil.

- Alariën, arranque uma tira de pano e me entregue - Thranduil disse com a voz contida. - Agora!

A elfa se levantou automaticamente, como se não estivesse pensando no que fazer, e olhou ao redor, procurando o que o rei pedira. Havia um elfo, deitado ali perto, os olhos arregalados para o céu noturno, que usava uma capa atada às costas. Alariën correu para ele e puxou com pressa a capa inteira, murmurando um pedido de desculpas mesmo sabendo que ele não a ouviria.

Thranduil tentava conter o sangramento com as mãos, mas era impossível. Tauriel arfava, sua respiração ficando cada vez mais fraca; ela desmaiaria a qualquer momento, ou pior. Alariën chegou com o pano e Thranduil puxou de sua mão, quase rasgando o frágil tecido. Ele rapidamente colocou em cima da barriga da elfa, pressionando com força. Tauriel suspirou. O sangramento, por ora, parecia ter diminuído devido à pressão exercida pelo rei na abertura do corte.

Alariën sentou-se, ainda sem tirar os olhos da mãe. Suas mãos estavam escorregadias, o rosto marcado de lágrimas e sangue, fios de cabelo grudando em sua pele por causa do suor. Tauriel agora estava branca, mais pálida do que Alariën jamais a vira, mesmo quando ela estivera doente. Thranduil, ao seu lado, não dava espaço para o desespero: se concentrava inteiramente no que fazia, nada ao seu redor era capaz de tirar sua atenção de Tauriel. Alariën não pôde deixar de se sentir impressionada com o Rei Élfico. Sua mãe uma vez lhe confidenciara o quanto eles foram apaixonados antes de Elwën nascer, e isso fora há tanto tempo... Mas ali estava ele, olhando para ela como se nenhum dia tivesse passado.

- O que mais posso fazer? - ela perguntou ao rei. Thranduil olhou-a pela primeira vez desde que começara a cuidar de Tauriel.

- Arrume suas coisas. Não leve nada que não seja necessário. Precisamos sair daqui e ainda temos que carregar sua mãe.

Alariën assentiu, ainda no modo automático e se levantou. Não tinha notado que suas pernas doíam terrivelmente, e quando ela se pôs de pé, quase caiu. Ela se apoiou na parede e respirou fundo, a dor era horrível. Mas eles de fato precisavam sair dali. Engolindo um gemido, Alariën começou a procurar suas armas.

A FILHA DE VALFENDA - Contos da Terra Média (Livro 2)Onde histórias criam vida. Descubra agora