13. Sangue Foi Derramado

231 21 1
                                    

- Mãe. - sussurrou. Não soube por que o fez, as palavras simplesmente escaparam de seus lábios. Ali, naquele lugar de escuridão e medo, a última coisa que ela faria se estivesse sã seria chamar pela mãe. Seus lábios rachados e pálidos se abriram com esforço para mais um apelo.

- Mãe. - repetiu, sabendo que ninguém a ouviria. Apenas o som da sua voz interrompia o silêncio mórbido que dominava o cômodo fechado durante todos os dias. Seus ouvidos zumbiam, sua cabeça latejava e ela sangrava de um ferimento na perna ao ter caído da escada. Todos os dias, ao acordar, Alariën se perguntava como ainda estava viva.

Talvez porque ela ainda queria viver. Ou talvez o motivo de ter vindo até ali fosse tão importante que não poderia se dar ao luxo de morrer depois de tudo que vivenciou durante o trajeto até as minas de Moria. Ou talvez tivesse uma tênue esperança de que seria resgatada, que sairia daquele lugar para nunca mais voltar. Não conseguia encontrar a resposta, por mais que refletisse sozinha e abandonada.

Alariën levantou a cabeça e olhou para todos os lados, como um animal assustado. Ouvia passos à distância, aproximando-se com rapidez. Seu corpo inteiro se pôs em alerta, e ela recuou até encostar à parede. Os pulsos e tornozelos doeram insuportavelmente quando ela se moveu; enormes correntes a prendiam ao chão, e eram tão apertadas que machucavam sua pele ao mínimo movimento.

A porta de ferro se abriu estrondosamente, e a luz amarelada do fogo iluminou o aposento. A claridade queimou os olhos de Alariën; depois de tantos dias sem ver um fiapo de luz, era quase como se estivesse tentando encarar o sol. Cobriu os olhos com a mão, provocando dores por todo o braço; um ruído de dor escapou da sua garganta quando ela fez força para não gritar.

- Está na hora. - a voz do orc provocou arrepios na elfa. Ainda não conseguia vê-lo, mas sentiu quando ele quebrou as correntes que prendiam suas pernas com um machado. Sentiu o sangue escorrer pela perna até o chão. Quis mover-se, impor mais distância entre si e a criatura, mas não conseguiu mover um centímetro. Permaneceu parada, enquanto o orc quebrava cada corrente com um machado. Puxou a mão que ela cobria os olhos sem piedade, e a luz incidiu sobre seu rosto novamente. Dessa vez, conseguiu abrir os olhos e vislumbrou a porta escancarada, do outro lado.

Quando a última corrente foi quebrada, o orc a puxou pelo braço. Suspendeu-a por um segundo, mas seu corpo fraco desabou no instante seguinte. Alariën caiu de costas, o que foi um alívio. O orc começou a impacientar-se. Desembainhou uma espada guardada às costas e encostou à barriga da elfa, num aviso silencioso. Apesar de toda a dor, Alariën levantou-se hesitantemente.

Os pés da elfa mal conseguiam sustentar seu peso, ainda que o orc a segurasse firme pelo braço direito. Empurrou-a, e Alariën começou a pôr um pé à frente do outro, mordendo o lábio com força. O gosto de sangue invadiu sua boca, e por um momento ela lembrou-se do por que estava naquele lugar. Havia alguns momentos de torpor em que ela simplesmente se esquecia de tudo, até do próprio nome. Não duravam muito, e logo todas as memórias voltavam para atormentá-la.

Alariën piscou diversas vezes quando saiu do cômodo e o orc fechou a porta atrás de ambos. Estava num salão imenso, com teto alto e paredes de mármore cinza. A tocha só iluminava uma pequena parte do salão, por isso Alariën não conseguia ver o que estava mais à frente.

- Onde estamos? - perguntou, e surpreendeu-se com a voz rouca que saiu da sua boca.

- Cale-se - disse o orc, chamado Golt, rindo.

Após fechar a porta, Golt voltou a empurrar Alariën, conduzindo-a até uma passagem do lado esquerdo. Ao longe, Alariën reconheceu a escada até sala em que esteve quando tentou fugir e foi capturada. A sala com a luz branca que incidia sobre o centro do cômodo. Um forte tremor percorreu todo o seu corpo, sua mente processando todas as informações rapidamente.

A FILHA DE VALFENDA - Contos da Terra Média (Livro 2)Onde histórias criam vida. Descubra agora