Capítulo 32 / MURILO

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O resto do final de semana passou mais sem nenhuma provação, sem Roberto para aturar, sem Alana para atormentar, sem meus próprios medos me afogando dentro de mim. Carregar a aliança perto do meu peito me ajudou a manter Júlia em minha mente e coração, ainda que ela sempre estivesse lá.

Por isso comecei a segunda-feira mais leve que nunca, sabendo que meu melhor amigo e prima tinham se acertado, decidindo por se manterem juntos e acima de qualquer proibição de Bruno. O dia na empresa seria bom, as notas das provas foram boas e lentamente eu me encaminhava para a metade daquela jornada.

Mas assim que alcancei o hall de entrada da empresa, senti tudo ao meu redor ruir. Havia muitos policiais e homens da área confidencial do meu pai assistindo as filmagens da câmera junto a um homem de terno, a recepcionista estava conversando com um policial que segurava um bloquinho de notas. Eles me olharam de relance enquanto eu pegava o elevador diretamente ao último andar, onde ficavam minha sala e do meu pai, onde eu teria de ir antes de qualquer coisa.

O hall do último andar estava igualmente agitado, ainda que tudo parecesse em seu devido lugar. As pessoas que não conversavam com policiais, cochichavam entre si, olhando-me de soslaio enquanto eu abria a porta do escritório do meu pai com um solavanco.

Nada no mundo me prepararia para a cena que se desenrolou ao meu redor. Meus pais brigavam em um canto, uma Agatha descabelada que gritava entre lágrimas contra o rosto do meu pai, que não gritava de volta, mas a gravata frouxa e os cabelos despenteados demonstravam o seu descontentamento e, principalmente, sua preocupação.

Ao nosso redor, nas paredes, penduradas em locais estratégicos e pelo chão, estavam várias fotos. Engoli em seco ao me reconhecer em quase todas e, principalmente, ao reconhecer de quando se tratava.

Quem quer que a seguisse tinha tido fácil acesso à casa durante o tempo que nossos pais estiveram fora, a prova estava ali, naquelas fotos de diversos tamanhos e ângulos. Júlia e eu nos beijando, Júlia e eu na cama, Júlia e eu assistindo aos filmes, na piscina, em seu quarto, em meu quarto, a nova corrente em meu pescoço. Júlia sozinha em seu quarto, na piscina, na cozinha, na sala, no quintal...

E todas as fotos eram em preto e branco, apenas para evidenciar as palavras pintadas em vermelho: não seria difícil pegá-la de uma vez. A frase se repetia em diversas superfícies, sobre as fotos na parede, no chão sob meus pés, no teto sobre minha cabeça, nas paredes ao meu redor, em tamanhos diferentes... as frases repetiam-se grandes e pequenas, minúsculas e exorbitantes.

Tudo ao meu redor se destruiu, a escuridão novamente rompeu o espaço entre a luz que ela me era. Os gritos dos meus pais não faziam sentido, mas o choro desolado de minha mãe pouco a pouco avançou pela neblina que meus pensamentos se tornaram.

Ainda com a boca seca, as unhas machucando as palmas das mãos, o peito apertado com o coração acelerado, eu avancei sobre as fotos e a tinta seca, indo na direção dela.

— Não deixe que nada aconteça a sua filha! — ela gritou perdida em um pranto que doía em meu peito, retumbava em minhas veias.

Quando a segurei pelos ombros, dando-lhe o conforto que precisava, ela não se afastou e nem deixou de gritar as mesmas palavras.

— Eles não podem encostar em um fio de cabelo dela, não podem, não podem — enquanto as palavras se repetiam, o som de sua voz diminuía e ela tremia entre meus braços.

Sobre a cabeça de minha mãe, encarei Henrique e soube que compartilhávamos da mesma raiva

Quem quer que fosse, quem quer que ousasse, acabaríamos com sua vida por ameaçá-la e tê-la tão perto.

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