EPÍLOGO

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Dois anos depois

JÚLIA

Gostaria de dizer que a partir do momento em que me vi livre da perseguição, também me vi livre do trauma. Mas não.

Infelizmente a realidade não foi assim.

Mesmo depois de frequentar regularmente todas as sessões de terapia, depois de todos os desabafos, as explosões, os tratamentos, ainda havia momentos em que me pegava olhando ao redor, verificando se não havia mesmo alguém à espreita.

Às vezes o medo me pegava no meio de uma risada, transformando o doce som em um momento de suor e calafrios, me arrancando até aquele momento conquistado com tanta dificuldade.

Gostaria de dizer que, nesse meio tempo, Murilo e eu fomos inseparáveis, que fomos um casal apaixonado e exemplar.

Mas também não foi assim.

As brigas eram mais frequentes que os bons momentos nos nossos primeiros meses juntos e tudo apenas se resolveu meses depois, quando decidimos morar juntos, focar em nossos estudos e simplesmente compartilhar a vida.

Esse momento, essa decisão, transformou nosso relacionamento e vidas.

Agora as pessoas cochichavam por onde passávamos, tanto na empresa da família quanto no meio da própria família. Mesmo após anos e incontáveis situações, isto não tinha mudado... e não tinha esperança de que mudasse.

Suspirei, verificando o vestido branco em frente ao espelho, atrás de meu ombro direito estava Mônica, seus longos cabelos lisos presos em um coque firme, ainda que uma mecha castanha insistisse em ficar em frente aos seus olhos; atrás de meu ombro esquerdo estava minha mãe, agora com os cabelos novamente loiros, mas curtos, seu vestido vinho se destacava no reflexo, enquanto ela fechava os milhares de botões do vestido de noiva.

-- Nunca entendi para que tantos botões se depois o noivo vai arrancar de qualquer forma...

— Olívia! — censurou minha mãe, provavelmente nada acostumada com a cena que a frase criava em sua cabeça.

Alana, deitada em seu colo com um vestido rosa-bebê como os das demais madrinhas, riu do comentário, recebendo um sorriso da namorada.

— Prontinho — suspirou minha mãe ao fechar o último botão.

Nossos olhares se encontraram pelo reflexo do espelho e ela sorriu.

Atrás de todas nós estava uma das últimas cartas da minha mãe biológica, mas, até aquele momento, não sentia aquele ímpeto insano de ganhar mais algo dela... eu só queria estocar mais novas palavras, para ter a sensação de que ela estaria comigo... com o tempo também passei a aceitar seus erros e compreender que eles não me definem. Sou uma pessoa diferente, mereço estar aqui, mereço ser amada por essas pessoas.

— Como ele está? — perguntei, descendo do mini palco circular no centro do quarto de hóspedes da casa dos meus pais.

Tinha escolhido me casar onde tudo nasceu, para trazer ainda mais significado à data.

— Seu pai está muito nervoso, — Agatha observou Henrique pelo vidro da janela do quarto, lá fora, Henrique caminhava nervosamente de um lado para o outro, com os poucos convidados que chegavam e sentavam-se.

A maioria destes eram amigos, alguns parentes se abstiveram da... "obrigação" - como muitos disseram - de fazer parte de uma data "nada significativa" - como muitos outros disseram.

— E Murilo está...

— Quase matando um — Murmurou Mônica.

— E onde está Laila? — perguntei, colocando um dos dedos na boca.

Minha mãe reprimiu o gesto com um tapinha de leve nos meus dedos.

— Está brincando lá fora.

Respirei fundo, pensando nas roupas brancas de nossa primeira filha que, àquela altura, deviam estar marrons.

Foi uma das decisões que também marcou nosso passo a caminho tanto do casamento, quanto da sanidade do relacionamento.

Laila, mesmo depois de tanto tempo no orfanato, não tinha sido adotada, a decisão foi mútua para nós dois, todas as vezes em que íamos lá - principalmente nas visitas que tomava o dia todo - Laila não desgrudava de nossa companhia e depois de alguns funcionários darem a ideia, discutimos e a acatamos.

E foi a melhor decisão que tomamos.

E aquela decisão do casamento... ainda me deixava nervosa.

— Toda essa sensação vai passar quando você o ver lá te esperando — sussurrou minha mãe, acalmando um pouco os meus nervos.

As horas seguintes passaram lentamente e com elas a decisão de deixar para ler a carta quando o casamento não parecesse uma ideia tão boa — tamanho meu nervosismo.

Com aquele pensamento, meus nervos diminuíram de velocidade e junto as risadas de minhas três madrinhas e minha mãe, a batida na porta soou, alertando a todas.

— Querida — disse meu pai ao colocar a cabeça no vão da porta. — Está na hora.

Vê-lo me chamando para entrar comigo já fez meus olhos encherem de lágrimas, seu apoio, sua aceitação... significaram tanto para mim ao longo dos anos que resultaram naquele acontecimento, naquele momento.

Caminhar de braços dados com ele só me fez ficar mais tranquila, enquanto Olívia, Mônica e Alana soltavam risadinhas atrás de nós. Antes da entrada, elas se posicionaram no lado oposto dos padrinhos e, com a música que precede qualquer entrada de uma noiva, meu pai e eu caminhamos em direção ao meu novo futuro.

As palavras que não li de minha mãe biológica, naquele momento em nada fizeram falta, mas as sábias palavras de Agatha, que sempre fora minha mãe, serviram para me acalmar e com a calma as lágrimas vieram.

Murilo, com seus lindos olhos azuis, me aguardava no final da caminhada que parecia mais longa a cada minuto. Murilo, o então homem que sempre amei, que sempre me salvou por meios desconhecidos até a mim. Murilo, que sempre cuidou de mim, lutou por mim, amou por mim nos momentos mais difíceis e riu comigo nos mais fáceis.

Vê-lo em pé me aguardando com olhos cheios d'água só serviu para que um peso invisível sumisse dos meus ombros e, quando meu pai beijou minha testa e colocou minha mão sobre a de meu futuro marido, eu soube que não importava os comentários, a cerimônia vazia, ou as pessoas que não nos apoiavam.

O que importava é que tínhamos um ao outro... sempre teríamos.

E a única coisa capaz de nos guiar pelo longo caminho que iríamos compartilhar era o amor.

E isso tínhamos de sobra. 

~.~.~.~.~.~.~

É importante dizer pra vcs que o resultado final da história/epílogo, não ficou em nada como eu esperava, mas chegou um momento em que eu não conseguia mais entregar meu 100% nessa história.

Foram anos retratando os acontecimentos dessa família, a história desses personagens, essas vidas... e talvez o tempo - e a insistência em ter algo a escrever para eles - me levou por caminhos dos quais não me orgulho na conclusão dessa trilogia.

Peço imensas desculpas se esperavam mais capítulos antes do fim, mas não iria prometer para vocês algo que eu não conseguiria - de forma alguma - entregar.

Espero que guardem boas memórias dessa trilogia e história.

E que, quando eu voltar a publicar novas histórias por aqui, vocês escolham me acompanhar novamente.

Obrigada pelo apoio e leitura, vocês foram incríveis <3

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