CAPÍTULO 37

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JÚLIA

As piores noites eram aquelas carregadas de sonhos. As memórias se misturavam com o que eu desejava e, sinceramente, a desgraça estava feita.

Eu nunca acordava muito bem no dia seguinte, enrolava mais na cama, ficava mais no celular e encarava o teto branco como se minha vida dependesse daquilo.

Era difícil chutar as cobertas para o lado e caminhar até o banheiro para repetir aquela rotina sem fim. Eu não tinha mais o que fazer além de pensar no que tinha perdido, no que tinha sido interrompido para uma caça sem fim.

Já fazia tanto tempo que eu mal ficava apreensiva com o aparecimento de meu perseguidor, tê-lo à espreita não me tirava o sono, mas se tirasse, talvez eu tivesse mais paz do que sonhar com Murilo naquelas circunstâncias.

A saudade doía meu peito e queimava meu corpo. Nossas noites juntos, nossas promessas, aqueles momentos que me faziam seguir em frente, ainda que a cada dia se tornasse mais difícil.

Para respirar normalmente e afastar toda aquela mistura triste em minha mente, eu corria para meu computador e estudava como se ainda estivesse nas aulas de medicina, como se meu fim de semestre dependesse daquilo, ainda que uma risada em meu interior me desconcentrasse - rindo de mim, claro -, eu conseguia deixar toda aquela saudade agonizante em torpor por pelo menos algumas horas.

Mas, no momento que separei livros e caderno, um som vindo do lado de fora da janela do meu quarto deixou meu corpo em alerta. Eu rapidamente me enfiei sob as cobertas junto com os materiais e ainda que assustada, encarei a janela.

A cortina cobria o vidro de forma fantasmagórica, a luz da lua invadia o interior do cômodo e quando uma silhueta de tomou conta da iluminação, eu congelei em completo pânico, sabia que a janela estava trancada e o prédio tinha segurança, mas todos os piores cenários se desenrolaram em minha mente.

Mas, para minha surpresa, quem quer que fosse só colou um papel na janela. Não demorou muito para que ele sumisse, mas não corri até a janela, sabendo que o papel estaria lá quando o dia amanhecesse e temendo que o perseguidor ainda estivesse à espreita, me observando.

Ainda com as mãos trêmulas, enfiei o pulso sob o colchão e puxei a caderneta com minhas anotações desde o início dos ataques sutis.

Todas as anotações indicavam que eu encontrava materiais físicos sempre que acordava ou quando chegava de uma rotina cheia na rua.

Ele tinha seus métodos e horários, era cuidadoso para não ser pego, ainda que não houvesse relação nos dias, não que eu ainda tivesse notado pelo menos.
Mas aquela perseguição desenfreada não duraria muito mais tempo.

Eu o pegaria.

MURILO

— Vê aqui? — perguntou meu pai, inclinando-se sobre uma das milhares telas da parte secreta de sua empresa.

Acenei em positivo, observando o ligeiro movimento na gravação. Algo estava errado.

— É ele — Henrique disse com convicção e eu sabia que ele tinha razão. — Só ele conseguiu burlar nosso próprios hackers ao ponto de se manter tão escondido.

— Mas sem uma imagem para comprovar, como vamos agir? — perguntei, inclinando a cabeça em sua direção.

Estávamos exasperados, muitos anos haviam se passado sem pista alguma de seu paradeiro e, pior do que nosso maiores pesadelos, a gravação era do apartamento em que Júlia e Agatha estavam.

Não conseguia sequer imaginar como o maldito perseguidor havia conseguido tais informações, se tudo tinha ficado entre a família e fora dos olhos da imprensa, que acreditava em outro paradeiro de ambas.

Respirei fundo, tentando focar no fato de que lamentar pelo passado não reverteria o futuro. Um futuro que não podia acontecer. Ele não poderia exercer seu plano.

— Nossa equipe vai até lá investigar, uma filial de outra cidade vai entrar em contato com a agência de segurança do apartamento.

— Como ele teve acesso às imagens? — as perguntas continuavam se misturando em minha cabeça, ao passo que meu pai, que sempre agia mais rápido que qualquer um, começava a fazer ligações.

Já era tarde da noite, mais um dia que não dormiríamos em casa, mais um dia distantes delas. Se eu tinha alguma esperança de relaxar hoje, revisar formulários ou sequer dormir, a esperança foi destroçada com a evidência de que ele estava mais próximo do que imaginávamos.

— Vai dar tudo certo — meu pai apoiou a mão em meu ombro, a segurança em sua voz diminuiu um pouco meu nervosismo, minha tensão.

Mas só uma pessoa era capaz de diminuí-la por completo. E apenas quando ela estivesse segura ao meu lado. Finalmente ao meu lado.

A ideia de submetê-la ao perigo por tempo demais me tirava a calma, deixá-la à completa mercê de seu perseguidor fazia meus instintos fluírem a quase comprar uma passagem e voar até lá, apenas para certificar, com meus próprios olhos, que ela estava bem.

Tínhamos tido nossas aulas de defesa pessoal, mas naqueles três anos tive tempo de praticar mais exercícios de ataque, com a terrível necessidade de que um dia aquilo viria a ser útil.

E justamente quando era, eu não estava próximo o suficiente para proteger as duas mulheres mais importantes da minha vida.
Engoli em seco e abri o relatório de movimentações que estava desatualizado pelo sumiço do perseguidor e, mesmo com os olhos pregando de cansaço, anotei todas as informações possíveis, enquanto meu pai rodeava o amplo escritório com o celular no ouvido apoiado no ombro e um tablet em mãos.

Tudo e qualquer coisa era de extrema relevância para a segurança delas.

Ainda que no fundo eu não me sentisse satisfeito por estar lá, pelo menos não me sentia impotente e perdido naquela escuridão que tanto tempo sem ela me causava.

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E aí, acham que esse plano da Júlia vai dar certo? E o Mu, acham que ele vai suportar não poder fazer nada? Nos vemos nos próximos!!!

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