Apenas Amor

Capítulo 2 / MURILO

Eu podia garantir que queria fazer parte da empresa do meu pai, tinha me esforçado muito para aquilo e continuava fazendo-o. Apesar daquele não ser meu sonho principal, havia me apegado à ideia de manter a companhia dele no auge de sempre, administrando seus investimentos, continuando a investir nas investigações que ele cuidava com tanto carinho e, claro, continuar a investir nas causas que meus pais apoiam.

A causa da qual eu nunca desistiria seria a adoção. Tinha vagas memórias sobre meus dias lá, mas sabia como aquilo tinha afetado minha vida, meu discernimento no mundo. Quando, com 15 anos, descobri que era adotado por aquela família maravilhosa, fiquei chocado, mas também muito agradecido, pois, sem eles, só Deus sabe o que seria de mim.

E claro que apoiaria a causa da minha avó materna quanto ao estupro de jovens. Não só pela minha mãe e minha tia Emily, que tinham sofrido aquilo quando ainda eram crianças, mas por todas as demais pessoas que tinham sofrido aquele crime tão brutal tanto física quanto psicologicamente.

Então, enquanto me convencia de que manter uma companhia me traria mais dinheiro que a psicologia, fui seguindo minha vida de forma que meu pai, Henrique, declarava como rebeldia. Aqueles comentários eram, por vezes, desconfortáveis, mas muito reais. Antes de começar a namorar com a Camila Soares, ficava com quantas mulheres quisesse, no momento que quisesse, onde quisesse. Minha mãe sempre dizia que eu tinha herdado aquilo do meu pai, mas que sabia que um dia eu encontraria a pessoa certa. Eles adoravam Camila, não tinha como negar, mas minha mãe, de uma forma incompreensível, acreditava que ela ainda não era o amor da minha vida, não que eu acreditasse naquelas coisas, claro.

Quando Júlia, minha irmã mais nova, completou quinze anos, mudou-se para os EUA, cumprindo o que nossos pais sempre lhe prometera: o mundo dos estudos com o qual sempre sonhara. Nos falávamos, no início de tudo, por todo meio de comunicação via internet, mas, com o tempo, os contatos foram esfriando.

Assim que saí da escola, encabecei em uma faculdade de Administração e assim que a finalizei, comecei Direito, entrando com uma bolsa cem por cento em uma concorrida faculdade do meio. É claro que aquilo encheu meus pais de orgulho, o que fez com que eles fizessem mais uma daquelas festas, como a que acontecia naquele momento no jardim de nossa casa, enquanto eu ainda encarava meu reflexo no espelho, observando minha recém tatuagem.

Meu melhor amigo Danilo provavelmente diria que era coisa de boiola, já que eu tinha feito uma tatuagem de uma flor, sem cores, só contorno, com quatro pétalas, representando minha mãe, Júlia, Mônica e minha tia Emily.

A tatuagem era pequena, ficava no topo do peitoral, próximo ao ombro esquerdo, para ficar mais próximo ao coração. Meus cabelos loiros e lisos estavam úmidos, as gotas do banho recém tomado ainda escorriam pela minha barriga, interrompendo o caminho na toalha amarrada à minha cintura. Meus olhos azuis se refletiam com a luz de fim de tarde iluminando meu quarto pela sacada.

Meu pai desaprovaria a tatuagem, minha mãe daria uma piscadela, mas... aquele gesto era uma surpresa para Júlia, a garota de cabelos vermelhos, como chamava quando criança. Fomos criados como irmãos, mas nunca nos vimos como tais; era estranho e complicado de se explicar.

Eu tinha um vínculo superprotetor com ela, daquele tipo que nenhum cara podia se aproximar, algo que fugiu do meu controle quando ela foi para tão longe. A garota me deixava pilhado de nervos desde pequenos, mas sempre insistimos em dizer que éramos e sempre seríamos grandes melhores amigos.

Meu pai compreendia aquilo, mas minha mãe sempre estranhou, de certa forma desaprovando a forma como nos tratávamos. O marido de minha tia, Bruno, que também era melhor amigo de minha mãe, dizia que aquilo ocorria desde quando éramos crianças, então eu aceitava de boa, fazendo mais alguma piada que arrancava gargalhadas de todos.