— E como você está hoje, Sol?
Dou um meio-sorriso e agito os balões no ar.
— Bem. Eu disse que amava meus pais, eles disseram que também me amavam...
Olho para o lado.
— Lua? — chamo. — Onde você está? Eu ainda não acabei!
Dou um suspiro. Ela tinha voltado tão cedo dessa vez...
— Mas, sabe... — continuo. — Eu não me senti amada. Talvez seja questão de tempo, né?
Dou uma risada e solto um balão no ar.
— Estamos quase lá, vovó. Quase lá...
O balão dessa vez era vermelho. A cor do batom que ela usava. Tão intenso quanto ela. Anoto no caderninho:
99° balão para a vovó Lua.
E aquela foi a última vez que a Lua veio me visitar. Eu aprendi a coragem das estrelas.
Nessa de ir e vir, eu sempre escolhi ficar.
Mas as pessoas vão. Elas chegam, despertam o melhor de ti, e vão embora, do mesmo modo que chegaram. E a vida segue, independente de estarmos bem ou não.É nosso dever aprender com os ensinamentos que ela tem para nós. Não que isso nos poupe de novas decepções e, quem sabe até maiores. Mas, talvez, nesse ciclo vicioso de pessoas, lembranças, amores, taças de vinho e uma música triste, a gente até encontra um pouco de si. E possa achar um lugar para fazer morada.
Há dias em que parece que meu peito vai explodir e eu não sei bem dizer porquê. Talvez pela falta, ou medo, ou os dois.
Todos os dias eu subo os dez degraus do quintal até a sacada e me escoro na janela às cinco e meia da tarde para ver o sol se pôr, na esperança dos últimos feixes de luz do céu ainda quente, se incorporarem ao meu corpo. Eu fecho os olhos, me concentro e ouço o som dos carros passando, numa tentativa de cobrir o vazio e o silêncio que toma conta dos dias, e sinto as buzinas ecoarem e fazerem meu corpo vibrar pensamentos desordenados.
Eu encosto meu rosto no vidro do carro, e as árvores passam num acompanhar de olhos. Todo dia da janela eu vejo toques evaporando no meio da multidão, sei lá eu pra onde. E eu admito que mesmo assim, aqui de cima ainda durmo com medo deles me invadirem e me machucarem.
Mas tudo bem. Feche os olhos.
Haverão outros, e eles poderão ser mais gentis ao te tocar, repito baixinho.
— E por fim — concluo — acredito que amor na teoria é bonito. Mas é a prática que define.
Ele sorri. O Marcelo.
— Nossa, você tem uma cabeça muito da hora.
Dou uma risada.
— Isso é bom, não é? Quer dizer, até agora você tem sido gentil o suficiente comigo para merecer a minha sinceridade. E é isso o que eu penso. Embora às vezes até eu duvide de que meus sentimentos são verdadeiros e que realmente é amor, sei que isso não pode ser forçado. E é por isso que não deu certo até hoje. Eu nunca senti de verdade.
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Menina, maré.
RomanceEstar perdida nem sempre é sinônimo de adolescência. A vida fica um pouquinho mais difícil quando temos que lidar com nossos sentimentos e com os sentimentos alheios. Essa é a minha história. Se você também anda meio machucado (a) com algo, saiba q...