22. Uma Despedida Fúnebre

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Lothlórien, hoje

O corpo estava preparado. Os elfos já estavam em seus postos. Tudo estava pronto; menos Alariën.

Fora ideia dela de enterrarem o corpo de Thrain na terra de Lórien, pois não podiam sair dali para mais nada; ainda assim, era seu desejo que o amigo tivesse um funeral digno de sua pessoa, e foi a primeira coisa que pediu a Galadriel quando tivera tempo de se encontrar com ela. Alariën disse à Senhora que tinha consciência da gravidade da situação que lidavam, mas não suportava saber que Thrain não teria uma despedida decente. Galadriel concordou inteiramente, e um dia depois, o corpo de Thrain descansava sobre um grande bloco de pedra retangular improvisado enquanto esperava o início da cerimônia. Mas Alariën ainda não conseguira se preparar de fato para aquela ocasião.

Durante todo o dia, Alariën evitava imaginar sobre o momento que veria o corpo de Thrain, o corpo que ela feriu, embora não fosse sua intenção. Ela ainda não o vira, pois quando o trouxeram, antes dela chegar de Moria, ele tinha permanecido num local escondido que nem Thranduil tinha conhecimento. Essa seria a primeira vez em que ela o veria morto, assim como todos de Lórien, apesar de Alariën duvidar de que eles se sentiriam da mesma forma que ela.

Alariën se levantou cedo, acompanhando os primeiros raios de sol que atravessavam sua janela, e apesar do dia estar glorioso, seu coração não podia estar mais pesado. Ela demorou-se na cama, encarando o teto, seu único desejo era permanecer ali o dia inteiro, se pudesse.

Subitamente, Alariën ouviu o barulho da porta se abrindo, e ao olhar, surpreendeu-se com a visão de Galadriel adentrando seu quarto, o longo vestido dando voltas atrás de si. O calor que a Senhora emanava chegava a ser reconfortante, e o ambiente não parecia mais tão pálido e frio como estivera há apenas alguns segundos. Alariën apressou-se a sentar e encarou a Senhora, sem saber o que dizer.

- Não precisa de reverências quando estamos sozinhas. Somos amigas - Galadriel sorriu-lhe. Alariën tentou dar um sorriso e voltou a sentar-se na cama, acenando para que a outra sentasse ao seu lado.

- Como está se sentindo? - Galadriel perguntou com cautela. Alariën sacudiu os ombros. Não tinha vontade de falar, mas não podia ignorar uma pergunta de Galadriel. Mesmo que ela não fosse a Senhora de Lothlórien, Galadriel tinha o hábito de fazer com que todos ao seu redor se sentissem calmos e seguros e, às vezes, fazia com que Alariën quisesse despejar todos os seus sentimentos e pensamentos.

- Não sei, exatamente - Alariën começou. - Não sei por que estou me sentindo assim, para começar. Eu não o conhecia direito, isto todos sabem. Mas...

Ela não conseguiu terminar de falar por falta de palavras. Galadriel completou por ela.

- Tudo o que sente está resumido em uma única palavra: culpa. Você não o conhecia, no máximo sabia o seu nome, mas sua mente acha que por sua causa ele está morto, e isso está lhe devorando por dentro. Não tivemos tempo de conversar direito com tudo o que está acontecendo, e quero pedir perdão por não ter parado e ouvido você. Se eu tivesse lhe contado tudo o que realmente aconteceu, você não estaria desse jeito. Não tenho como impedir que você se sinta culpada, mas preciso que saiba que isso não é verdade. Você não teve escolha. Você teria morrido se tivesse se negado a matá-lo, sabe disso. Os orcs queriam uma diversão, e não havia nada que pudesse fazer.

Alariën balançou a cabeça. - Eu fui fraca. Covarde. Eu teria morrido no lugar dele, mas estava apavorada demais pra pensar... eu deveria estar morta, e ele vivo...

Galadriel aproximou-se e enxugou as lágrimas que turvavam a visão de Alariën. Os soluços da elfa preencheram o quarto por instantes, a Senhora abraçando-a e afagando seus cabelos.

A FILHA DE VALFENDA - Contos da Terra Média (Livro 2)Onde histórias criam vida. Descubra agora